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O Acre é delicioso

Por
Itaan Arruda

O Acre é delicioso

Como o bom momento do cacau no mercado global pode acelerar a recuperação de áreas degradadas usando os Sistemas Agroflorestais como ferramenta
Fotos: Sérgio Vale
por Itaan Arruda
Uma estratégia está em curso. Parte dos 380 mil hectares de pastagens degradadas do Acre tem sido convertida em áreas produtivas com diferentes cultivos. Isso possibilita renda de forma escalonada para muitas famílias. E o cacau acreano é o destaque da vez.

Há, em execução, o programa “Cacau Socioambiental: Incentivo ao Extrativismo do Cacau Selvagem e ao Cacau de Cultivo no Estado do Acre”, elaborado pela Secretaria de Estado de Agricultura. O nome do programa não é muito popular, mas é didático para expor o cenário.


Pela descrição do nome, é preciso perceber duas grandes “famílias”. A primeira: o cacau “selvagem”, nativo, próprio da floresta. Está lá. Com as características físico-químicas que os milhões de anos daquele espaço geográfico construíram. É preciso apenas saber colher, respeitando o tempo da floresta. A segunda família: o cacau “de cultivo”. Plantado, com cálculo, lógica, métrica e ambições humanas. Tanto um quanto o outro estão muito valorizados no mercado.


“Nós estamos vivendo um momento muito atrativo para o cacau”, contextualiza o secretário de Estado de Agricultura, José Luiz Tchê. “E a ideia é aproveitar não apenas esse cenário favorável agora, mas tornar o ambiente sustentável economicamente e ambientalmente para o pequeno produtor no longo prazo”.


Bahia, Espírito Santo e Pará são os três estados referências para cotação de preços do cacau no país. Na sexta-feira (24), a arroba do cacau na Bahia estava sendo comercializada a R$ 662. O preço da saca no Espírito Santo estava R$ 2.648,00. No Pará, o quilo do produto estava custando R$ 46. Na Bahia e no Espírito Santo, a variação foi positiva (comparada ao dia anterior) de 1,85%. No Pará, a variação foi negativa de 2,13%.
Há dois méritos do governo. O primeiro é respeitar o Zoneamento Ecológico Econômico e os estudos da Embrapa, uma das parceiras do programa de fortalecimento da cadeia produtiva do cacau, junto com a Fundação de Tecnologia do Acre (Funtac).
O segundo é tentar entender que a ideia de sustentabilidade exige compreender o tempo do lugar em que se está, do povo que vive nesse lugar e do mercado. Geografia, Cultura e Mercado: esse tripé integra os fundamentos da consolidação de um produto.

“Combinado com o grande momento que o cacau começou a ter, a crescente, desde o ano passado, no mercado brasileiro e internacional, nós estamos preocupados em fazer as coisas ‘pé no chão’. Temos que construir as bases, os alicerces. Caso, contrário, uma boa iniciativa, uma grande oportunidade pode dar com os burros n’água se a gente não tiver um pé na realidade”, pondera o engenheiro agrônomo com mestrado em Gestão e Conservação de Recursos Naturais, Marcos Rocha da Silva.


Cacau de cultivo e cacau nativo: ambos estão valorizados e muitas comunidades do Acre podem ter cadeia produtiva que viabilize a produção integral do chocolate. Desafio é deixar de ser apenas produtor de insumos para indústrias de outras regiões do país
Um dos coordenadores do programa de fortalecimento da cadeia produtiva do cacau no Departamento de Produção Familiar da Secretaria de Estado de Agricultura, Marcos da Silva tem consciência de como os números do Acre ainda são muito modestos.
Na gestão de Gladson Cameli, a Seagri colocou o fortalecimento da cadeia produtiva do cacau na agenda institucional ano passado. O programa atende inicialmente 1000 famílias. Ao todo, isso abrange uma área de apenas 1000 hectares. Metade dessa área está no Vale do Rio Juruá. Os outros 500 hectares estão espalhados pelas outras regionais, com destaque para Manoel Urbano.
As fontes de financiamento são basicamente duas: o próprio Governo do Acre e o Programa REM no Acre (custeado pelo governo alemão). No Vale do Juruá, duas comunidades são trabalhadas pela Seagri: a do Projeto de Assentamento Recanto e do Projeto de Assentamento Lago do Tapiri.

“Cacau com Elas” aponta viabilidade da mini-agroindústria

Em Cruzeiro do Sul, uma associação de produtoras já entendeu o movimento em torno do mercado do cacau. A “Cacau com Elas” reúne cerca de 10 mulheres do Projeto de Assentamento Recanto. O grupo pode dobrar a mini-agroindústria que já produz o “Chocolate Artesanal” e deve produzir também a “massa do cacau” (insumo usado na grande indústria alimentícia).


