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Lava Jato segue viva no Peru e na Colômbia – e mantém Odebrecht e políticos sob pressão

Logo da Odebrecht — Foto: Paulo Whitaker / Reuters
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Na semana passada, o ministro Antonio Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), invalidou provas obtidas no acordo de leniência firmado no Brasil pela empreiteira Odebrecht em mais um movimento que mina as consequências políticas e legais da operação Lava Jato no âmbito brasileiro.


A decisão, que ainda pode ser revista pela segunda turma do Supremo, é também acompanhada com atenção nos países vizinhos, onde relatos e informações sobre corrupção repassadas por ex-executivos da empresa e pela própria construtora em acordos locais de leniência também deram origem a processos judiciais de alta voltagem política.


O caso é especialmente emblemático no Peru, onde quatro ex-presidentes foram ou estão sendo investigados por suposto envolvimento em irregularidades ligadas à Odebrecht, num dos mais extensos desdobramentos da Lava Jato no exterior.

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Na semana passada, o depoimento na Justiça do antigo responsável pela construtora no Peru, Jorge Barata, dominou o noticiário peruano.


Já na Colômbia a construtora é alvo de cobrança do presidente Gustavo Petro, que afirma que a Odebrecht não pagou a compensação devida ao país por envolvimento em corrupção – questionada pela BBC News Brasil, a empresa disse que não reconhece essa dívida.


Entenda abaixo os fundamentos da decisão de Toffoli, o posicionamento da construtora e como a a Lava Jato, combalida no Brasil, segue em evidência no Peru e na Colômbia.


O que Toffoli decidiu


Em sua decisão, Toffoli reforça sentença anterior da corte que já afirmava que informações repassadas pelos executivos da construtora ou pela própria empresa não podem ser usadas em processos criminais contra acusados de irregularidades.


Os principais argumentos acatados pelo ministro do Supremo são dois: ele afirma que da Lava Jato pois houve quebra da cadeia de custódia. Ou seja, a produção dessas provas não respeitou a lei.


O acordo da Odebrecht previa que a empresa iria devolver R$ 2,7 bilhões aos cofres públicos e em troca o MPF (Ministério Público Federal) não entraria com ações contra ela na Justiça. A partir de informações obtidas da empresa com esse acordo, o MPF reuniu um material que apresentou como prova contra réus da Lava Jato em vários processos – incluindo um envolvendo o ex-presidente Lula.


O problema, segundo o Supremo, é que esse acordo com Odebrecht foi irregular já que teve participação de autoridades brasileiras, americanas e suíças, mas sem passar pelos canais oficiais necessários.


O problema, segundo o Supremo, é que esse acordo com Odebrecht foi irregular já que teve participação de autoridades brasileiras, americanas e suíças, mas sem passar pelos canais oficiais necessários.


No final de 2017, em meio ao abalo provocado pela operação Lava Jato e após o acordo de leniência firmado com as autoridades brasileiras, a companhia decidiu mudar suas marcas e retirar o nome “Odebrecht” das diversas unidades de negócio.


Atualmente, a empresa tem como nome Novonor. Já o ramo da construtora passou a se chamar OEC, com o descritivo “Odebrecht Engenharia e Construção”. Desde então, sua identidade visual também passou por alterações.


O momento da ‘Lava Jato peruana

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‘Alguns especialistas avaliam que a decisão de Toffoli possa repercutir nas esferas judiciais destas outras nações.


Na última semana, o depoimento do antigo responsável pela Odebrecht no Peru, Jorge Barata, dominou o noticiário deste país.


Na ocasião, o executivo reafirmou que a empresa pagou propina a uma série de importantes nomes da política local, incluindo uma série de ex-presidentes.


A audiência foi realizada de maneira remota, mas Barata foi convocado a depor em solo peruano no caso que envolve o ex-presidente Ollanta Humala.


