A Justiça Federal da 1ª Região, através da 13ª Vara Federal Cível do Distrito Federal, acatou ao pedido do Ministério Público e concedeu uma liminar que exige a mudança no formato da Carteira de Identidade Nacional (CIN). O modelo que está em vigor desde o início do ano é considerado transfóbico por ativistas da causa trans, por trazer o nome morto de registro acima do nome social.
A liminar foi concedida em ação civil pública inicialmente ajuizada pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão no Acre, Lucas Costa Almeida Dias. No pedido, ele sustenta que o desrespeito ao nome escolhido pelas pessoas trans e os entraves encontrados para fazer valer esse direito contribuem para o processo de invisibilização dessa população.
Pela decisão, que deve ser cumprida no prazo de 60 dias, o campo “sexo” deverá ser excluído do documento e o campo “nome” terá que ser unificado, sem fazer distinção entre os nomes social e civil. Além disso, a União também deverá incluir, nos cadastros federais, o campo “nome social” de forma que ele apareça antes do “nome de registro”.
Ao acolher o pedido do MPF, o juiz federal Mateus Pontalti lembrou que a dignidade e o reconhecimento pleno de uma pessoa estão intimamente ligados ao respeito por sua identidade.
“A identidade de um indivíduo é construída a partir de múltiplos fatores, sendo o nome um dos componentes mais fundamentais dessa construção. O nome carrega não apenas um sentido de individualidade, mas também de pertencimento e reconhecimento social”, pontua o magistrado na decisão.
Segundo a decisão, a discrepância entre os nomes nos documentos pode desincentivar as pessoas trans a acessarem serviços públicos essenciais, como saúde e educação. “O temor de serem humilhadas ou discriminadas pode levar à exclusão dessas pessoas de serviços vitais, agravando sua vulnerabilidade social”, conclui o juiz.
A decisão também vale para outro processo ajuizado pelas Associações Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), em 2022, com os mesmos argumentos. As entidades apontam que o simples ato de apresentar um documento com um nome que não corresponde à sua identidade de gênero pode gerar situações de desconforto e humilhação pública.
Entenda a liminar
O pedido foi realizado no Ministério Público pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) e pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT).
Segundo as associações, dois pontos precisavam ser mudados nos documento: Unificação dos Campos “Nome”: O CIN deveria excluir a diferenciação do “Nome Social” e do nome de registro, de forma prioritária e destacada, facilitando a identificação de pessoas trans e travestis e respeitando a identidade de gênero; Exclusão do Campo “Sexo”: O novo layout do CIN não deve conter o campo para evitar constrangimentos e discriminações baseadas na identidade de gênero.
“Esta decisão é fundamental para garantir a cidadania, o respeito e a segurança de pessoas trans e travestis no país. Sobretudo porque, ao reconhecer os problemas que estavam presentes no novo RG e nos cadastros governamentais, a justiça corrige um erro do governo que optou por não implementar devidamente as políticas de respeito à autodeclaração de gênero e ao nome, incluindo o nome social das pessoas trans”, afirma a ANTRA.
Entenda o caso
Ao acolher os pedidos, a Justiça Federal levou em conta relatório técnico apresentado em 2023 pela Câmara-Executiva Federal de Identificação do Cidadão (Cefic), na mesma linha do que sustenta o MPF, a Antra e a ABGLT. O órgão técnico, responsável pela edição das normas relacionadas ao documento de identidade, defendeu no relatório a exclusão do campo “sexo”, bem como a integração dos campos para informar o nome civil ou social.
Além disso, com base nessa orientação, o próprio governo federal anunciou publicamente que o formato da nova carteira nacional de identidade – definido na gestão anterior – seria reformulado para atender os parâmetros propostos pela Cefic e não discriminar pessoas transexuais.
Contudo, em novembro de 2023, foi publicado o Decreto nº 11.797/2023, que prorrogou o prazo para os Estados e o Distrito Federal emitirem o novo documento. A norma ignorou as conclusões técnicas da Câmara-Executiva, ao determinar a manutenção dos campos “nome” e “nome social”, bem como o campo “sexo”, sem nenhuma justificativa.
Segundo o site oficial do governo federal, mais de seis milhões de pessoas já emitiram o novo documento. Por isso, a Justiça Federal considerou que a medida urgente se justifica, diante dos riscos que a manutenção do atual leiaute pode gerar aos direitos da população trans. Pessoas que já emitiram a identidade no formato atual não serão obrigadas a emitir um novo documento, caso não desejem.
Com informações do Ministério Público Federal no Acre (MPF/AC).
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