Utilizando a modalidade “bean to bar” (mistura do chocolate com outros elementos), o produto tem a soma de sabores da banana, amendoim e coco, tudo produzido na região. O “Cacau com Elas” deve receber incremento de R$ 200 mil para melhorar todo o processo produtivo, chegando até na mudança da embalagem. Só para a estrutura física da mini-agroindústria está previsto o investimento de R$ 90 mil.


Associação de produtoras do Projeto de Assentamento Recanto será beneficiada com ampliação da mini-agroindústria para produção do Chocolate Artesanal

O mercado compreende a grandeza de ser pequeno. Uma demonstração prática é perceber como o Vale do Rio Juruá já desperta atenção de agentes importante na cena cacaueira do país. Há aproximadamente 15 dias, esteve em Cruzeiro do Sul um alto executivo da marca Cacau Show. Ele deve iniciar trabalho que relaciona a compra do cacau nativo e do cupuaçu, tudo produzido pela comunidade Ashaninka. Também na modalidade “bean to bar”, o “cupolate”.


Chocolate Artesanal produzido em Cruzeiro do Sul na modalidade “Bean to bar”: mistura de elementos muito valorizada no mercado

Cacau com farinha dá chocolate e quer extrapolar fronteira

O chocolate “Além do Cacau” tem Acre no meio. O cacau baiano se mistura com a farinha de macaxeira do Acre. O resultado é uma composição inédita que transita da leveza à crocância chamada “O Acre Existe”.


Em março desse ano, embarcou na ideia do Exporta Mais Amazônia, apresentada pela Apex, agência de promoção das exportações brasileiras, presidida pelo também acreano Jorge Viana. O dono da marca, o acreano Leandro Brasil, quer entrar no competitivo mercado norte-americano. Os fornecedores da farinha que compõe o barra “O Acre Existe” são escolhidos com muito critério pelo próprio empresário.


A marca acreana “Além do Cacau” tem unidades de venda em Rio Branco e em Foz do Iguaçu.


“O Acre Existe” mistura o cacau da Bahia com a farinha do Acre. Marca “Além do Cacau” quer entrar no competitivo mercado norte-americano
Foto: Sérgio Vale


Foto: Sérgio Vale
Foto: Sérgio Vale

“O Acre Existe” mistura o cacau da Bahia com a farinha do Acre. Marca “Além do Cacau” quer entrar no competitivo mercado norte-americano
Foto: Sérgio Vale


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Resumo do ciclo em perguntas e respostas

O que está em jogo?
Restauração de florestas.
De que forma?
Consorciada à recomposição das áreas degradadas (passivos ambientais) com produção agro-extrativista de diversas cadeias: banana, açaí, cacau.
Qual diferencial do cacau?
O cacau é uma commoditie. No momento, está valorizada.
Papel do Estado?
Formular política pública para criar ambiente econômico ao pequeno produtor, ao extrativista, que viabilize toda a cadeia de produção do chocolate aqui mesmo no Acre.
Qual o cenário local?
Por enquanto, o Acre ainda funciona como um mero fornecedor de matéria prima. No geral, o insumo sai daqui semi-industrializado. O desafio é fazer com que o chocolate seja produzido inteiramente no Acre, semelhante à experiência que já ocorre com o “Cacau com Elas”.
Como ampliar?
Essa experiência “Cacau com Elas” tem que ser amplificada. Para isso, é preciso aumentar e adensar a lavoura cacaueira, respeitando o que aponta o ZEE. No caso do Acre, com uma ressalva: utilizando a criação dos Sistemas Agro-florestais. Esse é o diferencial. Não se trata de plantar cacau em grande escala. Aqui no Acre, trata-se de recompor floresta, manejando o cacau nativo.
Isso é apenas um “mascaramento”?
Tudo é uma questão de perspectiva. É preciso frisar: a primeira referência é “recompor floresta”. Essa é a meta final. Para isso, usa-se os SAF’s como instrumento. O problema é que isso não acontece da noite para o dia. E, associado a isso, há pessoas que moram nessas regiões que precisam ter renda. Novamente: respeitando o que diz o ZEE, é preciso observar o tempo que a floresta exige.
Cacau nativo fruto de recomposição de área degradada e do manejo em Sistemas Agroflorestais

Itaan Arruda

Jornalista, apresentador do programa de rádio na web Jirau, do programa Gazeta em Manchete, na TV Gazeta, e redator do site ac24horas.


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