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Quem sobe o rio pelo remanso fica do mesmo lado do barranco

FOTO: SÉRGIO VALE

As vazantes dos rios deveriam exigir muito de toda sociedade acreana em tempos de mudanças climáticas e aquecimento global. Já se tratou disso no editorial anterior. A manutenção do assunto neste espaço oferece uma dimensão do quão urgente é este debate. Não se pode entender isto como “repetição de um tema”. É preciso entender o gesto aqui retomado como “pressa”. Não há mais tempo a perder.


Primeiro é preciso reconhecer que tanto o governador do Acre, Gladson Cameli, quanto a prefeita de Brasileia, Fernanda Hassem, apreenderam a necessidade de mudar o centro administrativo e comercial da cidade para uma área mais alta. Isso ficou evidente nas entrevistas e discursos.


É certo que há uma distância entre isto e a ação efetiva. Mas a palavra oferecida já é uma conquista. Serão necessárias medidas impopulares, traumáticas e que impactam em muitos interesses. Mas é necessário alguém ser antipático e impopular para fazer aquilo que precisa ser feito. Como isso se equaciona com o calendário político de Hassem e Cameli só a maturidade da gestão deles pode dizer.


Só a intenção dita pelos governantes do Acre já chama atenção de quem observa essas reações do poder público diante dos fenômenos climáticos. Parte da imprensa nacional já noticiou a possível mudança da modesta cidade acreana. Caso Brasileia efetive esse deslocamento do centro administrativo e comercial, será uma das primeiras do país a se adequar; será uma das primeiras do país a adotar uma medida de mitigação traumática, porém necessária. E é bom outras cidades do Acre aprenderem com o exemplo de Brasileia. Ele deveria ser pedagógico.


Por falar em pedagogia, o que o Acre ainda não aprendeu foi construir um ponto de equilíbrio entre a postura política adequada e o amparo e acolhimento às famílias que moram em áreas vulneráveis à ação dos rios e igarapés.


Políticos de qualquer espectro ideológico, da direita à esquerda, não vacilam em cair n’água para carregar fogão e bacias junto com homens da Defesa Civil, do Corpo de Bombeiros e do Exército. E essa disposição toda, claro, só se realiza, desde que acompanhada da equipe de fotógrafos, cinegrafistas e (pacote da moda) digitais influencers. Não adianta turbinar redes sociais simulando preocupação enquanto nem mesmo as famílias acolhidas no maior abrigo público da Capital estão se sentindo respeitadas.


Mesmo levando em conta a pré-disposição de todo ser humano de reclamar (sobretudo em momentos de tanta tensão), há imagens que falam por si. Todos (incluindo as equipes das prefeituras) estão estressados, cansados. E se os gestores estão fatigados, imagine-se o morador excluído de tudo o tempo todo, com ou sem alagação!


E se o cansaço está deixando impaciente as equipes da administração pública, é bom tomar mais caiçuma. O momento de cuidado com a acolhida às famílias ainda não acabou. A vazante dos rios exige redobrada atenção e recursos. Não seria demais lembrar que as secretarias municipais já deveriam estar suficientemente equipadas com medicamentos adequados às doenças diretamente relacionadas à alagação, com destaque para a leptospirose: já existem 177 casos registrados da doença só nos dois primeiros meses do ano no estado.


Não é de hoje que o Acre conhece as incompetências, os movimentos populistas e as malandragens que acompanham toda alagação. É difícil um ano em que o cidadão não esteja sujeito a essas correntezas da política. Não é fenômeno novo. O cidadão sabe que durante as travessias não há remanso possível: tem que enfrentar a correnteza. Quem sobe o rio pelo remanso fica do mesmo lado do barranco.


O Acre vive exatamente esse impasse. Precisa mudar de perspectiva, precisa promover mudanças graves na forma de encarar os novos modos de vida em meio às mudanças climáticas. O Acre sabe que precisa “mudar de barranco”. Há, no entanto, que vencer a “travessia”. É preciso estar disposto a isso. Quem está?


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