Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima e Rodrigues Alves viveram um dia histórico nesta segunda-feira, 16. A energia elétrica dessas cidades deixou de ser gerada a partir da usina termoelétrica, utilizando 180 mil litros de óleo diesel diariamente e passou a ser sustentável, por meio do linhão, que traz para a Amazônia, energia de hidrelétricas (gerada a partir da água). Os cerca de 100 mil consumidores desta região do Vale do Juruá foram beneficiados pelo maior projeto de descarbonização do Norte e passam a ser parte do sistema interligado nacional.
As obras de construção do linhão duraram mais de um ano sob a gestão das empresas Transmissora Acre, do grupo Zopone, seguindo as leis de engenharia e meio ambiente.
O Ministério de Minas e Energia (MME) informou que a Linha de Transmissão (LT), que liga Rio Branco aos municípios de Feijó e Cruzeiro do Sul vai possibilitar uma economia anual de R$ 240 milhões aos consumidores de energia elétrica do país. A pasta estima essa economia com o fim da dependência do uso de 6 milhões de litros de óleo diesel, consumidos anualmente em centrais geradoras para atender a demanda local. Os testes na LT foram realizados para avaliar a integridade e confiabilidade, antes da entrada em operação nesta segunda-feira.
“Essa integração representa um marco para o Acre, em especial para Cruzeiro do Sul, que passará a contar com maior segurança elétrica e uma solução mais limpa e econômica”, afirmou o MME, por meio de nota.
As obras foram realizadas no âmbito do programa Energias da Amazônia, instituído pelo Decreto nº 11.648/2023. O programa busca reduzir a dependência de geração de energia a partir de óleo diesel na região amazônica
A termoelétrica localizada em Cruzeiro do Sul pertence à empresa Energias do Acre, do Grupo Rovema. A distribuição é feita pela Energisa. O gerente comercial da empresa, Pedro Melo, destaca o avanço que a ligação significa para o Acre. “O desligamento da usina termoelétrica e a conexão da subestação do linhão ao sistema interligado nacional é a garantia de uma energia com maior qualidade, do sistema elétrico com maior confiabilidade e, principalmente, mais sustentável. Afinal, a usina termoelétrica, que era o que garantia o fornecimento de energia aqui em Cruzeiro do Sul, Rodrigues Alves e Mancio Lima, consumia aproximadamente 180 mil litros de diesel por dia, e o diesel é um combustível poluente, então a gente vai estar contribuindo. Não só com sistema elétrico, como eu já falei, mas também com a sustentabilidade, com a redução de emissão de gases”, contou ele, citando o avanço do uso da energia renovável no Acre. “Feijó e Tarauacá já tinham sido conectados e faltavam esses três municípios do Vale do Juruá. Agora só 4 do Acre ficarão de fora do sistema nacional”, conta.
Para a Associação Comercial de Cruzeiro do Sul, o linhão beneficia a indústria, o comércio e os consumidores da região. ”A interligação ao sistema nacional integrado de energia é um passo muito importante aqui para o nosso desenvolvimento regional, porque teremos acesso agora a uma energia mais barata, mais confiável, mais abundante, que pode atender as demandas aqui da nossa indústria, que possa se estabelecer aqui na região, além de possíveis ganhos também para o consumidor, porque a gente se integra agora ao sistema nacional com energia mais barata. Então, eu creio que isso a gente deve comemorar, porque é um fator muito importante e com boas perspectivas para o futuro”, pontuou o presidente da Associação Comercial, Luís Cunha.
A empresária Janaína Terças, representante da Federação das Indústrias do Acre (Fieac), no Vale do Juruá, diz que do ponto de vista da indústria é um momento histórico. “A partir de agora temos uma dificuldade a menos para as indústrias aqui instaladas e as que deverão vir para cá a fim de garantir um desenvolvimento maior para toda essa região. A conexão da subestação e do linhão ao sistema interligado nacional é a garantia de uma energia com maior qualidade, com sistema elétrico com maior confiabilidade e, principalmente, uma energia sustentável. Cruzeiro do Sul está de braços abertos para receber novas indústrias, agora podemos dizer: venham que somos interligados ao Sistema Interligado Nacional (SIN), com energia elétrica suficiente e de qualidade para os setores produtivos”, enfatiza
Energia renovável e mais barata
No meio da floresta Amazônica, a energia gerada a base de óleo diesel tinha um alto custo financeiro e ambiental. As sete usinas térmicas do Acre consumiam cerca de 5,5 milhões de litros de óleo diesel por mês. O Governo Federal, por meio do Ministério das Minas e Energia, investiu cerca de R$ 700 milhões na execução da interligação, que vai gerar uma economia em torno de R$ 250 milhões por ano com a redução do repasse da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) para a região.
O empreendimento integra o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do Ministério de Minas e Energia, que foi criado, no âmbito da Presidência da República, pela Lei nº 13.334 de 2016, com a finalidade de ampliar e fortalecer a interação entre o Estado e a iniciativa privada, para projetos prioritários.
