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Acre atual não merece nem os Autonomistas

Ontem, 15, foi o mais do mesmo por aqui. A bandeira do Acre tremulou por todo canto, sustentando um feriado pleno de friagem. Ela, a bandeira, estava nos materiais institucionais do Governo, nas redes sociais dos políticos ou de pessoas comuns que se arvoram algum tipo de militância.


A imagem guarda relação com a ideia de emancipação política. Aquilo que a imprensa local chama de “elevação do Acre à categoria de Estado”. Ou, de uma maneira mais abreviada, “elevação do Acre Estado”: um fato cuja síntese aconteceu há 61 anos por uma formalização do presidente João Goulart, após intensa articulação do senador Guiomard Santos (PSD).


O presidente Jango estava acuado em um apertado parlamentarismo tupiniquim e com uma fragilíssima governança no Congresso. Quanto mais aliados conseguisse, tanto melhor.


Aumentar os gastos públicos com uma gente tão distante, criar um estado a mais onde ele nunca viria de fato a saber nem para que rumo ficava, isso para o presidente João Goulart era um detalhe. O que ele precisava era de apoio. O que teoricamente se manteve porque algo em torno de 70% do Congresso dizia apoiá-lo… até chegar o fatídico 31 de março de 1964.


O documento que Jango assinou em 15 de junho de 1962 fez com que o Acre deixasse de ser Território Federal e passasse a ser um Estado da federação. Até hoje, apesar dos esforços de muitos acadêmicos, a Universidade Federal do Acre ainda não conseguiu dar conta da complexidade dos elementos causais do Movimento dos Autonomistas cuja luta se encerrou há 61 anos, comemorado ontem.


Há muito de fantasia, de romantismo, de retóricas oficiais, referendadas pela historiografia. Mas são versões da História que, normalmente, evitam os embates, os conflitos. Buscam personificar a história, enaltecendo grandes gestos imaginados e ocultando um enredo de morte, exclusão, estupros, conflitos de classe, escravidão. A História do Acre não tem espaço para glamour.


É preciso dar ao Movimento dos Autonomistas o espaço que ele, de fato, tem. Foi um movimento de elite política local que se incomodava com a falta de controle das decisões políticas e administrativas que lhe escapavam das mãos. Dito de uma maneira mais simples e direta: não havia base popular na agenda autonomista.


Ali não estavam os povos originários, não estavam os ribeirinhos, não estavam os seringueiros e seringueiras. E mesmo entre as elites ainda assim havia discordância, já que uma parte dos empresários entendia que haveria aumento de carga tributária, burocracia estatal e tantos problemas já conhecidos há 61 anos.


É verdade que, em boa medida, o “espírito” autonomista é desperdiçado por muitos gestores. Desde a assinatura de Jango até a troca da bandeira ocorrida ontem, aquela vontade de governar, aquele ímpeto de decidir os rumos das coisas por aqui, aquele discurso de gerenciar com rigor os cofres públicos, muito daquele espírito se perdeu.


Talvez, essa postura irresponsável e descompromissada com o povo da geração atual de políticos seja resultado de uma falha na gênese do Movimento Autonomista. Obedeceu a uma lógica de interesses da elite sem ouvir quem deveria. Com isso, forjou uma geração de meninos que não têm como valorizar o que o povo pensa porque não sabe nem por onde começar o trabalho. É como aquele filho que herda uma fortuna dos pais mortos e tudo se esvai em pouco tempo.


Sejamos francos: o povo do Acre não lutou para ser brasileiro; o povo do Acre não lutou e nem reivindicou por sua autonomia. Os acordos e consensos são definidos “por cima”. O resultado que se tem é um só: uma História romantizada produz um povo que acredita em versões oficiais e oferece o lombo à chibata com mais facilidade. Precisamos de uma história mais acre.


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