O editorial do ac24horas deste domingo terá a tendência de ser desagradável. Provavelmente deve ser recebido com antipatia por parte da classe política e também por parte da classe empresarial. Mas, infelizmente, alguém precisa dizer aquilo que é necessário. Lá vai:
Na segunda-feira da semana passada, no Bar do Vaz, o governador Gladson Cameli trouxe um elemento velho da retórica dos governantes, sobretudo os reeleitos: “estou entrando para o ano do executar”. Assim mesmo, leitor! No infinitivo, substantivado, quase com sobrevida, dando um ar de filósofo de canto de rodoviária. “… o ano do executar…”. Mais acaciano impossível. Cabe tudo aí dentro.
Cabe tudo, mas a prudência entra com dificuldade. E por quê? Porque, apesar de não ter sido dito, fica sugerido que “… o executar…” tem relação com obras. Obras! Obras! Obras! E mais obras! E, talvez, esteja neste ponto uma das maiores armadilhas dos gestores do Acre: a ideia de que administrar bem é, obrigatoriamente, investir tempo, energia e recursos em obras. O raciocínio reto induz à sequência obras/empregos/renda/impostos/benefícios. Isso é sempre verdade? A todo momento essa sequência é infalível e soberana?
A qualidade do debate público no Acre está de tal monta que o próprio prefeito da Capital já relacionou uma tal de “modernidade” com prédios de mais de 40 andares. O que leva os pobres mortais dos 39 andares abaixo para a vala comum dos desgraçados. Aqueles que ousam ter um quintal com um pé de limão e uns maços de cheiro verde e coentro, para o prefeito, são a encarnação perfeita do atraso.
O governante Cameli que apontou 2025 como um ano “… do executar…” é o mesmo que, há dois dezembros, no mesmo Bar do Vaz, prometeu 11 mil casas populares. E é bom esclarecer que, apesar do nome, no Bar do Vaz, só se serve café ou água. No máximo, um refresco de graviola. Intrigante foi que, os anos que se seguiram contaram com a análise refinada do professor Orlando Sabino, aqui mesmo no site ac24horas, sobre a capacidade de execução do orçamento público por parte do Governo. Os textos do economista desautorizam o mínimo cacoete de esperança.
Quando se fala isso, em nenhum momento, o que se defende é uma gestão engessada, sem nenhum tipo de obra. Isso não existe. O que se chama atenção é que é preciso reavaliar essa lógica de que governante bom é, obrigatoriamente, um governante obreiro. É preciso lembrar, inclusive, que obras concluídas são aparelhos públicos que exigem manutenção e servidores. Têm, portanto, custos.
O que seria necessário fortalecer era a ideia de que os atuais aparelhos públicos (escolas, postos de saúde, hospitais, laboratórios, estradas, ramais, pontes) precisam funcionar com excelência. Repare, leitor: não é apenas funcionar. É funcionar com excelência. E o governo tem gente preparada para isso: já não é segredo a ninguém que o secretário de Estado de Planejamento, Ricardo Brandão, tem em torno de si a equipe mais qualificada da gestão. São gestores bons, que vêm de outros tempos: sabem que o projeto mais desafiador está em mudar indicadores e melhorar índices. Não gera fotos de inauguração, mas cria um ambiente sustentável, fortalece raízes.
Não adianta a Seplan ser uma máquina giratória de elaboração de projetos em escala se a capacidade de execução é baixa e as tais “obras” não estão inseridas em um projeto maior que valorize a Cultura e o modo de vida do acreano, sem mimetizar os padrões do Sul Maravilha, como se o modelo de lá fosse o “certo” e nosso daqui o “errado”, teimosamente vivendo com o pé no chão, muito longe dos 40 castelos, das 40 nuvens adiante.
Não há nenhum empresário do Acre que aposte no pior cenário para o Governo do Estado como forma de melhorar o ambiente econômico. Todos querem um Governo que tenha capacidade de induzir, de criar um contexto que gere fluxo para criação e ampliação de empreendimentos. Isso é bom para todos, inclusive para o trabalhador.
O ano de 2025 será o ano que iniciará a redenção do que se ensaiou nos seis anos anteriores? Quais são os indicativos concretos de mudança na administração pública (seja no âmbito econômico local ou na forma da gestão) que permitam alimentar essa expectativa de que “agora vai”? 2025 não pode ser um ano “… do executar…” apenas porque é um ano estratégico politicamente para este ou para aquele grupo.
O Acre é tão intrigante que revê até mesmo a lógica do xadrez: por aqui, tudo é tão urgente que o tático e o estratégico estão no mesmo paneiro; por aqui tudo é tão urgente que é preciso de líderes que entendam não apenas o tempo das coisas. Mas busquem também compreender as coisas que o tempo tem e exige. Por aqui, o xadrez é outro.
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