As discussões sobre as escolas cívico-militares precisam ser relativizadas. A aplicação dessa política educacional não é uniforme em um país tão diverso e em um sistema cuja gestão depende, no mínimo, de 28 interpretações (sendo 27 estados e 1 Distrito Federal).
O Acre, talvez, seja exemplo de como esse equívoco na gestão da Educação depende muito da “cor local”. E mais: o número de escolas cívico-militares que existem por aqui deveria desautorizar o debate. Só para que o leitor tenha dimensão, em um universo de aproximadamente 620 escolas estaduais, entre urbanas, rurais e indígenas, apenas 5 são cívico-militares. É menos de 1% do total de escolas mantidas pelo Governo do Acre. Com essa quantidade tão pequena, vale a pena a discussão?
O caso do Acre merece uma reflexão pelo que a região apresentou de preferências ideológicas nas duas últimas eleições presidenciais. Foi uma clara opção pelo Brasil militarizado, com desejos, sem disfarces, de assaltos ao Supremo Tribunal Federal e ao Congresso. O município de Rodrigues Alves foi, proporcionalmente, o que gritou mais alto no país o desejo por um candidato que tinha essa visão. Foram 80,51% dos votos com a marca dos coturnos. Uma votação arrebatadora. Nenhuma cidade superou Rodrigues Alves no Brasil. No Acre todo, 70,30% pensaram do mesmo jeito.
Esse perfil de eleitorado quase obrigou o Governo do Acre a manter as escolas cívico-militares no Estado, mesmo após a decisão do presidente Lula em extinguir com esse modelo da educação militarizada no país. A decisão do Acre assemelha-se à decisão do Governo do Estado de São Paulo.
No Acre, para sustentar a decisão de permanecer com o formato militarizado da Educação nessas unidades, a Secretaria de Estado de Educação argumenta que os custos dessas escolas “direita-volver” são mantidos integralmente pelo governo estadual.
Despesas como fardamento, alimentação e material também são bancados pelo governo local. Fontes ligadas à SEE não coram a face em admitir que o que justifica a permanência desse modelo militarizado por aqui é uma questão de filosofia e doutrinamento. Ora, mas é justamente aí que reside o equívoco. Se optasse pela honestidade intelectual, a SEE saberia admitir que os modelos das escolas “direita-volver” não apresentam nenhum avanço para a Educação.
Há problemas mais urgentes e graves a se resolver no ambiente escolar. A decisão do Governo do Acre é uma mistura de natureza ideológica. Sem contar a evidente distorção, talvez periférica no debate pedagógico, mas que tem muito apelo popular: a ideia de “disciplina”. Confunde-se a disciplina necessária aos estudos acadêmicos com a “disciplina dos quartéis”. São situações distintas. O problema é que a exclusão a que muitas comunidades estão submetidas; o ambiente de violência e criminalidade nos bairros é tamanho que as famílias passam a enxergar nas escolas “direita-volver” a única salvação para o jovem que não teve os limites referenciados no ambiente familiar.
O que garantiu a criação dessas escolas “direita-volver” foi um decreto presidencial. Não foi uma lei, um claro desrespeito ao parlamento, diante de uma matéria tão grave ao país. Vale lembrar que não há, na Lei de Diretrizes e Base (LDB), nenhuma referência a esse modelo de educação militarizada. Foi um decreto presidencial e ministerial impondo um capricho de caserna. O Ministério da Educação repassa recursos para as Forças Armadas para que as escolas sejam mantidas. Especialistas em Educação já fizeram as contas. As escolas “direita-volver” recebem, em média, três vezes mais recursos do que uma escola padrão.
Mas há uma esperança. No geral, o país tem sabido diferenciar as coisas. O Brasil tem 138 mil escolas. Pouco mais de 200 aderiram ao programa. Talvez de forma instintiva, o brasileiro perceba que lugar de militar é salvaguardando fronteiras, defendendo os limites geográficos, ou cuidando da Segurança Pública em áreas urbanas e rurais. Escola é ambiente de educadores, psicopedagogos, pedagogos, alunos e pais de alunos.
O Acre já esteve nos últimos lugares da Educação no país, sentiu o gostinho de ser dianteira depois de muito esforço. Atualmente, a situação voltou a piorar. Em um mundo em que a tecnologia impõe desafios enormes à Pedagogia e aos profissionais da Educação a defesa de valores de caserna representam atraso. E é preciso ser justo e honesto: para um jovem, uma certa dose de rebeldia pode até ser criativa e benéfica. É preciso encontrar maneiras de conduzir isso. E essa é uma missão de todos: governos, educadores, famílias e alunos.
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