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Que integração é esta?

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Itaan Arruda

Que integração é esta?

Acre tende a ser apenas um corredor de exportação nas Rotas da Integração Sul-Americana. Proposta apresentada pela ministra Simone Tebet desafia iniciativa privada e governos por um fator: a educação da classe trabalhadora acreana.


Texto: Itaan Arruda
A visita da ministra de Estado de Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, serviu para apontar ao Acre um perigo iminente: a possível exclusão econômica que o projeto “Rotas de Integração Sul-Americana” pode impor ao Acre. E o maior desafio aos governos e às empresas locais não guarda relação com a infraestrutura, construção de pontes, estradas, aeródromos, portos ou com a organização burocrática de aduanas e barreiras sanitárias. Essa é a parte menos complicada. Poucos têm observado o maior gargalo: a educação do trabalhador acreano. O documento “Educação: a juventude e os desafios do mundo do trabalho”, formulado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), deveria, no mínimo, relativizar o entusiasmo com uma ideia de integração que pode consolidar ainda mais a exclusão econômica no Acre.
Dos 9,2 mil projetos do Novo PAC, 124 encontram-se inseridos na área geográfica do Rotas de Integração Sul-Americana. Nos 11 estados brasileiros impactados diretamente com a execução desses projetos, o que os governos (nas três esferas administrativas) e as empresas regionais estão pensando quanto à formação da classe trabalhadora? Caso a resposta seja “educação profissional” ou “institutos federais” do lado de cá das fronteiras, a análise da Confederação Nacional da Indústria demonstra que há fatores mais básicos e urgentes a serem resolvidos.
A primeira desconfiança que se deve ter em relação às prioridades diz respeito à educação básica. Nesse aspecto, as redes municipais de ensino se agigantam. De acordo com o Inep (Censo Escolar de 2021), a distribuição de matrículas da educação básica está concentrada nas redes municipais: 48,4%. Na rede estadual, estão 32,1% das matrículas; na Rede Federal, 0,9%. Esse dado mostra um “alerta”. Como o MEC tem acompanhado os planos de cargos, carreira e remuneração nas prefeituras dos 11 estados impactados pelo projeto Rotas da Integração? Como está a formação dos professores dessas cidades? Os municípios precisam ter a “infraestrutura da Educação” fortalecida caso queiram ter a possibilidade de competir efetivamente pela distribuição de riqueza gerada por esses grandes projetos econômicos.

Aprendizado em Língua Portuguesa e Matemática expõe desafios

O aprendizado em Língua Portuguesa e Matemática no Acre é muito ruim, comparado a outros estados da federação. Com dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2019, apenas 29,2% dos alunos do Ensino Médio acreano tiveram “aprendizado adequado” em Língua Portuguesa. Traduzindo: compreenderam o que leram em determinada avaliação.
O cenário piora bastante quando o assunto é Matemática. Apenas 5,9% dos alunos do Ensino Médio tiveram aprendizado adequado. A avaliação é de Educação Básica: são rudimentos de álgebra, contas elementares para um aluno de Ensino Médio responder. O Acre tem o sétimo pior desempenho no país. Esse contexto de má formação chega na rotina das empresas.
Gráfico mostra o desempenho do estudante acreano em Língua Portuguesa comparado a alunos de outros estados
Gráfico mostra o desempenho do estudante acreano em Matemática comparado a alunos de outros estados
Para a Confederação Nacional da Indústria, até mesmo o modelo de Educação precisa ser repensado. Entusiasta da formação técnica, a CNI afirmou. “O Brasil deu importante passo ao avançar em políticas públicas_ por exemplo, a Base Nacional Comum Curricular e o Novo Ensino Médio_ por meio de mudanças relevantes na legislação, que sinalizam o compromisso do país na superação do modelo educacional passivo-reprodutivo”.
No país, desempenho em Língua Portuguesa e Matemática mantém média baixa ao longo dos últimos 25 anos

Acesso a novas tecnologias ainda é limitado

Pesquisa sobre uso de Tecnologias de Informação e Comunicação nas escolas brasileiras traz dados dados de 2019. São os mais recentes sobre o assunto. O contexto da pandemia acabou evidenciando de forma mais grave essa falha na educação brasileira. O isolamento necessário deixou muitos estudantes sem acesso a conteúdo com a agilidade necessária. De acordo com o Centro de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic), 39% dos estudantes de escolas públicas urbanas “não contam com nenhum tipo de computador no domicílio”. O documento não faz o recorte para os estados. Mas não é preciso muita imaginação para perceber que esse percentual pode ser muito mais agravado no Acre.
Tião Bocalom entrega tablets para alunos da rede municipal de ensino. Inclusão digital ainda longe da rotina do estudante acreano

