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A pouca água, o birrento e o bico seco

Não. É claro que o “problema da água tratada”, em Rio Branco, não é responsabilidade exclusiva do prefeito Tião Bocalom. Essa é uma pauta velha. Atravessa vários mandatos, de matizes e cores bem diferentes. O agravante da atual gestão é que ela parte de uma premissa equivocada: a de tratar o trabalhador do sistema de saneamento como inimigo. O ac24horas alerta: sem o envolvimento do servidor nos processos decisórios, a possibilidade de erro é grande.


Esses últimos aperreios envolvendo a Estação de Tratamento de Água II (ETA II) demonstram como o trabalhador é comprometido com o Saerb. Mesmo com o frio, com chuva e lama, lá estavam os trabalhadores apertando parafusos e encaixando canos. Um dos primeiros episódios aconteceu às 10 horas, em uma das noites mais frias do ano. E os trabalhadores ficaram até quase 4 horas da madrugada na labuta.


Do jeito que a estrutura do sistema de abastecimento de água em Rio Branco está, esses trabalhadores ficarão sobrecarregados e o problema só aumentará. Ninguém chega a desperdiçar 74,4% da água tratada que produz à toa.


É o cálculo feito pela Organização Não Governamental Trata Brasil, uma referência na fiscalização sobre saneamento básico no país. De cada 100 litros de água tratada no Acre, 74,4 litros são desperdiçados. É preciso insistir em errar para alcançar esse número. É o segundo pior desempenho do país. Só o Amapá é pior que o Acre, com 74,84% de desperdício.


Essa situação ficou simbolizada no protesto bem-humorado de moradores e comerciantes da região central de Rio Branco. Em março deste ano, em reportagem assinada por Leônidas Badaró aqui no ac24horas, os moradores comemoraram o desperdício de água tratada. Um cano estourado molhou a ingerência do Saerb em pleno Centro da Capital por mais de um ano.


É justo lembrar que os dados do estudo “Perdas de água 2023: desafios para disponibilidade hídrica e avanço da eficiência do saneamento básico no Brasil”, elaborado pela Trata Brasil, traz dados relacionados aos estados e não às capitais estritamente. Mas não é nem preciso muita imaginação e nem é preciso andar muito pela cidade para perceber que Rio Branco contamina muito os dados de desperdício do Acre.


Enoque Pereira, o atual diretor-presidente do Saerb, é formado em Matemática. Um homem que deveria ter a lógica como ferramenta. Mas parece que faz concessões às vontades pouco afeitas ao rigor do chefe. Cala-se ao permitir que o Saerb seja inflado com cargos comissionados que serão preenchidos com critérios técnicos duvidosos e divulga dados de saneamento básico impossíveis de se concretizar no tempo anunciado (42% de esgoto tratado até o fim deste ano e 72% até o fim do próximo ano).


Caso o prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom, estivesse realmente preocupado com a sustentabilidade no que se refere ao abastecimento de água da Capital, estaria pleiteando recursos junto a órgãos federais e organismos internacionais para recomposição das matas ciliares da bacia do Rio Acre. Isso, sim, seria um projeto ousado que nenhum prefeito anterior se permitiu.


Seria um projeto que envolveria todos os 10 municípios banhados pela Bacia do Rio Acre, Amac, Governo do Estado, Banco da Amazônia, Banco do Brasil, BNDES, Governo Federal, sem contar com organismos internacionais de fomento como Bird ou BID.


Mas é necessário reconhecer: para que o olhar do gestor abarque a grandeza de um projeto estratégico desses é preciso ter envergadura. É preciso ter senso republicano e olhar para a cidade como um espaço plural e multicolorido. Quem faz birra por pouca cor não deixa nem o povo molhar o bico, por mais água que se desperdice.


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