Na coluna desta semana, apresento o estudo “Eleições Municipais no Acre: relação entre eleições gerais e municipais (coattail reverso)”, dos professores Bruno Marques Schaefer, João Feres Júnior, Fabiano Santos e Matteo de Barros Manes, do IESP/UERJ. O texto foi originalmente publicado na página do Projeto LEGAL (https://legal-amazonia.org/eleicoes-municipais-no-acre-relacao-entre-eleicoes-gerais-e- municipais-coattail-reverso/), uma parceria da UFAC com o IESP/UERJ.
Boa leitura.
Eleições Municipais no Acre: relação entre eleições gerais e municipais (coattail reverso)*
1. Introdução
Com o final das eleições municipais, análises – mais ou menos qualificadas – abundam sobre o pleito. O centrão venceu? Bolsonaro ressurgiu? Lula foi derrotado? Diversas são as interpretações que buscam dar inteligibilidade ao que saiu das urnas em outubro de 2024. Nosso objetivo, neste boletim, é analisar a possível conexão entre eleições municipais e gerais. Em especial, testamos a hipótese de coattail reverso, que pressupõe a conexão entre a eleição de prefeitos e a votação de seus respectivos partidos tanto para as Assembleias Legislativas quanto para a Câmara dos Deputados.
Este boletim é o terceiro de uma série sobre eleições municipais no Acre, mas o quinto fruto da parceria entre a Universidade Federal do Acre (UFAC) e o Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) (MANES et al., 2024; SCHAEFER et al., 2024a, 2024b, 2024c, 2024d). Os demais podem ser encontrados no repositório Open Science Framework1. Ali constam também todos os materiais necessários para a replicação dos resultados aqui apresentados.
Demonstramos, neste texto, que há sim uma relação entre os resultados de eleições locais (para as prefeituras) e o desempenho dos partidos dois anos depois nas eleições gerais (para Assembleias e à Câmara). Este achado permite especular que as eleições de 2026 serão positivas para a Direita e a Centro-Direita no país.
2. Argumento e Coleta de dados
O efeito coattail, ou “rabo de casaca”, é a ideia de que a votação para cargos específicos puxa, ou arrasta (tal como uma casaca longa), a votação de outros cargos. Na Ciência Política, usualmente, esse efeito é observado a partir de uma estrutura vertical top-down, em que cargos mais elevados (em termos de hierarquia política), carregam votos para cargos “mais baixos”. Por exemplo, a votação para presidente ou governador influencia as votações para a Câmara ou Assembleias Legislativas (SOARES, 2013). Ou, a votação de prefeito “arrasta” a votação de correligionários que disputam vagas na respectiva Câmara de Vereadores (SCHAEFER; BARBOSA, 2020).
No caso brasileiro, apesar das evidências que indicam efeitos coattail top-down, há crescente literatura em Ciência Política demonstrando que o contrário também é verdadeiro. A ideia de coattail reverso, ou efeitos bottom-up, em que cargos mais “baixos” da hierarquia política afetam o desempenho de cargos mais “altos”. Especialmente, prefeitos se tornam importantes para explicar o desempenho de seus correligionários nas disputas para a Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas (AMES, 1994; AVELINO; BIDERMAN; BARONE, 2013, 2012; EDUARDO; RUSSO, 2022; VENTURA, 2021). Neste contexto, os prefeitos, no Brasil, funcionam como brokers, intermediando a relação entre deputados e eleitores nos seus municípios. De um lado entregam votos, e, de outro, recebem benesses, obras, recursos (principalmente via emendas parlamentares).
Para verificar a existência deste tipo de efeito, no Brasil, em geral, e no Acre, em particular, coletamos dados de resultados eleitorais para o cargo de prefeito, deputado estadual e federal em doze eleições. Eleições municipais de 2000 até 2020, e eleições gerais de 2002 até 2022. Os dados foram retirados do TSE via o pacote do R basedosdados (DAHIS et al., 2022). A unidade de análise é o partido no município. Desse modo, o banco de dados contém mais de 800 mil casos.
O que buscamos explicar é a votação do partido no município nas eleições gerais (Y) para deputado federal (Y1) e deputado estadual (Y2), a partir do fato do mesmo partido ter eleito candidato no mesmo município para a prefeitura (X2), ter candidato derrotado (X1) e não ter tido candidato (X0), na eleição anterior. Por exemplo, qual é a votação do partido para o cargo de deputado federal em 2002, considerando seu desempenho, no mesmo município, em 2000?
Se há evidência de coattail reverso, encontraremos resultados que ter um prefeito no município (X2) é melhor do que ter um candidato derrotado (X1) e/ou não ter tido candidato (X0).
