Categories: Editorial Notícias

Tem muita terra para pouca ideia

Por
Editorial ac24horas

As polêmicas geradas com o reinício do julgamento no STF da tese do “marco temporal para demarcação das terras indígenas” expõem muitos problemas do nosso tempo: esgarçam a era dos extremos com a qual nos habituamos a conviver desde junho de 2013 e também reformulam, em bases ainda mais radicalizadas, o debate sobre desenvolvimento.


Falar de “marco temporal” é falar sobre garimpos, extração ilegal de madeiras, desmatamento, preservação de mananciais e rios, produção de água em grandes centros. Falar de “marco temporal” é falar do genocídio que se pratica por aqui há 523 anos; é falar da preservação de identidades culturais; é falar de “cultura brasileira”; é falar de “novas” relações de consumo, necessárias em um mundo que já não sabe o que fazer com o lixo que produz. Tudo isso faz parte das discussões sobre “marco temporal”.


Há detalhes mais técnicos, sem dúvida. Como, por exemplo, o início desse debate, ocorrido ainda em 2009, quando do julgamento do caso Raposa Serra do Sol (RR), que reconheceu a demarcação das terras indígenas e impôs as salvaguardas institucionais. Uma das salvaguardas institucionais foi justamente o “marco temporal”.


Baseado nesse julgamento, foi construída uma espécie de arcabouço jurídico que anulou demarcações de várias terras indígenas. Muitas comunidades foram simplesmente despejadas. O MPF recorreu querendo um novo entendimento da corte suprema para saber se as “salvaguardas” serviriam como referência para todos os casos ou seria só para o caso da Raposa Serra do Sol. O STF entendeu que só valeria para o caso específico de Roraima.


Mas a Advocacia Geral da União, ainda na gestão do ex-presidente Michel Temer, publicou um parecer que obrigava o Estado brasileiro a aplicar os mesmos critérios que foram seguidos no processo roraimense. Na prática, institucionalizou o “marco temporal”.


Tudo isso, descambou em um recurso extraordinário com repercussão geral na nossa suprema corte: o famoso caso de Santa Catarina. O Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina contra a Funai e os povos Xokleng, envolvendo área reivindicada da Terra Indígena Ibirama-Laklanõ.


A discussão no plano jurídico não empolga. E, para agravar, quando isso chega nos bares, botecos e padarias, tem a seguinte cor: “Tem pouco índio para muita terra mesmo! É preciso diminuir essas terras desses cabras preguiçosos!”


Como alertamos no início deste editorial, vivemos uma era de extremos. É preciso, democraticamente, convencer com outros referenciais. As comunidades indígenas estão em guerra há 523 anos. Descobriram, na prática, que os governos, sejam de direita ou de esquerda, têm dificuldade de entender a rotina de exclusão e morte que impuseram aos povos originários. A questão em debate não deveria ser a respeito de “muita terra para pouco índio” ou sobre “segurança jurídica”. O problema é, de fato, é a pequenez das ideias.


Share
Por
Editorial ac24horas

Últimas Notícias

  • Destaque 1

Gladson Cameli anuncia convocação de 11 defensores para o início de 2025

O governador Gladson Cameli (PP) anunciou na tarde desta quinta-feira, 21, que em janeiro de…

21/11/2024
  • Bar do Vaz
  • Destaque 2

“Flaviano Melo era o grande professor do MDB”, declara João Correia

A edição do programa Bar do Vaz entrevistou nesta quinta-feira, 20, o ex-deputado federal João…

21/11/2024
  • Acre

Acre é o penúltimo no ranking de homens mais bonitos do país

Uma pesquisa realizada pelo site Acervo Awards revelou nesta quinta-feira, 29, o ranking dos estados…

21/11/2024
  • Acre

Barco naufraga no Crôa e homem perde mais de 40 sacos de cimento

Uma embarcação lotada de material de construção naufragou na tarde dessa quarta-feira,20, no Rio Crôa…

21/11/2024
  • Cotidiano

Divulgado resultado final e homologação de concurso do TCE/AC

O Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe)…

21/11/2024
  • Cotidiano

Federação de Cooperativas Unicafes/AC é criada oficialmente no Acre

Em solenidade ocorrida nesta quinta-feira, 21, na sede do Sistema OCB, foi criada oficialmente a…

21/11/2024