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Com piso salarial indefinido, enfermeiros do Acre vem enfrentando super endividamento e agiotas

Por
Marcos Venicios

A Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) promoveu na manhã desta quinta-feira (29) uma audiência pública para debater sobre o piso salarial da enfermagem. O encontro é fruto de um requerimento apresentado pelo deputado e presidente da Comissão de Saúde Pública e Assistência Social, Adailton Cruz (PSB). Enfermeiros de todo o país realizam manifestações no dia de hoje, pedindo que a Lei do piso seja executada.


O proponente da audiência, deputado Adailton Cruz, agradeceu a presença dos profissionais de enfermagem e lamentou a ausência de uma representante da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz). Ele pontuou que a expectativa da classe é que a justiça seja feita e o piso salarial seja pago na íntegra e não apenas uma parte. “Nossa expectativa é que seja feito o mínimo de justiça, pois se esse piso fosse pago da forma que foi aprovado, ainda assim faltaria, quanto mais sendo fatiado da forma que estão fazendo. Como enfermeiro e conhecedor da dura realidade que é trabalhar nessa área, se desdobrando entre plantões extras e não podendo dar o alimento digno para a família, eu me solidarizo com os profissionais”, disse. O parlamentar afirmou que a classe da enfermagem precisa que os entes públicos reconheçam seus direitos e expôs sua insatisfação com relação a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), agravada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde).



A vice-presidente do Sindicato dos Profissionais Auxiliares, Técnicos em Enfermagem e Enfermeiros do Estado do Acre (SPATE-AC), Concita, falou do orgulho por, pela primeira vez, os profissionais da enfermagem terem um deputado estadual lhes representando. Ela disse ter idade e tempo de serviço para aposentar, mas não pode, pois possui dívidas decorrentes do baixo salário que recebe. “Tenho muito orgulho em ter um enfermeiro como deputado estadual representando a classe, estamos vendo nossa categoria realmente unida. Quem está na ponta vivenciando a realidade somos nós, minha geração quer se aposentar, mas não pode porque está endividada. Alguns estão passando necessidade pois não conseguem mais tirar extras devido a doenças adquiridas no decorrer do tempo. Não tive a oportunidade de cuidar da minha família e hoje o Brasil paralisa para reivindicar nossos direitos. Sem luta não há vitória e nós não desistiremos”, afirmou.



A presidente do Sindicato dos Enfermeiros do Acre, Iunaira Cavalcante, agradeceu ao deputado Adailton Cruz por abrir um espaço para que os enfermeiros e enfermeiras possam ser ouvidos. Pontuou também que a classe de trabalhadores não vai descansar enquanto não lhes for assegurado o pagamento do piso. “O que temos hoje é a nossa voz, estamos reunidos pois conseguimos uma lei a nosso favor e lamentavelmente ela foi suspensa. Não iremos desanimar, pois somos incansáveis. É um absurdo o que o STF tem feito conosco. Deixo nosso descontentamento também com o Ministério da Saúde, que tem demorado a fazer os repasses para que nosso piso seja efetivado. Nós não vamos parar de lutar incansavelmente e todos os meses temos nos mobilizado com a categoria para assegurar o mínimo que merecemos”, garantiu.


Jucelino Gonçalves, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Acre, lamentou a ausência de alguns secretários de Estado na audiência pública. “Isso nos entristece porque alguns secretários precisam nos ouvir, temos muito a dizer, e eles não enviaram sequer um representante para esta reunião. A gente nunca senta numa mesa de negociação todo mundo junto, sentamos com a Seplag, depois com a Casa Civil e isso dificulta as negociações. Porque não fazem uma reunião com todo mundo junto e bate o martelo de uma vez? Preferem fazer a gente de besta. O governo do Estado precisa aprender a respeitar e valorizar o trabalhador, é isso que está faltando”, disse.


O presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Acre, João Batista, disse que a categoria não aguenta mais trabalhar com sobrecarga e com o baixo salário. “A coisa mais fácil do mundo hoje é pegar um microfone para falar de piso salarial. A gente fala disso há trinta anos, podemos dar aula sobre o assunto se quisermos. Peço a cada profissional de saúde que não baixe a guarda. Chegou o momento de sair decisões desta casa, nós não podemos mais nos conformar com extra, extra é a desgraça da escravidão e isso precisa acabar”, enfatizou.



Elias Macedo, que participou da audiência representando a Secretaria de Governo (Segov), afirmou que o executivo se prontifica em ouvir a classe e, juntos, buscarem uma solução para os profissionais. “Tenho visto a luta de vocês e lhes asseguro que o que estiver ao alcance da Segov, todas as reivindicações serão encaminhadas ao secretário Alysson Bestene. O secretário de Saúde infelizmente não pôde vir, mas o governo está aberto para as conversas. Sei do esforço de cada um, não dá mais para esperar, temos que avançar no Estado e concretizar esse piso que a classe tanto almeja. Me coloco à disposição e faço questão de participar de todas as reuniões “, disse.


