O governador Gladson Cameli afirmou ontem, durante o 1º Fórum Indígena do Acre, que irá criar a Secretaria de Estado Extraordinária dos Povos Indígenas. O gesto é um acerto, para além do aspecto simbólico.
A decisão é acertada entendendo a geografia e a cultura de onde se está. Ignorar a complexidade de um lugar que tem 16 etnias, espalhadas por 34 terras indígenas, é decidir excluir a história do povo daqui. Em quatro anos e seis meses de mandato, o governador Gladson ainda não tinha feito um gesto concreto de refletir essa complexidade das identidades regionais no seu organograma administrativo. Agora, ele o fez.
A criação de uma secretaria de Estado sempre é criticada pelos liberais de plantão. Sobretudo pelos liberais das curvas dos rios daqui: alguns empresários que não aguentam a sedução de uma nomeação em Diário Oficial. O liberalismo deles se treme todo ao ouvir a expressão “assessoria especial”.
É preciso reconhecer que há casos que precisam ser observados com mais cuidado. A Secretaria dos Povos Indígenas é uma dessas situações. Já se falou da complexidade que as 16 etnias exigem. Pois bem! Se o organograma do governo não refletia essa diversidade, então já havia um erro na gênese da gestão. Não se trata de criar “mais uma secretaria”. Trata-se de criar uma secretaria que nunca deveria ter deixado de existir, desde a gestão de Jorge Viana quando primeiro se estabeleceu isso no Palácio Rio Branco formalmente.
Outro aspecto que precisa ser dito: a assessoria especial dos povos indígenas (até o momento sob o comando de Francisca Oliveira de Lima, a txái Francisca Arara) não tinha condições de executar praticamente nada.
A tarefa dela se limitava a fazer uma costura entre as diversas áreas da gestão. O esforço é quase absurdo para fazer com que os colegas de governo a enxerguem e enxerguem também a quem ela representa.
Portanto, quanto ao aspecto administrativo, Gladson passa a ter que dotar a secretaria de um orçamento e as decisões tomadas passam a ser fruto de planejamento dos próprios txáis, amparados como política pública.
A partir dessa decisão, Francisca Arara vai passar a ter as dificuldades dos colegas da área de Saúde, Educação, Infraestrutura e tantos outros. Com uma diferença: ela terá que superar o eterno preconceito de mostrar à sociedade acreana que política pública para as comunidades indígenas não é privilégio.
Esse convencimento não é novidade. Em luta há 523 anos, as diversas comunidades indígenas no país entraram na ciranda dos “brancos”: passaram a entrar nas instâncias políticas, intelectuais, laborais. Eles compreenderam que a “guerra cultural” exigia dominar os diversos tipos de armas: comunicação, direito, política.
“Não vamos criar uma secretária por criar, mas sim, para unir forças”, disse Gladson Cameli no anúncio realizado ontem. É bom que seja mesmo. De outra forma, a Casa Civil vai descobrir rápido que o que se pactua com os txáis compartilhando a cuia precisa ser cumprido. Não é bom ter 16 povos originários como inimigos.
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