Dados da Rede Nacional de Vigilância Epidemiológica Hospitalar (Renaveh) ajudam a perceber um novo cenário da violência no Acre. O contexto é mais grave do que aquele noticiado. Desautoriza o otimismo oficial que celebrou a redução do número de Mortes Violentas Intencionais no primeiro semestre de 2024.
O monitoramento é feito de forma paralela ao que é observado pelas forças de segurança. O histórico do paciente que entra no Pronto Socorro é registrado por servidores que alimentam o sistema de informações da Renaveh.
Por esse sistema, nos seis primeiros meses de 2024, foram registrados no Pronto Socorro de Rio Branco 54 vítimas por armas de fogo e 71 vítimas por armas brancas. Agressões corporais somaram 149. E violência auto provocadas (automutilações e suicídios) registram 236 casos. Com uma ressalva, no caso da violência auto provocadas: a tendência é de alta. Só no último mês de junho, foram 52 casos.
Caso sejam somadas apenas os casos de vítimas por armas de fogo e por armas brancas chega-se ao número de 125 vítimas. É um dado bem superior às 26 mortes registradas pelo Núcleo de Apoio Técnico do Ministério Público do Estado do Acre.
É preciso reconhecer a falha óbvia na metodologia dessa comparação. Entre esses dados estão incluídas as mortes contabilizadas oficialmente, por exemplo. No método oficial, há um recorte claro: homicídio doloso, feminicídio, latrocínio, morte por intervenção policial e lesão corporal seguida de morte. Soma-se as mortes com esse perfil durante o primeiro semestre e compara-se com o mesmo período do ano anterior. De 2024 comparado a 2023, de acordo com os dados oficiais, a redução foi de 15% de Mortes Violentas Intencionais no Acre. Foi esse número o que foi celebrado pelo governo.
Esse detalhamento a Rede Nacional de Vigilância Epidemiológica Hospitalar não oferece. No entanto, a Renaveh é um dos componentes do Sistema Único de Saúde, cujos dados são referência para a formulação do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Outra ressalva: os dados da Renaveh mostram a realidade da segurança em seus momentos mais dramáticos, quando a vida exige atenção máxima e obriga o sistema público de saúde preparo à altura.
Resumindo: os dados de redução das MVI podem ter justificativa estatística, mas, em muitos casos, a realidade da violência está espremida nos hospitais. Na maioria dos casos, a morte não foi registrada pela capacidade de resposta que o SUS soube oferecer.
Rio Branco 19
Tarauacá 2
Assis Brasil 1
Cruzeiro do Sul 1
Feijó 1
Plácido de Castro 1
Sena Madureira 1
Fonte: Núcleo de Apoio Técnico (Ministério Público do Estado do Acre)
26,92% são jovens entre 20 e 24 anos
19,23% têm entre 30 e 34 anos
15,38% têm entre 15 e 19 anos
15,38% têm entre 40 e 44 anos
7,69% têm entre 25 e 29 anos
3,85% têm entre 35 e 39 anos
3,85% têm entre 45 e 49 anos
3,85% têm entre 55 e 59 anos
3,85% têm 70 anos ou mais
Fonte: Núcleo de Apoio Técnico (Ministério Público do Estado do Acre)
O Acre ainda não possui um Sistema de Informações Criminais com nível de detalhamento que possa oferecer mais eficácia às próprias forças de Segurança Pública. Antes de investir em policiamento ostensivo, os gestores precisariam canalizar recursos e energia na qualidade da informação.
Uma reação institucional a esse problema são as Pesquisas de Vitimização. Há metodologias já amadurecidas nos Estados Unidos e na Inglaterra que iniciaram o trabalho ainda nos anos 60.
O Acre iniciou o processo ainda na gestão de Binho Marques, em 2008, mas não houve continuidade. Houve, inclusive, parceria com a Ufac à época para a elaboração das 1,5 mil entrevistas realizadas em 30 regiões com população equivalente da cidade de Rio Branco, o grande gargalo da área de Segurança.
A divulgação dos dados das Pesquisas de Vitimização precisa ser amadurecida internamente dentro da própria equipe. Ela acaba revelando diversos problemas da gestão pública e isso pode não ser muito bem compreendido internamente em uma equipe de governo.
O desafio é inserir a ferramenta no orçamento regular da Segurança Pública com foco em melhorar a qualidade da informação criminal: nas entrevistas das Pesquisas de Vitimização é comum fazer um recorte temporal para que o cidadão relate, naquele período, quantas vezes ele se viu vítima de um crime.