Em sua fala, Alesta Amâncio, presidente do Spate, lamentou a morte da técnica em enfermagem que cometeu suicídio dentro do bandeiro do hospital João Câncio Fernandes, em sena Madureira na manhã desta quinta-feira (29). A mesma trabalhava no pavilhão de Internamento e era do grupo de servidores provisórios. Alesta pediu um minuto de silêncio em respeito à servidora. “Ela tirou a própria vida e nós sabemos o porquê. Depois da pandemia muitos profissionais ficaram doentes, depressivos. Ser enfermeiro não é tarefa fácil. Ser enfermeiro é deixar o filho com fome em casa, ser enfermeiro é não saber com quem deixar os filhos para ir trabalhar. A nossa vida não é fácil, estamos adoecendo e não temos ninguém para cuidar da gente. O salário que a gente ganha mal dá para comprar nossa comida quem dirá os nossos remédios”, enfatizou.


Alesta também lamentou a ausência do secretário da Sesacre e da Sefaz no encontro. “Isso demonstra a importância que a enfermagem tem para o Estado. Nenhum deles veio, o secretário de Saúde nunca participou de uma audiência pública com a gente. Mas a luta segue. E aqui eu peço, presidente Lula faça acontecer a lei, o Congresso não pode deixar o Supremo governar. Peço ainda que como encaminhamento dessa reunião que a gente possa agendar um encontro com os nossos três senadores e os deputados federais. Eles precisam parar para nos ouvir”, complementou.



Representando na reunião a Secretaria Municipal de Saúde, a enfermeira e diretora de Assistência à Saúde, Rafaela Brito, disse que apesar das dificuldades houveram avanços significativos nos salários da categoria. Salientou ainda que a secretária municipal de saúde, Sheila Andrade, é bastante sensível às reivindicações dos trabalhadores. “Nós recebemos um pouco mais de R$ 150 mil de repasse do Ministério da Saúde o que é irrelevante diante do impacto da nossa folha da categoria de enfermagem que é de R$ 3 milhões, e com o piso vai para R$ 4 milhões. Nós já temos um caminho a seguir com relação ao piso salarial, só precisamos que o governo federal tome a decisão, que a gente possa ter um piso sólido para que a prefeitura consiga manter isso ao longo do tempo”, disse.


O deputado Edvaldo Magalhães (PCdoB) criticou a Ação que tramita no Supremo Tribunal Federal. “Essa é a casa de vocês e eu parabenizo a iniciativa do requerimento proposto pelo deputado Adailton Cruz. Os discursos aqui foram marcados pela emoção e o movimento de vocês é marcado pela verdade. Amanhã, meia-noite no horário de Brasília, estará encerrada a votação no STF acera do piso nacional. Foi uma dificuldade enorme aprovar a Emenda Constitucional e constitucionalizar o piso. O orçamento foi resolvido e agora essa ADIN, com votos escandalosos dizendo que o piso tem que ser regionalizado. Como vão regionalizar um artigo da Constituição Nacional? ”


Já a deputada Antonia Sales (MDB) afirmou não entender a insensibilidade dos governantes. “A todos que estão na galeria e são anjos da vida, meu respeito. Sempre defendi a categoria da saúde, pois considero a profissão mais importante de todas. Não entendo a insensibilidade dos governantes em não atender aos seus apelos. Vemos profissionais que vivem nos hospitais e recebem uma vergonha de salário. Exigem sacrifício de vocês e não lhes devolvem o mínimo como reconhecimento. Quando eu escuto aqui que a maioria dos profissionais estão nas mãos dos agiotas. Meu Deus, mãos de agiotas! Governador, secretário de saúde, defensoria, Ministério Público, escutem isso. Governador, escute o clamor desse povo. Aqui é a Casa de leis e os deputados precisam ter consciência de que essa situação não pode continuar. Temos que fazer justiça aos enfermeiros e o judiciário precisa fazer cumprir essa lei.”



O deputado Clodoaldo Rodrigues (Republicanos) defendeu que a reinvidicação dos enfermeiros é justa. “Eu não vejo dificuldade nenhuma em fazer as coisas certas na política. Todo gestor precisa priorizar o servidor porque é ele que toca à máquina. As coisas na saúde não são fáceis, tem coisa que é desumana nesse setor. Estive ontem no Pronto Socorro e vi muita coisa ali, não sei como os servidores conseguem dar conta de tudo. Essa categoria é uma das mais importantes do Estado, eles precisam ser valorizados, ouvidos. Estão em busca de melhoria salarial e essa reivindicação é justa demais, necessária. Então governador, escute esses trabalhadores, faça as coisas acontecerem, se sensibilize”.


ENTENDA O CASO

Em maio deste ano, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, sentenciou a implantação imediata do piso da enfermagem, definido em lei e assegurado pela Constituição Federal, no valor de R$ 4.750 para enfermeiras e enfermeiros, R$ 3.325 para técnicas e técnicos e R$ 2.375, para auxiliares e parteiras.


O piso da enfermagem foi sancionado pelo presidente Lula através do Projeto de Lei nº 14.581/2023, que abriu crédito especial de R$7,3 bilhões de reais no orçamento do Fundo Nacional de Saúde para assegurar aos estados e municípios o pagamento dos trabalhadores. Todavia, a Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) recorreu com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7222 no STF, que deve ser julgada até esta sexta-feira, 30.


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