3. Evidências de coattail reverso
Após a coleta dos dados, tratamos de realizar a análise através do R. Utilizamos testes Anova. A Análise de Variância, ou ANOVA, é um método estatístico utilizado para determinar se há diferenças significativas entre as médias de três ou mais grupos independentes. Em nosso caso, os três grupos são: ter eleito candidato no mesmo município para a prefeitura (X2), ter candidato derrotado (X1) e não ter tido candidato (X0), na eleição anterior. Na prática, a análise de variância testa a hipótese nula de que as médias dos grupos são iguais contra a hipótese alternativa de que pelo menos uma das médias é diferente.
Na figura 1, observamos que há, sim, evidências de coattail reverso. No caso das mais de 800 mil listas partidárias em todo o Brasil, verificamos que partidos que elegeram prefeitos (2) tiveram em média 12,56% dos votos do município para o cargo de deputado estadual, dois anos depois. Ter um candidato derrotado representa, em média, 6,22% dos votos, enquanto não ter candidato: 0,70%. Há enormes variações dentro dos grupos, mas o teste indica diferenças estatisticamente significativas entre os grupos.
Figura 1: Anova Deputados Estaduais (Brasil)
Na figura 2, olhamos especificamente para o caso do Acre. As diferenças entre os grupos são até maiores. Em média, partidos que elegeram prefeito em algum dos 22 municípios acreanos, ao longo do período analisado, tiveram quase 15% dos votos para a ALEAC dois anos depois. Em comparação com 6,4% dos votos no caso de candidaturas derrotadas e 1,73% dos partidos sem candidato. Os valores não são nem um pouco desprezíveis. Considerando os números das últimas eleições, o quociente eleitoral para a ALEAC foi de pouco mais de 18 mil votos. Por sua vez, 15% dos votos válidos do município de Rio Branco, totalizam mais de 29 mil eleitores. Ou seja, ter um prefeito eleito significa, ao menos, o acréscimo de uma vaga do partido na ALEAC.
Figura 2: Anova Deputados Estaduais (Acre)
Na figura 3, apresentamos os dados das disputas à Câmara dos Deputados. Os resultados, novamente, corroboram nossa hipótese. Ter um prefeito eleito significa, em média, 14,20% de votos para o partido na eleição seguinte para deputado federal. Candidato derrotado significa 6,37% dos votos e não ter candidato pouco mais de 0,62% dos votos.
Figura 3: Anova Deputados Federais (Brasil)
No caso acreano, novamente, as diferenças de médias são ainda maiores. Ter um prefeito eleito significa, em média, 16,83% dos votos na eleição seguinte para a Câmara. Em valores absolutos, isso significa mais de 30 mil votos em Rio Branco. O quociente eleitoral na eleição de 2022 foi de mais de 54 mil votos.
Figura 4: Anova Deputados Federais (Acre)
4. Discussão e perspectivas
Em um ambiente competitivo, e de altos custos informacionais, como as eleições para Assembleias Legislativas e Câmara dos Deputados, prefeitos e prefeitas atuam como brokers de deputados. Com um sistema proporcional e de lista aberta, o número de candidatos por vaga é altíssimo no Brasil. Por exemplo, no Acre, em 2022, haviam oito vagas para o cargo de deputado federal e 130 candidatos. A relação é de mais de 16 candidatos por vaga. Neste contexto, prefeitos oferecem uma espécie de atalho cognitivo aos eleitores, indicando o “seu” candidato (EDUARDO; RUSSO, 2022).
A Ciência Política demonstra que, por um lado, deputados consideram extremamente importante a atenção às demandas locais (com a liberação de emendas parlamentares, visitas aos municípios e conversas com prefeitos) e, de outro, que prefeitos buscam ativamente deputados para obtenção de recursos e, com isso, pedidos de votos. Ter um prefeito incrementa a votação do partido nas eleições gerais posteriores.
Confirmamos as expectativas da literatura para o caso brasileiro, em geral, e acreano, em particular. Diante disso, é possível especular sobre as eleições de 2026. O número de prefeitos eleitos por partidos do chamado “Centrão” pode indicar o fortalecimento das respectivas bancadas nas próximas eleições gerais. No caso do Acre, o PP (partido do governador Gladson Cameli) foi o grande vencedor das eleições municipais (14 das 22 prefeituras do estado), seguido por PL (duas prefeituras, Rio Branco e Epitaciolândia), Republicanos (duas prefeituras) e MDB, PDT, União e PSD, com uma cada (“Eleições 2024 no Acre”, [s.d.]). Configuração essa que parece bastante favorável a manutenção do domínio da direita no estado, nas próximas eleições gerais. Sendo o inverso verdadeiro, um cenário bastante complicado para a esquerda no estado: o PT ficou próximo de ganhar somente uma prefeitura (Xapuri).
*Bruno Marques Schaefer, João Feres Júnior, Fabiano Santos, Matteo de Barros Manes
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