O caso do funcionário da Ufac que disse ter sido treinado pelo governo para contatar alienígenas e teve o caso classificado como “confidencial” pelo Serviço Nacional de Inteligência
Em 19 de setembro de 1985, uma carta endereçada ao ministro da Aeronáutica, Octávio Júlio Moreira Lima, narrava o acontecimento mais sinistro envolvendo um suposto contato alienígena no Acre. O caso foi analisado por agentes do Serviço Nacional de Informações (SNI), e permaneceu “confidencial”, no mais absoluto sigilo, até agora.
Na carta, o paulista Edgar José Granzotto, de 31 anos, funcionário da Universidade Federal do Acre, lotado no setor de áudio-visual da instituição, narra que enquanto morava em uma fazenda em Rio Branco, no ano de 1981, foi convidado por um homem que se identificou apenas como “Leonardo” para realizar gravações de conferências que seriam realizadas no dia 7 de novembro com autoridades “de fora”.
Leonardo trabalhava no Hospital de Base de Rio Branco (à época, genericamente chamado de “Pronto Socorro”), além de ser também militar da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, o prestigiado centro de formação durante o período da ditadura militar.
Carta
A Escola Superior de Guerra também era responsável pela infiltração de agentes de segurança em setores considerados militarmente como estratégicos, inclusive na formação de intelectuais pró-regime nas instituições de ensino superior, durante os anos de chumbo no Brasil.
Segundo Edgar Granzotto, durante a tal conferência comandada por agentes do Serviço Nacional de Informação (que hoje atende pelo nome de Agência Brasileira de Inteligência) foi realizado o condicionamento (treinamento), numa operação de caráter sigiloso. O condicionamento capacitou Edgar e militares da Escola Superior de Guerra, sob instrução de agentes do SNI, a contatar Objetos Voadores Não Identificados (Ovnis) e se comunicar com seres extraterrestres, despertando características paranormais mediante sinais telepáticos.
“Não sei como eles descobriram que em mim despertaria tais condições paranormais. Ficamos tomados pelo impacto do fenômeno há até pouco tempo. Passamos por tratamento psiquiátrico e psicoterápico e conseguimos suportar através de medicamentos neurolépticos esses contatos paranormais. Hoje, após três anos de contato com o fenômeno, aprendemos a viver com o desconhecido, já não necessitamos de medicamentos, pois a paranormalidade tornou-se suportável, mas os contatos através de descargas elétricas continuam como respostas às minhas indagações”, diz um trecho da carta de Granzotto ao ministro da Aeronáutica.
No fim, o autor diz que comunicou os mesmos fatos ao Estado Maior das Forças Armadas (EMFA) e à Aeronáutica. Ele também pergunta sobre a possibilidade de compor o corpo de investigação do SIOANI (Sistema de Investigação de Objetos Aéreos Não Identificados), vinculado à Força Aérea Brasileira. Não foi possível verificar se houve uma resposta à carta de Edgar.
Edgar é ouvido por chefe de inteligência do Serviço Nacional de Informações
Dois meses antes de enviar a carta ao ministro da Aeronáutica, em 9 de julho de 1985, o paulista servidor da Ufac foi ouvido pelo chefe de uma das divisões da corporação, numa sala do Serviço Nacional de Informações, em Brasília.
O documento produzido pelo agente Walter Luiz Araripe Oberlander é intitulado “Relatório de Contato”. O texto traz selos de confidencialidade e códigos que nos impedem analisar para qual setor foi encaminhado.
Edgar Granzotto revela ao agente que tem sido seguido por agentes do SNI e que não compreende ter sido “abandonado” pelo governo, já que o treinamento feito para contatar os extraterrestres havia sido bem-sucedido.
relatorio de contato
“Perdeu o emprego e se sente, hoje, marginalizado. Várias vezes, na rua, em estações rodoviárias, tem se sentido observado por elementos do SNI. Julga isso tudo ser um grande segredo militar. Acha que poderia trabalhar no SNI ou junto à Aeronáutica, como elemento de ligação junto aos extraterrenos”, diz o documento secreto.
“Em todo o encontro, Edgar mostrou-se muito tenso, fumando bastante e confuso ao expor suas ideias. O relato acima foi fruto de perguntas, informações, muitas descrições conflitantes, etc. Edgar trajava-se bem, tinha muito boa aparência, demonstrou boa cultura, exprimia-se sem erros. Apenas era confuso em suas ideias. Não foi insistente quando se referiu a trabalhar no órgão, isto é, não houve conotação de que aqui tinha vindo para pedir emprego”, conclui Oberlander.
Onde está Edgar José Granzotto?
A primeira forma de tentar descobrir o paradeiro do antigo servidor da Ufac Edgar Granzotto foi a mais óbvia: pesquisas na internet. Nada foi possível encontrar, além de um processo judicial movido contra a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, com o objetivo de adquirir medicamentos. Depois disso, não há nada. Em redes sociais, pessoas de mesmo sobrenome não responderam às mensagens, mesmo tendo lido o pedido de contato.
Em contato com uma fonte dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), foi possível descobrir que Edgar morreu em 22 de julho de 2022, em São José do Rio Preto, interior paulista. Não há nada no nome dele. “Não tem nada no nome dele. Nem casa, nem carro, nunca teve CNH”, disse a fonte. A certidão de óbito, no entanto, só foi lavrada em 29 de julho, 7 dias após a morte.
*Esta reportagem foi feita baseada em documentos produzidos pelo Serviço Nacional de Informações e divulgados pelo Sistema de Informações do Arquivo Nacional em razão da Lei de Acesso à Informação, sancionada em 2011.