Apesar de ainda abrigar dezenas de empreendimentos tradicionais, o mais antigo e popular centro comercial de Rio Branco vem apresentando sinais de declínio desde que fora tomado pelo descuido do poder público e a massante prática de crimes de menor potencial ofensivo – crimes leves- geralmente cometidos por vândalos e pessoas em situação de rua.
Prédios abandonados, praças servindo de dormitório, muros pichados e deteriorados, áreas totalmente às escuras no período noturno, tudo isso na parte mais central e turística da cidade. Trabalhadores, estudantes e os próprios turistas que percorrem o local nem sempre conseguem desviar a criminalidade que cerca e ameaça a região, vista como referência empresarial na capital acreana.
Os últimos meses trazem incontáveis casos e vítimas de furtos e outros crimes, afetando desde microempresas, órgãos públicos, até holdings nacionais. Não é difícil notar os reparos constantes em paredes depredadas, fios de postes de energia e iluminação pública saqueados e, inclusive, o consumo e tráfico de entorpecentes a qualquer hora do dia.
O delito mais recente é a invasão à unidade da Lojas Americanas na rua Rui Barbosa, ocorrida na noite do dia 25 de abril. O estabelecimento já havia substituído a fachada de vidro blindex por tijolos antes de voltar a ser alvo de criminosos, ter a parede quebrada e vários objetos furtados. O mesmo estabelecimento foi invadido cinco vezes na mesma semana.
O empresário Marcello Moura, atual presidente da Associação Comercial, Industrial, de Serviço e Agrícola do Acre (Acisa), confirmou que a entidade já recebeu inúmeras reclamações devido a problemática, que envolve a mazela de grande quantidade de moradores de rua e dependentes químicos espalhados pelo Centro.
“Já encaminhamos ofícios, tanto para poder público municipal quanto estadual, para que se crie políticas públicas bem abrangentes para tratar de pessoas que não tem mais o domínio das decisões. Juridicamente, precisa ter um embasamento legal para tratar essas pessoas, e também criar um local adequado para tratá-las, criar uma oportunidade profissional a elas. Já falamos com vários setores, mas infelizmente ainda não temos nenhum tipo de ação concreta”, explica Moura.
De acordo com o empresário, já existem alguns lugares nessa região central que são considerados “inabitáveis” para o negócio, tamanho abandono e risco. “Ali perto da antiga Polícia Federal, próximo à região do Papoco, é uma área complicada e ela está se alastrando. É uma mazela social, acontece em São Paulo, por exemplo, e está acontecendo também aqui na capital acreana”, salienta.
Além da Americanas, a loja Gazin, também no Centro, sofreu mais de 10 furtos em poucas semanas. O município de Rio Branco já amarga o prejuízo de aproximadamente R$ 5 milhões com mais de 50 reparos nos últimos meses após inúmeros furtos de fios nos arredores da maior parte comercial da capital.
Ainda assim, o corretor de imóveis e sócio da imobiliária Hoouse Imóveis Únicos, Tiago Mendonça, garante que o Centro de Rio Branco continua valorizado do ponto de vista imobiliário. “Tem uma força muito grande para o comércio, principalmente por concentrar muitos órgãos públicos”. Para ele, o comércio sobrevive ainda de uma forma muito agressiva nessa região.
“Os aluguéis continuam sendo altos. A pandemia mudou algumas situações em relação aos preços. Algumas negociações tiveram de ser feitas para não haver distrato”, explica Mendonça, destacando que atualmente a oferta de produto imobiliário no centro da cidade é bem menor que a demanda, fazendo com que o preço seja mais elevado.
O empresário assegura que o cliente do ramo do comércio procura vaga de garagem, pois estacionamento é primordial ao cliente, e frente, já que quanto mais fachada tiver no imóvel comercial, melhor. Tiago não acredita que a região central esteja perdendo clientes para galerias nos bairros, por exemplo.
“Acho que as galerias têm uma fatia do mercado, mas não vejo esse êxodo do centro para as galerias. Vejo muita gente abrindo novos negócios nas galerias, mas o centro da cidade continua. Observo que no centro há muita loja de R$ 1.99, de R$ 10, um ticket médio mais em conta”. Segundo o especialista em imóveis, o Centro de Rio Branco busca atender o público que passa andando, o pedestre, tornando-se um mercado mais popular, deixando o mercado de alto padrão nos bairros, nas galerias.
“Nova Cracolândia”
Ocorre que os próprios comerciantes do Centro de Rio Branco afirmam estar desistindo de seus pontos comerciais em razão do abandono do poder público e da sensação de insegurança no local. Segundo eles, além de furtos e roubos, as ameaças a vendedores e transeuntes acontecem em qualquer período do dia, com marginais transitando livremente portando facas e terçados.
Um segurança que preferiu não se identificar, disse ao ac24horas no último dia 26 de abril que trabalhar no centro de Rio Branco é perigoso. “Já perdi as contas de quantas vezes puxaram faca pra mim. Na Americanas, eles entram com terçado ou faca, pegam o que querem e saem com o terçado numa mão e o produto na outra. Ninguém pode fazer nada, porque se denunciar, ele pode voltar e se vingar”.
Alguns comerciantes da região já passaram a se referir ao local de trabalho como “Nova Cracolândia”. Para flagrar e tentar inibir os crimes, câmeras foram instaladas, mas poucos dias após a instalação dos equipamentos na Praça do Relógio, ladrões levaram os fios e também as câmeras.
O que diz o Estado
Na primeira gestão do governador Gladson Cameli, foi levantada a possibilidade da construção de um Centro Administrativo do Estado do Acre, que, à época, deveria ser construído no bairro Irineu Serra, em Rio Branco, reunindo as principais repartições públicas, ou seja, tirando-as da região central da cidade. Até o momento, o planejamento não saiu do papel e, conforme relatado pelo governo, não existe no momento um plano de execução quanto à implantação desse Centro.
Já a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública do Acre informou que tem trabalhado na busca de identificar os agentes que cometem crimes contra órgãos públicos e lojas comerciais no centro de Rio Branco. Diz ainda que o 1º Batalhão da Polícia Militar, responsável pela região, realiza diuturnamente o policiamento nas áreas do Centro e Bosque.
“Seja por meio do serviço de policiamento comunitário, bem como serviço ordinário, com as viaturas de Radiopatrulhamento e também com Rádio Patrulhamento com Motocicletas (RPM). Além de uma viatura exclusiva para região do Papoco. O trabalho tem sido feito de forma contínua (24h por dia)”, garante a Segurança.
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