Você sabia que a estrutura tributária brasileira é uma das mais absurdas do mundo? Isso significa que, no Brasil, os pobres e a classe média pagam impostos altíssimos, enquanto os ricos, e especialmente os muito ricos, contribuem com uma fração do que possuem ou ganham. Essa é uma das razões pelas quais nosso país figura entre as sociedades mais desiguais e injustas do planeta. Mas sejamos justos: não é só por isso. Há também o controle político e os privilégios. A soma de uma tributação regressiva (que cobra mais de quem tem menos), da força política das elites econômicas no Congresso (em que pessoas com patrimônio acima de 1 milhão de reais, que representam 0,21% da população, ocupam 50% das cadeiras de deputado na Câmara Federal) e dos privilégios de classe e setoriais (como exemplo, tomemos o caso do imposto pago por fazendeiros e ruralistas sobre suas propriedades, o ITR, em que a soma do que é pago em todo o país não equivale sequer ao IPTU da cidade de São Paulo, de tão irrisório que é) coloca o Brasil no topo do ranking mundial de desigualdade.
Por isso, sempre que uma proposta de imposto sobre os muito ricos é apresentada, você, que não tem patrimônio de 10 milhões de reais, deveria prestar atenção e aplaudir quem, na política, defende a ideia. Nesse sentido, são dignos de aplausos os votos da deputada Socorro Neri e do deputado Gerlen Diniz, ambos do PP, favoráveis à proposta de implantação de um imposto sobre grandes fortunas, na Câmara Federal esta semana. Enquanto outros membros da bancada de deputados votaram contra ou se omitiram, esses deputados foram a favor de um imposto (modesto, diga-se de passagem) sobre o patrimônio dos muito ricos. Claro que as condições, os critérios e a forma de cobrança ainda precisariam ser definidos, buscando evitar que isso estimulasse a evasão de divisas. Vale lembrar que nem se trata de uma nova criação: o imposto já está previsto na Constituição Federal desde 1988.
Os muito ricos, defendendo seus interesses — o que, em uma democracia, é legítimo —, argumentam que a taxação de fortunas desestimularia investimentos e incentivaria a evasão de divisas, pois muitos remeteriam suas riquezas para lugares sem cobrança, prejudicando o país. Isso é parcialmente verdadeiro. Entretanto, a experiência internacional mostra que há formas de evitar que isso aconteça. Mas, no fundo, essa não é a questão central. O problema é que, no Brasil, os muito ricos sempre usaram seu controle sobre a política para interditar qualquer iniciativa que mexa em seus privilégios e, assim, escapar de qualquer obrigação com o restante da sociedade, jogando a maior parte do financiamento público nas costas da classe média e das camadas populares.
Veja esse exemplo: se você recebe 5, 10 ou 20 mil reais por mês de salário, paga 27,5% de imposto retido na fonte; somando isso ao que gasta com ICMS, ISS, IPI, taxas e outros tributos embutidos nas compras e outras transações que realiza, ao final do mês terá desembolsado aproximadamente metade de sua renda com impostos. Enquanto isso, uma pessoa que recebe 1 milhão de reais em lucros e dividendos paga 0% de imposto de renda — isso mesmo, zero por cento. E, se contarmos todos os impostos, essa pessoa não gastará mais do que 10% de sua renda com tributos. Essa é a principal razão pela qual, no Brasil, a riqueza se concentra cada vez mais no topo da pirâmide social, alimentando o maior problema nacional: a desigualdade.
Por que pelejar por uma sociedade mais justa e equilibrada em termos de renda e riqueza é bom? Ou, dito de outra forma, qual o custo da brutal desigualdade brasileira? A desigualdade é a mãe dos nossos principais problemas sociais. Ela, somada à herança da escravidão, é a grande responsável pela absurda violência em nossas cidades. É também graças a ela que diariamente cresce a legião de desalentados, aqueles que sem forças físicas ou mentais para buscar oportunidades, acabam se autossabotando e vivendo uma rotina miserável em ambientes sem brilho ou futuro. É ela que, no final das contas, reduz a produtividade do trabalho na economia, quando associada a uma escolarização medíocre, à falta de incentivos ao crescimento pessoal e ao uso limitado de tecnologias.
A concentração de riqueza faz com que a mobilidade social no Brasil seja baixíssima. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostram que a pobreza tende a se perpetuar nas famílias de baita renda e escolaridade, tornando a transição para níveis mais altos de renda extremamente difícil. Quando ocorre, essa mobilidade leva em média dez gerações para se consolidar. Dá para imaginar algo, mas desestimulante para quem precisa correr atrás de oportunidades na vida?
Por tudo isso, é louvável quando parlamentares se posicionam a favor de mudanças na estrutura tributária nacional. É a forma mais eficiente e justa de colaborar para o combate à pobreza e à violência, e também a maneira mais eficaz de apoiar o fortalecimento da nossa economia.
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