A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (14) projeto de lei que tipifica o crime de negar a abertura ou manutenção de conta e concessão de crédito a pessoas politicamente expostas. O Projeto de Lei 2720/23, da deputada Dani Cunha (União-RJ), será enviado ao Senado.
A proposta foi aprovada na forma de substitutivo do relator, deputado Claudio Cajado (PP-BA).
Houve divisão na bancada do Acre: dos votantes, os deputados Roberto Duarte, Coronel Ulysses, Socorro Neri e Gerlen Diniz foram contra essa medida. Já Antônia Lúcia, Eduardo Velloso, e Meire Serafim votaram favoráveis. Zezinho Barbary não votou.
De acordo com o texto, a pena será de reclusão de 2 a 4 anos e multa para quem negar a abertura de conta ou sua manutenção, ou mesmo a concessão de crédito, ou outro serviço. Essa negativa abrange até mesmo pessoa jurídica controlada por pessoa politicamente exposta.
Além das pessoas politicamente expostas, em geral, políticos eleitos e detentores de altos cargos nos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal), o projeto abrange as pessoas que estejam respondendo à investigação preliminar, termo circunstanciado, inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa, ou pessoas que figuram como rés em processo judicial em curso (sem trânsito em julgado).
Para o deputado Claudio Cajado, o projeto permite às pessoas politicamente expostas “terem acesso ao fundamento usado para a recusa do exercício de direitos que qualquer cidadão tem”. “Se a pessoa é devedora, tem cadastro negativo, há uma justificativa cabível, lógica e coerente. Porém, o fato de ela ser parente de um político não é justificativa e, na vida real, isso está acontecendo”, afirmou.
Já a autora, deputada Dani Cunha, ressaltou que a proposta tem o objetivo de encerrar discriminação. “Se você tem hoje um pedido para abrir uma conta em uma instituição financeira negado, é preciso haver um motivo”, disse.
No caso das pessoas politicamente expostas, as normas do projeto alcançam ainda as pessoas jurídicas das quais elas participam, os familiares e os estreitos colaboradores.
São considerados familiares os parentes, na linha direta, até o segundo grau, o cônjuge, o companheiro, a companheira, o enteado e a enteada.
Já os estreitos colaboradores são classificados como:
pessoas naturais conhecidas por terem sociedade ou propriedade conjunta em pessoas jurídicas de direito privado, ou em arranjos sem personalidade jurídica com os politicamente expostos;
pessoas naturais que figurem como mandatárias, ainda que por instrumento particular, de pessoas politicamente expostas;
pessoas naturais que possuam qualquer outro tipo de estreita relação de conhecimento público com uma pessoa exposta politicamente;
pessoas naturais que têm o controle de pessoas jurídicas de direito privado ou em arranjos sem personalidade jurídica, conhecidos por terem sido criados para o benefício de uma pessoa exposta politicamente.
O substitutivo lista grupos de autoridades consideradas como pessoas politicamente expostas:
detentores de mandatos eletivos dos poderes Executivo e Legislativo da União;
ministro de Estado ou equiparado;
ocupante de Cargo de Natureza Especial ou equivalente no Poder Executivo da União;
presidente, vice-presidente e diretor, ou equivalentes, de entidades da administração pública indireta no Poder Executivo da União;
ocupante de cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS) de nível 6 ou equivalente no Poder Executivo da União;
membros do Supremo Tribunal Federal, do Conselho Nacional de Justiça, dos tribunais superiores, dos tribunais regionais federais, dos tribunais regionais do Trabalho, dos tribunais regionais eleitorais, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e do Conselho da Justiça Federal;
membros do Conselho Nacional do Ministério Público, procurador-geral da República, vice-procurador-geral da República, procurador-geral do Trabalho, procurador-geral da Justiça Militar, subprocuradores-gerais da República e procuradores-gerais de Justiça dos estados e do Distrito Federal;
membros do Tribunal de Contas da União, procurador-geral e subprocuradores-gerais do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União;
presidentes e tesoureiros nacionais, ou equivalentes, de partidos políticos;
governadores, vice-governadores, secretários de estado e do Distrito Federal, deputados estaduais e distritais, presidentes, ou equivalentes, de entidades da administração pública indireta estadual e distrital e presidentes de tribunais militares, de Justiça, de Contas ou equivalentes de estado e do Distrito Federal;
prefeitos, vice-prefeitos, vereadores, secretários municipais, presidentes ou equivalentes de entidades da administração pública indireta municipal e presidentes de tribunais de contas de municípios ou equivalentes.
