É preciso fazer uma correção ao que a turma do governador Gladson Cameli tentou massificar durante a semana. A martelada da ministra do Superior Tribunal de Justiça e relatora da Operação Ptolomeu na corte, Nancy Andrighi, em nenhum momento, suspendeu o julgamento. A ficção oficial do Palácio ainda foi mais longe, tentou emplacar a ideia de que a suposta suspensão teria ocorrido “por falta de provas”.
A tropa oficial não falou a verdade. Simples assim.
Zelosa, Andrighi sabe que o respeito “devido processo legal” precisa ser observado sempre. E se a defesa de Cameli alegou, calculadamente, que não teve acesso à íntegra das peças acusatórias, então que isso seja atendido. Se a defesa alega que os ditos Relatórios de Análise de Polícia Judiciária elaborados pela Polícia Federal não chegaram ao colo da defesa, então que se providencie isto.
Todas as manchetes, toda a alegria oficial do Palácio Rio Branco residiu neste singelo movimento ritual. Uma filigrana processual que desautorizaria qualquer entusiasmo rumo à ideia de inocência, caso os assessores de Gladson fossem providos do mínimo cuidado em observar os fatos como os fatos são.
Se alguma coisa foi suspensa, pode-se dizer (para frenesi de algum palaciano mais apressado em massagear o humor do chefe) foi o prazo para que a defesa responda à acusação. Isso não muda em nada o andamento do processo. Frisa-se: não muda em nada o andamento do processo.
As danações apresentadas pelo inquérito da Ptolomeu estão lá, pujantes, inquietas, brilhando.
Aliás, há quem diga que o martelo da ministra Nancy Andrighi é temperamental, meio sisudo, pouco afeito a sorrisos fáceis. Mas dizem também que ele não é avexado. É tranquilão: consciente do peso que tem, sabe a hora certa de se mexer. Não gosta que ninguém corrija o som produzido depois de batido.
É até engraçado observar o desespero da corte acreana quando alguma coisa acontece no STJ em relação à Operação Ptolomeu. O processo ainda não foi, digamos, “transformado” em Ação Penal. Explicando de forma bem simples: digamos que as supostas danações de Gladson e sua tropa foram registradas pela Polícia Federal. Tudo foi escrito em um documento chamado “inquérito”. Esse documento foi apresentado para quem é o acusador formal, o Ministério Público Federal. E o MPF bateu na porta do STJ dizendo assim: “Repara, STJ! Olha essa danação desses meninos lá do Acre!”. E está assim.
É bem capaz que a ministra Nancy Andrighi ainda nem tenha queimado muita pestana com isso. O que ela não se permite é que defensores de traquinagens balbuciem que o devido processo legal não foi respeitado.
A pressa palaciana em mentir para criar uma imagem de injustiçado em torno de Gladson Cameli expõe, na verdade, o desespero. O próprio Cameli tenta dissimular: tem se apresentado em agendas oficiais com ar mais sereno, menos brincalhão e quando abordado sobre o problema calcula as palavras que saem de sua boca com vagar e frágeis, quase conscientes de que não convencem nem a ele mesmo.
Os cálculos políticos que rondam o Palácio Rio Branco, em torno da Operação Ptolomeu, devem estar intensos. Ao menos, deveriam. Porque a cena não é boa para o líder do paço. Não tranquiliza o governante, consciente do que fez (inclusive do que diz não ter feito). Quais as alternativas jurídicas Gladson tem para evitar o possível afastamento é uma dúvida ainda difícil de ser sanada. Até o fim deste mês de fevereiro, há muitos ritmos a serem ouvidos e sentidos. O martelo de Nancy está calmo, mas tem lá os seus caprichos: só para deixar mais emocionante o clima, fica com a parte da cabeça quieta, parada, mas o cabo vai batendo levemente, de forma sutil. Um ouvinte atento é capaz de decifrar o que se diz lá longe… o som chegando devagar… aproximando-se, ameaçador para alguns: “Toc! Toc! Toc!”
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