As imagens do então deputado federal Alan Rick no balcão de embarque em Brasília humilhando o atendente da companhia aérea deveriam ir muito além do frenesi das redes sociais. A atitude do parlamentar expõe muito de como a elite brasileira é. Em especial, a elite política brasileira.
Reparando com mais cuidado à cena, chama atenção a calma do atendente. Preste atenção o leitor à forma como o funcionário da companhia aérea reage. Repare também que se trata de uma pessoa de ascendência negra. Para muito além do evidente preparo para lidar com o público, a atitude do funcionário sugere outro problema: aquela arrogância, aquela truculência, aquela opressão do deputado Alan Rick é rotina naquele lugar. E se é uma coisa que o dito parlamentar acreano aprendeu rápido foram os trejeitos das soberbas federais.
Alan: Eu não ouvi, moço. Tá aqui 24. Tá aqui 24. Tá aqui no meu bilhete: 24.
Funcionário: “Isso aqui é uma previsão”.
Alan: “Não, senhor! Você tem que me colocar no voo”.
Funcionário: “Qual voo?”
Alan: “Muda esse voo, moço!”
Funcionário: “Só amanhã agora…”
Alan: “‘Só amanhã’… o caralho! Você tem que me respeitar, rapaz!”
Funcionário: “É o senhor quem está gritando”.
Alan: “Não, senhor! Você vai me botar no meu voo, rapaz!”
Não, querido leitor… não se desaponte! O que você está vendo, exigente leitor, são falas de um típico “homem de bem”: defensor da Família, da Pátria, de Deus, da Liberdade. Não é de se admirar, por exemplo, que ele saque, nos salões das igrejas da moda, um ou outro versículo memorizado, pronto para uma ou outra ocasião. Depende muito do interlocutor, claro: uns podem ser mais abonados, outros mais poderosos. A fé de ocasião tem demonstrado muita eficácia para o nobre parlamentar.
Repare o que o então deputado exige, aos gritos, do atendente: depois da advertência em tom de ameaça, em forma de palavrão, Alan, o Soberbo, exige respeito. Isso mesmo. Depois de gritar um “caralho”, a batida da mão no balcão vem acompanhada de uma ordem. “Você tem que me respeitar, rapaz!”
Claro está ao leitor que o ocorrido no aeroporto de Brasília no início do ano passado longe está de ser um isolado e “lamentável episódio”, classificação dita (pelo agora senador Alan Rick) em nota à imprensa divulgada ontem, 20.
Tenha calma, apressado leitor, a soberba tem lá as suas doses de artimanha. Há algum cálculo. Alan, o Soberbo, na dita nota à imprensa, diz que errou. E, claro, apelou para a pele fina do pecado e da humanidade. “Humano que sou, admito que fiquei nervoso e fui grosseiro. Errei, me desculpei e reitero meu pedido de desculpas pelo erro”. Não é lindo, leitor? É tão humana essa postura! Chega a emocionar.
A Nota à Imprensa é um verdadeiro acinte ao bom senso e à razoabilidade. A nota, à exceção dessas 21 palavras calculadas apelando para a falha da “humanidade” do nobre, é um apanhado de raciocínios que pioram ainda mais a situação. A nota quer fazer crer que a atuação do parlamentar em supostamente trabalhar pela melhoria dos serviços das companhias aéreas encontrou no destempero alimentado pela soberba o seu ponto máximo.
É como se o agora senador quisesse dizer assim: “Olha como os serviços são ruins dessas empresas! Trouxe desequilíbrio até mesmo a um homem de bem, defensor da Ordem e da Família como o Alan Rick! O que não faz com um ‘cidadão comum’?”
A explicação que o parlamentar tenta oferecer é tão ruim que ainda tenta desqualificar as possíveis críticas, mesmo diante do absurdo que ele mesmo protagonizou.
“Infelizmente, na política, há os adversários que jogam limpo e os que jogam sujo. Esse jogo de tentar manchar a imagem dos outros não é o meu”. A alcunha de “Alan, o Soberbo”, tem ou não tem razão de se fortalecer cada vez mais? Soberba! Por que és tão daninha no coração dos bons?