O executivo Marcelo Odebrecht também havia sido convocado, mas sua defesa alegou que decisões recentes do STF fazem com que seu cliente não tenha de prestar depoimento neste caso.


Uma decisão anterior de Toffoli invalidou evidências obtidas pelos sistemas Drousys e MyWebDay B, que eram supostamente utilizados pela empresa para ocultar o pagamento de subornos.


A promotoria peruana pede 20 anos de prisão para Humala, além de 26 anos e seis meses para sua esposa Nadine Heredia, ambos julgados pelo crime de lavagem de dinheiro pelo recebimento de supostas verbas ilícitas, incluindo da Odebrecht.


O caso envolveria um financiamento de US$ 3 milhões para a campanha presidencial de Humala em 2011.


Em 2018, a Odebrecht chegou a um acordo no Peru no qual se declarou culpada pelas acusações de que ofereceu propina a políticos locais.


Além disso, os executivos da empresa prometeram delatar os envolvidos nos esquemas de corrupção, o que incluía oferecer provas substanciais.


Em troca, os executivos puderam deixar o país, além de poderem sacar fundos que possuíam no Peru. Por parte da companhia, houve a permissão para a venda de ativos locais.


Dentre as negociações, a Odebrecht vendeu a usina hidrelétrica de Chaglla, no centro do país, por US$ 1,4 bilhões a um consórcio chinês. O empreendimento é responsável por cerca de 5% da energia produzida no Peru.


Por outro lado, a empresa teve de pagar uma compensação de 610 milhões de soles (R$ 818 milhões) ao governo peruano, valor acrescido de 150 milhões de soles (R$ 201 milhões) de juros.


O combinado é que os pagamentos sejam feitos de forma gradativa, e, até o momento, 220 milhões de soles (R$ 295 milhões) foram abatidos da dívida.


Procurada pela BBC News Brasil, a Odebrecht afirmou que “a condição da companhia no Peru é de colaboradora do Ministério Público, entidade com a qual firmou um acordo que continua sendo cumprido integralmente pela empresa e que, em contrapartida, lhe confere garantias legais típicas desse tipo de convênio. Em tal contexto não é prevista, portanto, uma estratégia de ‘defesa'”.


‘Brasil está permitindo impunidade no Peru


‘A advogada Delia Muñoz ocupou o cargo de ministra da Justiça e Direitos Humanos durante o governo do ex-presidente Manuel Merino – um mandato que durou 5 dias, entre 10 e 15 de novembro de 2020.


À BBC News Brasil, ela afirma que o acordo foi benéfico para os executivos da Odebrecht, e diz que as compensações pagas pela empresa são “cômodas”, e que demorarão anos para serem quitadas.


Além disso, ela vê a justiça peruana com pouca capacidade para agir apenas com os depoimentos dos executivos, uma vez que as provas mais relevantes seguem no Brasil.


“Quando foi descoberto o pagamento de propina para a conquista de obras, não houve acesso no Peru às grandes evidências que sustentassem as afirmações das acusações feitas pelos executivos da Odebrecht”, afirma.


No caso peruano, entre os grandes empreendimentos envolvidos nos processos estão o metro de Lima e a chamada rodovia Interoceânica, que conecta o país ao Brasil.


Em sua visão, o movimento desta semana no STF dificulta que provas cheguem à justiça local.


“É claro no Peru que esta recente decisão é um claro prejuízo para o país, uma vez que nega o acesso à justiça”, avalia.


“Desta forma, o Brasil permite a impunidade absoluta no Peru. Os réus admitem que pagaram propina e agora vão dizer que as autoridades brasileiras não permitem que utilizem as provas que estão no país”, afirma a ex-ministra.


Em sua visão, os executivos irão continuar fazendo afirmações sobre os envolvidos em corrupção, mas sem apresentar as provas. Para ela, o cenário atual faz com que o fim do caso localmente seja uma possibilidade real. “Vamos viver a situação absurda do caso arquivado apesar de declarações aceitando corrupção. Acho que o caso vai morrer em breve, é muito difícil fazer uma acusação sem provas fortes”, avalia.