Rotas da Integração Sul Americana reformulam Iirsa

O primeiro fator que precisa ser observado é a falta de ineditismo: o Rotas da Integração Sul-Americana e as diversas derivações (Rota Ilha das Guianas; Rota Multimodal Manta- Manaus; Rota de Capricórnio; Quadrante Rondon; Rota Porto Alegre-Coquimbo) não são novidades.
A ideia essencial de viabilizar negócios a grandes conglomerados empresariais em todo Cone Sul ganhou forma de projeto há, pelo menos, 26 anos, com a criação da Iirsa (Iniciativa para Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana).
À época, o entusiasmo gerou frutos por aqui. Vale lembrar que o Brasil vivia o otimismo gerado pela estabilidade da moeda; o governo de Fernando Henrique Cardoso conquistou também estabilidade na seara política (mesmo com todos os percalços que isso signifique no Brasil) e, aqui no Acre, Jorge Viana e a Frente Popular subiam as rampas do Palácio Rio Branco.
Está no contexto dos projetos da Iirsa, por exemplo, a “Caretera Interoceanica” (Rodovia do Pacífico ou ainda Estrada do Pacífico). À época, fez muito sucesso por aqui a peça publicitária do Governo do Acre em que um senhor, às margens da BR-317, na região de Assis Brasil, perguntava (olhando para o céu e erguendo os braços mostrando a estrada) “… A diferença não é grande?”. A alegria do agricultor estava, claro, na chegada do asfalto que passava em frente à propriedade dele. Vinte e seis anos depois, qual pergunta ele faria hoje?
A inauguração do trecho brasileiro até a região da tríplice fronteira dessa rodovia contou com a presença do presidente do Peru, Alejandro Toledo; da Bolívia, Carlos Mesa, e do presidente brasileiro, Fernando Henrique Cardoso. Foi uma das últimas obras entregues no segundo mandato do tucano, em parceria com o Governo do Acre. O governador à época era Jorge Viana.
Nos anos seguintes, Lula, acompanhado de Alejandro Toledo, do Peru, e Carlos Mesa, da Bolívia, inaugurou a Ponte da Integração Brasil-Peru.
Lado brasileiro da Estrada do Pacífico teve construção na gestão do então presidente Fernando Henrique Cardoso e Ponte da Integração, inaugurada por Lula
O Brasil possui 16,9 mil quilômetros de fronteiras por terra ou rios espalhados entre 11 estados da federação. Nesse espaço geográfico, há 33 cidades-irmãs, semelhantes a Assis Brasil, Brasiléia, Plácido de Castro. A ideia de criar um ambiente econômico mais dinâmico nessas regiões não é equivocada. O problema é tentar fazer isso sem oferecer condições para solucionar problemas básicos. E a falta de formação da classe trabalhadora é um deles.
Há dois megaprojetos que podem construir um cenário redentor à economia acreana ou podem transformar a região em um simples corredor estratégico para grandes empresas de outras regiões e países. O primeiro a ser lembrado é o porto de Chancay, no Peru. Orçado em US$ 3,6 bilhões, é formado, majoritariamente, por capital chinês.
O segundo é a Ferrovia Norte-Sul, a ambiciosa proposta de ferrovia transoceânica ligando o Atlântico ao Pacífico e construindo uma alternativa competitiva ao Canal do Panamá para escoamento da safra de grãos brasileira ou para entrada de produtos chineses diminuindo o trânsito marítimo de mercadorias em até 14 dias. Esse é outro projeto que está na mesa do governo brasileiro há quase 30 anos.
Ou o Governo do Acre, as prefeituras dos 22 municípios e empresas acreanas despertam para o papel estratégico da Educação nesse cenário de agressiva competitividade do comércio internacional ou as coisas podem ficar piores por aqui para quem já é excluído hoje.
Governos e empresas locais precisam despertar para o papel estratégico da Educação

Itaan Arruda

Jornalista, apresentador do programa de rádio na web Jirau, do programa Gazeta em Manchete, na TV Gazeta, e redator do site ac24horas.


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