A enfermeira Géssica Melo de Oliveira, de 32 anos, mãe de três crianças, que tinha os tormentos e aperreios que lhe cozinhavam o juízo em um mundo desajuizado, morreu pela ação de policiais despreparados. Mais que isso: como mostra o advogado de defesa da família de Géssica, são policiais despreparados e mal-intencionados.
O despreparo é evidente: estavam em um automóvel mais potente; fazem parte de uma corporação: tinham como agir com inteligência pedindo apoio. Teriam, portanto, como reagir de diversas formas, diferente do amparo fácil no gatilho de um fuzil.
A má intenção também fica evidente, como demonstram os fatos. Não que os policiais já tivessem previamente decidido agir por maldade. Ninguém sai de casa com o intento: “Hoje é dia de matar uma enfermeira! Vou dá-lhe um tiro bem na pleura!”. Só um insensato pensaria assim. A má intenção e a má índole são mais manhosas, misturam-se com o despreparo.
(Como o ac24horas não tem elementos comprobatórios, reserva-se o direito de nem adotar a tese da defesa de que a pistola 9 milímetros completamente municiada foi “plantada” pelos policiais, que alegaram o armamento estar de posse da enfermeira). O jornal limita-se a abarcar o fato no instante seguinte, continuando a acompanhar o entendimento da defesa da família da mulher morta.
Ao perceber o problema, o que fez o algoz do gatilho ligeiro? Danou-se em ir a uma delegacia apressar a versão de que Géssica teria sido vítima de um acidente de trânsito. O dono do dedo que apertou o gatilho é o mesmo cuja língua mentiu em uma versão desmascarada por um corpo machucado por balas. Eis a má índole.
Sem contar outro detalhe trazido pela defesa. Onde estavam os policiais rodoviários federais no momento de stress extremo? Faziam parte da blitz, segundo consta no boletim de ocorrência. O problema aconteceu em uma rodovia federal, lugar de trabalho dos agentes da PRF. Assim como os dois policiais do Gefron envolvidos na morte, não deveriam os federais também ter sido presos? Há lógica no que defende o advogado.
De tapa na cara em adolescente no bairro Jorge Lavocat, passando por morte de empresário da Amadeo Barbosa até chegar ao caso de Géssica, a Polícia Militar do Acre vai consolidando uma imagem de despreparo. A tropa do Acre está muito longe de ser a mais letal. A questão não é essa. O problema é de fortalecer na comunidade a imagem de um agente de segurança pública que tem limitada capacidade de avaliação de como reagir em momentos de extremo stress.
Nenhum cidadão precisa de um policial que vacila; nenhum cidadão quer um policial que não saiba o que fazer em momentos de aperreio. O uso da força; o uso do armamento fazem parte de uma série de protocolos, métodos, de uma forma de trabalho.
Existe treino para isso. Existe estudo. Existe preparo. Ninguém está aqui dizendo que é uma função fácil. Ao contrário. É difícil ser policial. No entanto, o que o cidadão não pode deixar permitir é que aumente na tropa os adeptos do método de atirar primeiro e perguntar depois. Por um motivo simples: a próxima vítima pode ser o cidadão permissivo, que minimiza o erro achando que nunca estará na linha de tiro da insensatez e do despreparo.
Há dois caminhos para evitar que o problema se agrave: intensificar o uso de tecnologia pelos integrantes da tropa e fazer com que os policiais acreanos tenham intensa carga de estudo na academia de formação. Estudo continuado. E quando se fala em “estudo” para policial não é apenas de régua, compasso e cálculos de catetos e cossenos. É preparo físico, aulas de tiro, defesa pessoal. Tudo isso por uma questão lógica: um agente tão importante para a Segurança Pública não pode ser ameaça à cidadania.
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