Dos 317 registros de candidaturas para vereador de Rio Branco, alguns têm vantagens. São os “apadrinhados”. Longe de ser novidade na política brasileira ou acreana, o fenômeno, no entanto, tem força extra que será testada no próximo domingo (6). E o motivo de o apadrinhamento estar tão vivo é um só: as eleições de 2026.
É preciso entender o “padrinho” não apenas como uma liderança política específica. É possível que seja um órgão público. Ou, se o candidato a vereador tiver sorte, pode ser que sejam os dois: a liderança política e o órgão público.
São lembranças imediatas os casos do deputado estadual pelo PDT afastado para assumir a Secretaria de Estado de Agricultura, José Luiz Tchê, que tenta eleger o filho Felipe Tchê vereador. Como o PDT não conseguiu formar chapa, o filho vai pelo partido da moda no Acre, o Progressistas.
Na mesma toada, está o superintendente da Saneacre, José Bestene, cujo filho, Samir Bestene, tenta reeleição. Também pelo Progressistas. Não é mera coincidência, o partido do governador Gladson Cameli.
O deputado estadual Manoel Moraes, líder do governo na Aleac, carrega a afilhada política Gabriela Câmara, cujos pais são deputados federais. Ela mesma se desincompatibilizou da presidência do Iteracre para assumir a candidatura. Ficaram os cargos comissionados. Todos com compromissos claros.
“Temos que usar nossas redes sociais e até mesmo os nossos carros, o nosso combustível para irmos às reuniões nos bairros todos os dias”, reclama um desses comissionados do Iteracre. “Minha mulher já reclamou comigo porque uso o nosso carro se não é dada nenhuma condição”.
O “apadrinhamento” é objeto até de disputa entre os 24 parlamentares da Aleac. Essa correlação de forças é objeto corriqueiro, trivial na estrutura de poder. Um deputado tem base eleitoral no Jordão, por exemplo. A partir disto, quem tentar se aproximar dali precisa obedecer essa referência. Obviamente, são regras tácitas, silenciosas, quase instintivas. Não há nada escrito, claro. É “política oral”, mas de força quase sempre respeitada.
Além dos filhos, as esposas também são peças-chave. O exemplo mais emblemático é o da deputada federal Meire Serafim (União Brasil). Esposa do caricato prefeito de Sena Madureira, Mazinho Serafim, a parlamentar dificilmente concede entrevistas. Nas reuniões em Brasília, já estava se tornando incômoda a intervenção do prefeito da modesta cidade acreana nos debates sobre destinação de emendas. Ela não fala. Quem fala é o prefeito pelo mandato dela.
No caso da candidata a vereadora por Rio Branco também pelo Progressistas Lucilene de Souza Rodrigues, a Lucilene da Droga Vale, é esposa do deputado estadual André da Droga Vale (Podemos). Entre as mulheres, a única exceção das figuras de maior expressão da política regional seja Lene Petecão (União Brasil), irmã do senador Sérgio Petecão (PSD). Politicamente, os irmãos são, na prática, rompidos. Lene escolheu uma espécie de “voo solo” e deve colocar em prova a sua efetiva liderança política neste pleito.
Órgãos públicos_ As duas maiores estruturas de governo não saem incólumes no processo eleitoral. Os dois destaques são Pedro Pascoal, secretário de Estado de Saúde, e Aberson Carvalho, secretário de Estado de Educação. Pascoal, que fez carreira no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), tem como “apadrinhado” José Augusto Soares Aiache, o aguerrido líder sindical, candidato a vereador também pelo Progressistas.
Aberson Carvalho, secretário de Estado de Educação (a maior estrutura mantida com recursos públicos do Acre), é genro de Elzinha Mendonça, candidata à reeleição pelo Progressistas. Nas redes sociais, Carvalho não deixa dúvidas em relação ao voto para vereança. “Convido você a vir comigo nessa caminhada rumo à vitória com Elzinha Mendonça para vereadora”, aponta Carvalho.
No dia 16 de setembro, o cidadão-secretário faz o seguinte encaminhamento dançando com a parlamentar. Entre um passo e um requebro, orientou. “Dia alegre, junto aos amigos, apresentando o projeto de reeleição da minha vereadora Elzinha Mendonça para a população riobranquense”.
Esses exemplos não indicam necessariamente que há crimes eleitorais envolvidos. Para que se estabeleça uma relação criminosa é preciso provar que a estrutura mantida com recursos públicos está sendo canalizada para beneficiar este ou aquele candidato.
O “apadrinhamento” na cultura política brasileira é complexa. Como o poder público estabelece relações de toda ordem, é difícil definir onde está, claramente, o limite da atuação do gestor público e onde começa a liberdade de o cidadão (incluindo o gestor) escolher e externar suas preferências políticas.
Neste instante é que a discussão descamba para a arena da Moral. A maneira de agir, tendo como opções entre o “certo” e o “errado”, em um determinado cenário, é o que precisa ser avaliado.
Em 1985, assumia a Prefeitura de Rio Branco pelo voto popular, democraticamente, Adhalberto Aragão. Ele permaneceu no cargo até 1988. Foram anos difíceis. A cidade sentia os efeitos ainda da crise estruturante da economia de 1982. O movimento popular já começava a perder a força que tinha nos anos 70 e os núcleos urbanos crescia desordenadamente.
De 1989 a 1992, o prefeito Jorge Kalume (PDS) foi a surpresa saída das urnas. Afeito às formalidades dos eventos oficiais, ampliou a infraestrutura urbana em algumas regiões da cidade.
Jorge Viana chega à Prefeitura de Rio Branco em 1993. Simbolizou um movimento de ruptura ao ganhar as eleições pelo Partido dos Trabalhadores e prometendo uma nova aliança com o Movimento Popular. Retoma os investimentos do Município em habitação popular.
Mauri Sérgio retoma a força da militância do então PMDB na condução da política da Capital. Chegou ao poder em intensa polarização com o PT. Governou entre os anos de 1997 e 2000. Sofreu dura oposição não apenas dos partidos de esquerda, mas já da atuação de Organizações Não Governamentais. Sofreu grande desgaste por conta dos problemas de saneamento básico.
Flaviano Melo manteve a Prefeitura de Rio Branco sob o comando do PMDB em mais uma eleição polarizada com o PT. Com a experiência de ter governado o Estado e a própria Prefeitura de Rio Branco durante a Ditadura Militar, Flaviano Melo ficou pouco tempo no cargo. Apenas dois anos, quando assumiu uma cadeira como deputado federal.
De 2003 e 2004, o modesto pecuarista Isnard Leite assume no lugar de Flaviano Melo. Inicia-se uma tímida parceria entre Prefeitura de Rio Branco e Governo do Estado, sob o comando de Jorge Viana, em algumas áreas pontuais.
De 2005 a 2012, Rio Branco teve como prefeito o economista Raimundo Angelim. Foi o período em que a relação entre o Governo do Estado e a Prefeitura era quase direta. Angelim trouxe ao Acre a rotina do Orçamento Participativo, a experiência do Rio Grande do Sul que fortalecia as decisões comunitárias nos investimentos púiblicos feitos pelo Município.
Ainda embalado pela eficácia das ações de governo, o engenheiro civil Marcus Alexandre vence as eleições e assume a Prefeitura de Rio Branco em 2013. Fica no cargo até 2018 quando sai candidato a vice-governador em chapa encabeçada por Jorge Viana.
O professor de Matemática tenta a reeleição no próximo domingo polarizado com Marcus Alexandre.