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A política, a sorte e a venda de confecção

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Editorial ac24horas
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Na vida, há pessoas com sorte. E há Mailza Assis. De uma modesta vendedora de confecções em Senador Guiomard até a possibilidade de vir a ser governadora do Estado do Acre, há um breve itinerário. Um roteiro com passagens diretas em cargos do Legislativo e do Executivo que garantiram uma escalada social meteórica desta senhora, sem que o povo tivesse lhe conferido um mísero voto de confiança. Ela sempre soube calcular sorrisos e as simpatias mornas na hora, lugares e rumos corretos.


Esse talento trouxe para o currículo de Mailza cargos como o de secretária de Administração de Senador Guiomard (na gestão do então esposo James Gomes, claro); senadora por quatro anos (suplente de Gladson Cameli, claro) e vice-governadora na chapa de Gladson Cameli, claro. Caso os cometas se alinhem e não tumultuem as sensíveis nuvens da política por aqui, ela deve assumir o Governo do Acre no lugar de Gladson Cameli (claro), caso ele se eleja senador novamente.


Para sentar na cadeira mais cobiçada do Palácio Rio Branco, Mailza, além de contar com a mania de generosidade do povo acreano, pode ter uma aliada incomum: Nancy Andrighi, a ministra relatora da Operação Ptolomeu no Superior Tribunal de Justiça. O STJ (quem sabe?) pode antecipar a sorte da atual vice-governadora e lhe colocar em um degrau acima, antes do protocolar ano de 2026.

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Aliás, o STJ tem sido muito solidário com Mailza Assis. Explica-se. Quando ainda era estratégico assinar o “Gomes”, a então secretária de Administração de Senador Guiomard viabilizou um contrato com a empresa MS Serviços para limpeza de ruas e prédios públicos. Esse contrato foi formalizado logo no início da gestão de James Gomes, em janeiro de 2009. Dias após a posse. A dupla foi ligeira. De acordo com o MP, não houve licitação.


Os R$ 1,7 milhão, pagos à empresa para execução dos serviços, acenderam o sinal de alerta no Ministério Público do Acre, que viu indícios de irregularidades. Quais indícios? Não se tinha, de acordo com o MP, base legal para a assinatura do contrato naqueles termos, sem licitação. O Ministério Público também não entendia o porquê da contratação de técnico em contabilidade e advogado, indicados pela secretaria de Administração, ter sido realizada pelo Município. Com a dúvida elementar: o que advogado e técnico em contabilidade têm a ver com limpeza de prédios públicos e ruas?


Não deu outra: o MP acusou James e Mailza por improbidade administrativa. Para o Ministério Público do Acre, Mailza e James gastaram dinheiro público sem fundamentação legal. Nem mesmo as estratégias da defesa de anexar um decreto de calamidade apagaram as desconfianças do MP perante a Justiça e a martelada veio. A dupla foi condenada, mas recorreu algumas vezes, claro. E um dos recursos foi parar onde? No STJ, claro.


E já se vão 14 longos anos. O currículo de Mailza (agora) Assis já foi recheado com vários cargos públicos e o STJ, pelas mãos do relator Benedito Gonçalves, nada disse sobre as supostas danações na administração pública da cidade de Senador Guiomard.


O processo está no STJ desde 2018, depois que a dupla fez uma série de apelações no TJ acreano. O fato é que as ruas da pequena cidade de Senador Guiomard já estão cansadas de serem sujas. Os prédios públicos da mesma forma. E o STJ em silêncio.


Qual o sentido de toda essa lembrança, afinal? Do ponto de vista político (frise-se: do ponto de vista estritamente político) Mailza, com sobrenome “Assis” ou “Gomes”, não desobedeceu a nenhuma determinação da Justiça. Os seus passeios por quatro anos nos ministérios em Brasília “em busca de emendas para realizar obras para o povo” foram legais? Sim, foram.


Se na esfera política, tudo está dentro da lei, então qual é o problema? O problema não está nem com Mailza Gomes, nem com Mailza Assis. O problema está na qualidade da representatividade política. Aí existe um problema. Como é possível uma pessoa que não recebeu um único voto no itinerário político conquistar tantos espaços na vida pública e espaços que, politicamente, deveriam ter o aval do povo? Não se está aqui a defender que os cargos de vice, por exemplo, voltem a ser referendados pelo voto.


De Floriano Peixoto, passando por Delfim Moreira, Café Filho (o mais famoso vice, que assumiu após o suicídio de Vargas), João Goulart e já na Nova República, José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer, os vices são estratégicos para a política brasileira. Aqui pelo Acre, na história recente, pós retomada da democracia, apenas Romildo Magalhães cometeu o susto de governar o Estado após a morte do então governador Edmundo Pinto.


O exercício da vida pública, assumindo funções de natureza política das mais relevantes, necessitaria passar pelo escrutínio popular. É bom até mesmo para referendar as decisões que o gestor tomar. Pode parecer uma linha de argumentação demasiadamente subjetiva. Pode até ser. Mas é um raciocínio que tem o povo como referência. A Política não pode ser um meio manejado pela sorte. Não pode ser um jogo de conveniência calculado em sorrisos e frases decoradas em púlpitos. Fosse isso, seria mais honesto vender confecções em uma modesta sacola, transitando por ruas sujas e enlameadas.


Tem pessoa que nasce com a lua sobre ela, mas no caso de Mailza, a lua nasceu dentro dela, claro!


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