Para a identificação das pessoas expostas politicamente, deverá ser consultado o Cadastro Nacional de Pessoas Expostas Politicamente (CNPEP), disponível no Portal da Transparência, ou outras bases de dados oficiais publicizadas pelo poder público.
O texto de Claudio Cajado também considera politicamente expostas e abrangidas pelo projeto aquelas pessoas que sejam, no exterior:
chefes de Estado ou de governo;
políticos de escalões superiores;
ocupantes de cargos governamentais de escalões superiores;
oficiais generais;
membros de escalões superiores do Poder Judiciário;
executivos de escalões superiores de empresas públicas; e
dirigentes de partidos políticos.
De igual forma, o texto considera pessoas expostas politicamente os dirigentes de escalões superiores de entidades de direito internacional público ou privado, como órgãos das Nações Unidas, por exemplo.
Quanto à identificação das pessoas politicamente expostas no exterior ou dessas entidades, devem ser consultadas fontes abertas e bases de dados públicas e privadas.
Em todos os casos, a condição de pessoa exposta politicamente perdurará por cinco anos, contados da data em que a pessoa deixou de figurar nas posições listadas.
O PL 2720/23 muda a lei sobre o processo administrativo sancionador das instituições financeiras (Lei 13.506/17) para exigir a apresentação de documento escrito ao solicitante abrangido pelo projeto para quem tenha sido negada a abertura ou manutenção de conta, ou a concessão de empréstimo.
O documento deve conter motivação idônea para a negativa. Quanto ao crédito, o documento deve conter motivação técnica idônea e objetiva para a recusa, não podendo alegar recusa somente pela condição de pessoa politicamente exposta do pleiteante ou ainda pelo fato de a pessoa figurar como ré de processo judicial em curso ou ter decisão de condenação sem trânsito em julgado proferida em seu desfavor.
Se o representante legal da instituição financeira se recusar a apresentar ao solicitante esses documentos, responderá por eventuais danos morais e patrimoniais causados, sem prejuízo de responsabilização penal.
Esses documentos deverão ser entregues em cinco dias úteis, sob pena de multa diária de R$ 10 mil.
O texto explicita que não é considerada motivação técnica idônea a negativa ocorrida somente em razão da condição de a pessoa ser politicamente exposta ou por ter contra ela decisão de condenação sem trânsito em julgado.
As regras valem ainda para as empresas administradoras de quaisquer meios de pagamento, notadamente as administradoras de cartão de crédito.
Para a deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS), os atuais obstáculos a transações financeiras são justificados. “A pessoa politicamente exposta é monitorada pelos órgãos de controle para evitar o enriquecimento ilícito e a lavagem de dinheiro”, ressaltou.
Para ela, a proposta cria privilégios. “Além disso, vai dificultar o controle sobre essas pessoas ao criar pena de prisão para quem se recusar a abrir contas e conceder crédito”, disse Melchionna.
Para o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS), a aprovação do projeto vai ter como consequência o aumento da taxa de juros. “A qualquer estelionatário, réu condenado em segunda instância, a qualquer pessoa criminosa está sendo garantida a abertura de conta no banco e inclusive a concessão de crédito”, alertou.
O deputado Abilio Brunini (PL-MT) também falou contra a proposta. “A discriminação contra as pessoas já é crime, agora fazer uma lei especial para os políticos não dá”, declarou.
Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), a Câmara está legislando em causa própria. “Esta proposta cria uma redoma injustificável ao redor das pessoas politicamente expostas”, afirmou.
As críticas foram rebatidas pelo líder do União Brasil, deputado Elmar Nascimento (BA). Ele afirmou que não se trata de criar privilégios, mas de garantir que as pessoas que pretendem entrar na vida pública não sejam intimidadas por regras financeiras.
“É inadmissível uma filha de um sócio nosso, um sobrinho nosso, sem qualquer tipo de problema, ter a sua conta sustada simplesmente por que é filho, sobrinho, ou parente de um político”, disse. Essas regras, segundo ele, afastam as pessoas da vida pública.
Fonte: Agência Câmara de Notícias
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