“Ficou claro que o Ministério Público peruano confiou na palavra dos executivos de que iriam entregar as provas, mas não foi isso que aconteceu. O caminho agora seria redesenhar a estratégia”, avalia.


Segundo criminalistas consultados pela BBC News Brasil, no entanto, a decisão do STF leva em conta uma série de tratados internacionais determina que, qualquer cooperação jurídica criminal entre o Brasil e outros países precisa seguir uma série de regras.


No caso do acordo feito pela Odebrecht, a cooperação entre o MPF e autoridades estrangeiras deveria ter sido acordada com o DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional), órgão do Ministério da Justiça.


A defesa de Lula já havia pedido, em 2017, para ter acesso a esse acordo que foi celebrado entre Brasil, EUA e Suíça, e a acusação já havia dito que não havia correspondência oficial sobre isso. Agora, a partir de um pedido de Toffoli, o Ministério da Justiça confirmou que não encontrou qualquer registro de que o acordo tenha passado pelo DRCI, o que o torna irregular, segundo Toffoli.


“O MPF não pode sair fornecendo informações nacionais para outros países sem passar pelas vias oficiais”, diz Bruno Salles, membro da diretoria do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim).


“Em síntese, a decisão reforça que as comunicações realizadas entre autoridades devem ser realizadas sempre pelos meios e formas que garantam uma cadeia de custódia da prova”, acrescenta Rogério Cury, professor de direito penal do Mackenzie.


“Havendo violação, tais provas devem ser consideradas ilícitas e desentranhadas dos autos, ou seja, retiradas do processo”, explica o professor.


Forte impacto na política local


m seu depoimento nesta semana, Barata afirmou que a empresa contribuiu para “diversas campanhas políticas, principalmente de presidentes, deputados e prefeitos”.


Dentre os nomes que o executivo citou, estão os ex-presidentes Alan García, Ollanta Humala e Pedro Pablo Kucsynki, além da influente congressista Keiko Fujimori.


Os escândalos da empresa no país envolvem ainda o ex-presidente Alejandro Toledo, que neste ano foi extraditado dos Estados Unidos para ser julgado em solo peruano. Em novembro de 2016, Barata afirmou que a construtora pagou US$ 20 milhões a Toledo em troca da permissão para a construção dos trechos 2 e 3 da Rodovia Interoceânica Sul.


Na visão da socióloga do Instituto Nacional de Estudos Peruano (IEP) Patricia Zárate, o impacto na vida nacional destes sucessivos escândalos segue forte. “A corrupção continua a ser identificada como um dos principais problemas que o país tem”, aponta. “Após o escândalo da Odebrecht, os cidadãos consideraram a corrupção como o principal problema do Peru”, afirma a socióloga.


Além disso, há uma percepção de impunidade, em sua visão.


“Parece que não houve, ou não se sentiu como se houvesse, uma verdadeira luta contra o problema da corrupção porque novos escândalos continuam a surgir, talvez menores, mas são como uma constante, e não há ação tangível”, avalia.


No entanto, segundo ela, há uma diferenciação da empresa com o Brasil, o que não reflete em uma imagem negativa sobre o país vizinho.


“Há coisas mais positivas, como o futebol, que estão sempre na cabeça dos peruanos”, afirma.


Desfecho trágico


Apoiadores acompanham velório do ex-presidente Alan García, na sede do partido Aprista Peruano, em Lima — Foto: Guadalupe Pardo/ Reuters
Apoiadores acompanham velório do ex-presidente Alan García, na sede do partido Aprista Peruano, em Lima — Foto: Guadalupe Pardo/ Reuters


Em 2019, García suicidou-se com um tiro na cabeça, logo antes de ser preso. Em uma carta de despedida, ele reafirmou sua inocência no caso. Em 2018, ele chegou a pedir asilo político na embaixada do Uruguai, afirmando que sofria perseguição.


