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Decreto uniformizando ação policial é bom ou ruim?

Por
Itaan Arruda

Decreto uniformizando ação policial é bom ou ruim?

O Ministério Público do Estado aponta tendência de queda da letalidade policial no Acre, com destaque para o ano de 2021 quando se registrou a nona menor taxa no país. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024 reforça esse movimento. Diante desse panorama, para o Acre, o decreto serve para quê?
Por Itaan Arruda

“Ninguém chama as forças policiais para pensar essas mudanças”, ironiza presidente da Associação dos Militares

O presidente da Associação dos Militares do Acre, Kalyl Moraes, recebeu com desconfiança a informação sobre o decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva que disciplina o uso da força e dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos profissionais da Segurança Pública. “Ninguém chama as forças policiais para pensar essas mudanças”, ironizou o sub-tenente da PM, com 25 anos de experiência.
Para o presidente da AME/AC, a decisão do Executivo é alimentada, sobretudo, pelo fator político. “Isso fragiliza a atuação dos policiais porque temos que nos adaptar e nos enquadrar nas abordagens, sujeitos a toda sorte, sabendo que o fator que motivou as mudanças foi estritamente político”.
E, se o critério é estritamente político, avalia Kalyl, o Governo Federal erra também porque não se ouviu quem poderia contribuir de forma orgânica com o tema. “Não há consulta sequer aos legisladores que entendem de Segurança Pública, que trabalharam com Segurança Pública”, registrou.

Kalyl Moraes avalia que para o policiamento repressivo haverá fragilização do agente de Segurança Pública | Imagem: Redes Sociais

O decreto assinado pelo presidente Lula e publicado no Diário Oficial da União no último dia 23 de dezembro possui 11 artigos. E foi recebido tanto por parte das forças policiais quanto por governadores como uma “fragilização” da atuação policial ou como “chantagem”. Por que o termo “chantagem”?
Por causa do artigo 9ª que tem a seguinte redação: “O repasse de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública e do Fundo Penitenciário Nacional para ações que envolvam o uso da força pelos órgãos de Segurança Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios está condicionado à observância do disposto na Lei no 13.060 de 22 de dezembro de 2014, e neste Decreto”.

E o que diz a lei assinada pela então presidente da República, Dilma Rousseff, há exatos 10 anos? Trata da mesma coisa: “disciplinar o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de Segurança Pública em todo território nacional”, observando os princípios de legalidade, proporcionalidade, razoabilidade, necessidade. O texto trata também quando não é legítimo o uso da arma de fogo. O STF, inclusive, chegou a julgar uma ADIN formalizada pelo PSL, referente a esta lei. O Supremo entendeu que a lei não feria a Constituição.


A ideia da “chantagem”, defendida por alguns políticos da oposição, como o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), é justificada pela condicionante imposta pelo artigo 9ª do decreto. É como se o Governo Federal estivesse dizendo aos governadores: “O Estado quer dinheiro para melhorar os presídios? O Estado quer recurso para compra de equipamentos, para realizar cursos… então, adira ao que defende o decreto”.
Para algumas fontes com que a reportagem conversou, o decreto é inconstitucional e deve estar na agenda do parlamento assim que o ano legislativo recomeçar. “Deve cair”, disseram. “Inclusive, já houve casos de alguns decretos ministeriais que tinham o mesmo espírito e não deram em nada. Vai cair”.
O comando da Polícia Militar do Acre foi acionado para se pronunciar sobre o assunto. Por meio da assessoria, informou que não iria falar.

Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública usa da diplomacia para tratar do decreto presidencial

Em uma breve entrevista ao ac24horas, o secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, José Américo Gaia, surpreendeu. Usou da diplomacia para tratar do decreto presidencial. Até mesmo quando foi perguntado sobre uma possível “reação” dos Estados, Gaia calculou. “Estamos em diálogo com outras unidades da federação para compartilhar experiências e perspectivas sobre a implementação do decreto”. Leia a íntegra da entrevista abaixo:


Diante dos repetidos casos de abusos de poder ou uso desproporcional da força em operações policiais em todo o país, o Governo Federal reagiu com a formulação do Decreto 12.341, de 23 de dezembro de 2024. Você entende que há justificativa para essa unificação/padronização na forma de atuação das polícias? Qual deveria ser a prioridade do MJ?
A unificação e padronização na atuação das polícias é um passo importante para garantir a integridade das operações e a proteção dos direitos humanos. No Acre, temos trabalhado incessantemente para promover uma cultura de respeito e responsabilidade nas ações policiais. A prioridade do Ministério da Justiça deve ser fortalecer a capacitação das forças de segurança, investindo em treinamentos que enfoquem a abordagem cidadã e o uso proporcional da força, além de promover mecanismos de transparência nas operações.
A adesão ao programa do Governo Federal tem como consequência acesso a recursos para a área de Segurança Pública. Isso é correto, na sua avaliação?
Sim, a adesão a programas do Governo Federal é crucial para o acesso a recursos que podem ser alocados na melhoria da segurança pública. Esses investimentos são fundamentais para a modernização das nossas forças de segurança, permitindo a aquisição de equipamentos, formação de pessoal e implementação de estratégias de prevenção e combate ao crime. No Acre, temos utilizado esses recursos para fortalecer nossas operações e expandir programas de policiamento comunitário.
Estados como o Acre, em que a taxa de letalidade das forças de segurança é baixa, são prejudicados com o decreto?

Acredito que cada estado deve ser avaliado dentro do seu contexto específico. No Acre, temos um compromisso com a redução da letalidade e com práticas que priorizem a proteção da vida. O decreto pode ser visto como uma oportunidade para reforçar ainda mais essa abordagem, garantindo que as forças de segurança operem dentro dos padrões estabelecidos, respeitando a vida e os direitos dos cidadãos. Contudo, é importante que as particularidades de estados com índices mais baixos de letalidade sejam consideradas nas diretrizes implementadas.


NAT/Ministério Público do Estado do Acre

Quais deveriam ser as prioridades do Governo Federal para a Segurança Pública para estados como o Acre (observando os aspectos geográficos e socioeconômicos)?
As prioridades do Governo Federal para estados como o Acre devem incluir, investimentos em infraestrutura, como melhorar as condições das delegacias e postos policiais, especialmente em áreas remotas.
Capacitação e valorização dos profissionais de segurança, promovendo cursos de formação e atualização, com foco em direitos humanos e policiamento comunitário.
Programas de prevenção, incentivando ações que atuem na raiz dos problemas sociais, como educação, saúde e geração de emprego, que podem contribuir para a redução da criminalidade.
Integração das forças de segurança que facilitarão a colaboração entre polícias civil, militar e federal, além de promover parcerias com instituições comunitárias para um combate mais eficaz ao crime.
A Sejusp do Acre está se articulando com outros estados para “reagir” ao decreto?
Sim, a Sejusp do Acre está atenta às diretrizes do Decreto 12.341 e, se necessário, estamos em diálogo com outras unidades da federação para compartilhar experiências e perspectivas sobre a implementação do decreto. Nosso objetivo é garantir que as particularidades de cada estado sejam respeitadas e que as diretrizes sejam adequadas à realidade local. Acreditamos que a colaboração entre os estados é fundamental para fortalecer a segurança pública de forma eficaz, sempre alinhada com a proteção dos direitos humanos e a promoção de uma polícia cidadã e responsável. Estamos comprometidos em trabalhar em conjunto para encontrar as melhores soluções para a segurança dos nossos cidadãos.

José Américo Gaia: diplomacia da gestão falando mais alto do que a política | Imagem: Arquivo ac24horas

Itaan Arruda

Jornalista, apresentador do programa de rádio na web Jirau, do programa Gazeta em Manchete, na TV Gazeta, e redator do site ac24horas.


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