Em 2019, a Transmissora Acre arrematou no Processo nº 48500.001520/2019-43 o Lote 11 e firmou o Contrato de Concessão de Transmissão nº 11/2020-ANEEL, cujo objeto é a concessão do serviço público de transmissão de energia elétrica para construção, operação e manutenção das instalações de transmissão caracterizadas no Anexo 2-11 do Edital do Leilão nº 02/2019-ANEEL, a saber: Subestação 230/69 kV Feijó; Subestação 230/69 kV Cruzeiro do Sul; Ampliação da SE Rio Branco I; e 2 trechos de Linha de Transmissão LT 230 kV Rio Branco I – Feijó (Trecho 1) e LT 230 kV Feijó – Cruzeiro do Sul (trecho 2). A linha de Feijó à Cruzeiro do Sul, conta com 501 torres e está pronto.
O engenheiro civil Paulo Henrique Soares, responsável pelas obras das subestações Feijó-Cruzeiro, da linha entre Feijó e Cruzeiro e das obras do CIPBA, diz que a população de Cruzeiro do Sul e demais municípios atendidos pelo linhão, vão ter energia de maior qualidade e mais barata. “O consumidor final vai sentir de diferença no valor. Tecnicamente será a mesma potência. Vai ter uma garantia de fornecimento, onde não tem tanta queda de energia e o valor teoricamente tem que abaixar também”, destaca.
“É muito importante a interligação dessa região ao sistema interligado nacional. Então, essa interligação vai propiciar o que a gente imagina no médio, longo prazo, uma possível redução nas tarifas praticadas e uma maior confiabilidade no fornecimento de energia com menos interrupções. É simplesmente uma energia limpa interligada ao sistema. O empreendimento trará enorme contribuição ao meio-ambiente e a descarbonização do Estado”, destacou André Palermo, responsável pela área fundiária e de licenciamento do grupo Zopone.
Componente ambiental e benefício para os indígenas
O gestor Gilberto Siqueira , responsável pelo componente ambiental do projeto, diz que trata ao mesmo tempo de uma solução para um problema energético e uma transformação na energia do Acre. “O linhão chegando à Cruzeiro do Sul aumenta a competitividade no município que hoje queima seis milhões de litros, é uma fortuna, e está tudo carbonizado, porque essas usinas são a diesel, e é custo caríssimo. Com o linhão ao mesmo tempo que a gente faz descarbonização, a gente também melhora a vida dos povos indígenas Noke Koi”, relatou.
O linhão passa nos 18 quilômetros da terra dos Noke Koi, os Katukina, na BR-364. A Empresa Transmissora Acre entregou no dia 6 de novembro, a sede da Associação Geral do Povo Noke Koi da Terra Indígena Campinas Katukina, o Centro de Medicina e o Centro de Artesanato, com uma loja para venda de produtos locais e um viveiro. A inauguração contou com representantes da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Comissão Pró-Índio (CPI) e Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (Opirj).
Além dos prédios, nas 11 Terras Indígenas foram feitos dezenas de açudes, aviários, roçados, plantações de cana e instalação de casas de farinha e engenhos. Para manter tudo funcionando, a Associação vai receber R$ 280 mil por ano para manter a sede, R$ 1 milhão referente a supressão vegetal, além de R$ 1,4 milhão para desenvolver projetos. Cinco líderes indígenas farão cursos em todas as áreas produtivas, como plantio de cana, fabricação de farinha e terão cursos e assistência técnica de 22 parceiros, como a Universidade Federal do Acre (Ufac).
As edificações, programas, os recursos em dinheiro e assistência técnica integram o Componente Indígena de mitigação dos impactos causados pelo linhão. No trecho, há 35 torres do linhão. Tudo foi realizado a partir do Plano Básico Ambiental do Componente Indígena (CI-PBA), do empreendimento, que obedeceu um rigoroso processo de referendo da comunidade da Terra Indígena Campinas Katukina e vem sendo executado em seus estritos termos, contando com a implantação de programas e construções.
O líder das 11 Terras Indígenas dos Noke Koi, Poá Katukina, afirma que as medidas vão torná-los independentes de forma sustentável, garantindo a segurança alimentar de futuras gerações. “Sou Edilson Rosa, o Poá, liderança geral do povo Katukina, representando 12 comunidades com aproximadamente 748 habitantes. Esse plano foi feito por nós, com os parceiros. É mais uma conquista nossa. Era o sonho meu, um sonho de todo o povo de construir nossa associação aqui na metade da Terra Indígena, onde ao lado está o colégio, o posto de saúde. A gente fica feliz com a sede da associação, a casa de artesanato, a casa de medicina. Além dessa sede aqui, tem nas outras terras a piscicultura com mais de 60 açudes e tanque entre todos, e tem as casas de farinha, casas de engenho. Em agosto de 2025, a empresa vai sair daqui e a gente vai tocar sozinho. Então isso traz responsabilidade também pra gente, pra gente estar cuidando, manejando todo esse patrimônio, essa conquista toda, a gente tem que valorizar e cuidar do nosso patrimônio. E com os cursos que eles vão dar, a assistência técnica, com o dinheiro que temos, a gente vai tocar. Com essa estrutura é andar com nossas pernas. Isso aqui será para as futuras gerações”, enfatizou o líder.