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Pai de bebê prematuro desabafa em rede social e chama atendimento da Urgil de perverso

Nesta quinta-feira, 22, acontece a audiência de instrução da ação civil pública contra a Urgil após, no passado, um abaixo assinado coletar mais de 10 mil assinaturas de pais e mães denunciando o Hospital Infantil Urgil pelo número insuficiente de médicos, falta de remédios e até limpeza adequada, a Defensoria Pública do Acre entrou com uma ação civil pública na justiça.


Hoje, o jornalista Ulisses Lima fez um longo desabafo em uma rede social onde chama o atendimento do hospital de perverso. O pai, com um filho que nasceu prematuro e hoje tem 2 anos e 3 meses, conta indignado o que passou na unidade de saúde ao levar o filho no último dia 1º de junho.


Ulisses relata de falta de higiene, falta de alimentação após às 17h30, equipamentos deteriorados e atendimento desumano.


“Não exigimos de um hospital, feito por muitas pessoas cansadas, a cura para todos os nossos males, mas exigimos ser tratados com dignidade e respeito. Processos judiciais estão sendo feitos e outros virão, mas seria muito mais eficiente se os gestores desses locais que prestam serviços de saúde se conscientizassem do seu papel no mundo”, relata Ulisses.


A reportagem tentou contato por diversas vezes com o hospital, mas as ligações não foram atendidas. O espaço segue aberto, caso haja interesse dos representantes da unidade de saúde se manifestar.



Leia abaixo o relato completo:

“A Urgil é um hospital?


Eu tive uma infância pobre em Rio Branco, capital do Acre. Nessa época, a gente se curava de gripe com chá de alho, lambedor, caldo de caridade e muita prece, mas sempre tinha um vizinho com um pouquinho mais de condição que fazia uma visita no único hospital particular da capital – a Urgil.


Nos anos 90, um prematuro de extremo baixo peso não sobrevivia em Rio Branco. Aliás, a taxa de mortalidade infantil nessa época era de absurdos 27 crianças para cada mil.


De lá para cá, a população de Rio Branco explodiu e novas clínicas médicas se estabeleceram. Profissionais da saúde bem qualificados se formaram aqui e há uma demanda de emergência pediátrica enorme que estrangula os hospitais públicos nas sazonalidades dos vírus respiratórios.


Ocorre que a vida me proporcionou o privilégio, pelo estudo, de uma ascensão social. Hoje posso oferecer para o Benjamin – que nasceu prematuro de extremo baixo peso – acesso a um plano de saúde. E aí voltamos à Urgil, que permanece lá, com sua pintura verde bebê, tal qual nos anos 90 – e, pasmem – é o único hospital no Acre credenciado nos planos de saúde.


Pela primeira vez, precisamos dos serviços do dito hospital infantil e a experiência foi perversa. Ter passado 10 meses morando dentro de um hospital (de verdade), vivendo a rotina de cuidados dos profissionais, marca sua vida para sempre.


A rigidez na higiene das mãos, a manipulação correta de alimentos, o uso correto de luvas, a limpeza constante dos ambientes e a atenção humana dos médicos são atitudes que, além de salvar vidas, fazem com que os pais tenham uma confiança maior no tratamento recebido.


Chegamos na Urgil às 16h da última quinta-feira, dia 1, e após avaliação médica decidiu-se pela internação. De cara, presenciamos um fato chocante. A enfermeira não higienizou as mãos e nem utilizou luvas para fazer o acesso venoso no nosso filho. Em choque, e com o choro dele, ficamos calados e seguimos.


Depois dos trâmites junto ao plano de saúde, subimos para um quarto após as 18h. Por volta das 20h, solicitamos uma janta para o paciente e veio aí a primeira surpresa: eles não fornecem nada para o paciente após as 17h30 – horário da janta. Cada qual por si.


No dia seguinte, relatamos as ocorrências à médica e recebemos apenas uma postura de defesa e indiferença: ‘Vocês podem pedir a transferência dele para outro hospital’, disse ela, que sabe muito mais que nós, que naquela situação eles eram a única alternativa.


A noite, durante a coleta de exames, a coletora utilizou um método que nunca vimos antes, em que girava a agulha já injetada, em busca de acertar a veia, causando grande dor. A mãe disse: ‘moça, calma, isso deve doer muito’, e a resposta foi uma afirmação mentirosa de que ‘não é possível coletar exame sem dor, mãe’.


O relaxo com os cuidados aos indefesos pacientes se torna mais evidente ao observarmos a infraestrutura da Urgil. Camas rasgadas, equipamentos com ferrugem, ar condicionado sujo, fios expostos, mofo em paredes, gambiarras em tomadas, janelas sujas e baratas circulantes foram algumas cenas que tivemos que registrar.


Muitos acreanos têm deixado o estado por diversos motivos: violência, desemprego, falta de cultura e lazer. Benjamin nasceu com apenas 776 gramas e lutou muito para estar aqui hoje, e é provável que tenha que ir diversas vezes ao hospital devido à sua debilidade pulmonar. Por isso, pela primeira vez sentimos uma forte vontade de buscar um lugar melhor em que ele tenha acesso a um atendimento humano e competente.


Não exigimos de um hospital, feito por muitas pessoas cansadas, a cura para todos os nossos males, mas exigimos ser tratados com dignidade e respeito. Processos judiciais estão sendo feitos e outros virão, mas seria muito mais eficiente se os gestores desses locais que prestam serviços de saúde se conscientizassem do seu papel no mundo.


Estamos em 2023, a ciência evolui todos os dias e não é mais possível tratarmos nossas crianças apenas com lambedor e caldo de caridade. Um estado que não cuida de suas crianças abre mão de um futuro! O Acre tem uma história de muita luta até aqui, nossos pais e avós travaram suas batalhas e venceram, e nós não podemos nos omitir das nossas em busca de um lugar digno de se viver.


Ulisses Lima – Jornalista


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