Em seu depoimento nesta semana, Barata afirmou que, dentre os políticos mencionados, aquele com quem tinha uma relação mais próxima era García. O executivo afirmou ainda que a Odebrecht entregou dinheiro para campanhas do ex-presidente em duas oportunidades.


À BBC News Brasil, Ricardo Pinedo, que foi secretário de Garcia, afirmou que “lamentavelmente”, as investigações foram “manipuladas de forma política”. Segundo ele, o processo ficou centrado nas relações do ex-presidente com os executivos. Sobre fotos que mostram García em aviões junto dos comandantes da Odebrecht, ele alega que era algo natural já que o mandatário tinha como hábito acompanhar inaugurações de obras.


Para Pinedo, há uma sensação de que a Odebrecht “fez o que queria” no Peru, e que “na realidade zombou da justiça peruana porque os promotores, tendo um interesse tendencioso em investigar aproveitaram-se para que os depoentes dissessem o que lhes convinha”.


Em resposta à consulta da BBC News Brasil, a Odebrecht reafirmou sua colaboração com as autoridades e destacou que está habilitada a realizar novos contratos no país.


“No Peru, a empresa está habilitada para contratar com o Estado, o que foi recentemente confirmado pela Corte Suprema do país, e atualmente executa alguns projetos de infraestrutura nos setores de transporte e irrigação. No que se refere ao Acordo de Leniência, o objetivo da empresa é que seja integralmente cumprido pelas partes, conforme os seus termos e condições, o que compreende, entre outros pontos, o pagamento da multa até o final do prazo e a operação sem restrições no país”, afirmou.


Desdobramentos na Colômbia


Na Colômbia, a Odebrecht voltou a ser foco das atenções em agosto, depois que o presidente Gustavo Petro afirmou que o caso envolvendo a empresa poderia ser reaberto no país. Em Bogotá, o governo colombiano sediou o Congresso Internacional sobre a Luta contra a Corrupção e a Recuperação de Ativos, ocasião na qual Petro acusou a procuradoria local de permitir que os responsáveis pela corrupção saíssem da Colômbia sem prestar contas à justiça.


O presidente argumentou também que os proprietários da multinacional brasileira não compensaram financeiramente a Colômbia, apesar das sanções impostas pelos tribunais locais, como os US$ 250 milhões anunciados em 2018 pelo Tribunal Administrativo de Cundinamarca como compensação. “Não pagaram um só peso”, exclamou Petro.


À BBC News Brasil, a Odebrecht afirmou: “A companhia tem um processo de colaboração iniciado em 2016 com o Ministério Público colombiano, permanecendo à disposição das autoridades em caso de continuação ou reabertura de qualquer procedimento com o qual a empresa possa contribuir”.


“Na Colômbia, o foco tem sido a conclusão da colaboração com as autoridades e a preservação dos direitos da companhia com relação a uma série de procedimentos que considera indevidos”, acrescentou, em nota.


Segundo o Ministério Público colombiano, houve uma rede de corrupção na qual executivos da Odebrecht teriam criado um empreendimento criminoso para entregar mais de 80 bilhões de pesos (R$ 99 milhões) em propinas na Colômbia. Mais 22 pessoas foram intimadas para serem processadas por suposto envolvimento nos atos de corrupção.


Neste cenário, o promotor Daniel Hernández, foi acusado de deixar escapar vários executivos da Odebrecht e de intimidar testemunhas no caso da empresa brasileira. Ele foi indiciado pelos crimes de prevaricação por omissão e ameaças a testemunhas perante a Suprema Corte de Justiça da Colômbia.


Em audiência no dia 7 de setembro, a defesa de Hernández afirmou que ele atuou como promotor de apoio no caso Odebrecht e não há clareza na norma que determina que tal função deve processar o registro de mandados de prisão na entidade judiciária.


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