O primeiro trimestre de 2024 chega ao fim com as marcas de dois panoramas climáticos extremos para os estados amazônicos do Acre e de Roraima. Enquanto o primeiro registrou cheias históricas, e ainda tem a ameaça de um nova enchente em Cruzeiro do Sul, banhada pelo Rio Juruá, o segundo passa por estiagem igualmente histórica e bate recordes de incêndios.
No Acre, dezenas de milhares de famílias, a maior parte na Capital, enfrentaram problemas causados pelas chuvas que começaram a ganhar força a partir do dia 20 de fevereiro. Com cheias de volume inédito do Rio Acre em pelo menos três cidades (Assis Brasil, Brasiléia e Epitaciolândia), o Estado viu 19 dos 22 municípios sob decretação de situação de emergência
Já a seca em Roraima persiste desde outubro de 2023, quando o Acre também vivia a mesma situação. Embora comum nesse período do ano — o chamado verão amazônico, de agosto a meados de novembro — a estiagem é uma das mais severas em 17 anos. De acordo com o Inmet, choveu apenas 14% do esperado em janeiro e 21% do esperado em fevereiro deste ano.
Além da estiagem, incêndios também consomem Roraima. De acordo com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), em fevereiro de 2024, o estado teve 2.057 focos de queimadas, o que corresponde a 45% de todos os focos de incêndio do país. Nesta sexta-feira (29), o número de focos no estado é 4.039, o que corresponde a 316% acima do registrado em 2023.
A seca severa, que aumenta as possibilidades de incêndio, reduziu a vazão dos principais rios e levou 14 dos 15 municípios do estado a decretarem emergência. Mesmo com os esforços emergenciais, pelo menos 4 cidades tiveram o fornecimento de água encanada interrompido e são abastecidas por caminhões-pipa. Uma “cortina cinzenta” de fumaça no céu provoca intoxicação na população de Roraima.
O que explica os extremos
De acordo com especialistas do clima, tanto as cheias no Acre como as queimadas em Roraima têm como uma das explicações principais o El Niño, evento cíclico marcado pelo aquecimento das águas do Oceano Pacífico equatorial, que predominou em todo o mundo em 2023, agravando os extremos climáticos com impactos a serem sentidos até abril de 2024 – pelo menos.
Em outubro do ano passado, um artigo de pesquisadores da Universidade Federal do Acre (Ufac) mostrou que a recorrência de extremos climáticos no Acre subiu a partir de 2010, quando ocorreu uma ruptura do padrão vigente até então e que a situação aponta para um novo padrão no futuro, com um ambiente que não consegue se regenerar por causa da sucessão de extremos.
Publicado na revista Perspectives in Ecology And Conservation, o estudo diz que a intensificação dos eventos climáticos extremos já é realidade em todo o mundo e que o Acre registrou 254 desses eventos entre 1987 e 2023, sendo 60% incêndios florestais e queimadas em áreas desmatadas, 33% inundações e 6% crises hídricas que, em média, afetaram seis municípios por ano.
Em Roraima, o aumento dos incêndios florestais se relaciona com as queimadas controladas, segundo estudo do Greenpeace Brasil. Esses incêndios, utilizados para limpeza de áreas na zona rural, são autorizados pelo governo estadual, e são legais. De acordo com o levantamento, o governo local concedeu 55 licenças ambientais para queimadas controladas em pleno período de seca.
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