Passadas algumas semanas após a deflagração da terceira fase da Operação Ptolomeu, em uma ação conjunta da Polícia Federal, Controladoria-Geral da União e Ministério Público Federal, o assunto parece que foi sucumbido diante da cheia repentina dos rios e igarapés no Acre que atingiu mais de 30 mil pessoas. As manchetes dos jornais mudaram. O Palácio Rio Branco não é mais o holofote da mídia nacional, mas sim o sofrimento do povo. Independente disso, no último final de semana o ac24horas foi ao coração de Rio Branco saber das pessoas que topassem falar com a reportagem sobre o que elas achavam da ação policial e se de fato o governador Gladson Cameli teria algum tipo de participação na suposta organização criminosa acusada de desviar dinheiro público.
Com uma câmera na mão e um gravador ligado, as pessoas desconfiadas tentavam fugir dos questionamentos e tentavam a todo custo evitar opinar sobre o caso. Mas o que topava se expor tinha dúvidas, desconfianças, certezas e até defesas em relação ao chefe do Palácio Rio Branco.
Após muita insistência, o primeiro a opinar foi o mototaxista Ademir Amorim, de 44 anos, que trabalha na área há 4 anos. Antes de mais nada, ao avaliar a gestão Cameli, ele fez questão de lembrar que o governo passou por muita dificuldade devido a pandemia de covid-19. “Ele pode não ter feito grande coisa, mas sempre esteve do lado da população, das pessoas mais humildes. Sempre está de olho nas escolas, ajuda os alunos. Deu sacolão para algumas famílias. Ele não fez muito, mas esteve de olho e ajudou muito a população carente. Fez uma administração razoável. Agora como está no início do novo governo, nem podemos cobrar muito porque ainda está no começo. Ainda pode melhorar”, pontuou.
Já sobre a Ptolomeu, Ademir afirmou que viu no jornal, mas que prefere esperar pela Justiça. “Eu vi no jornal. É uma coisa que a gente precisa esperar pela justiça, não julgo agora o governador. Tem que esperar pela justiça, eles é quem vão dizer se realmente aconteceu ou não. Teve outras gestões que passaram, não só do governo, mas da prefeitura e não deu em nada, não aconteceu nada”, lembrou.
Outro que também opinou sobre a situação foi o autônomo Cledson Borges, de 43 anos, mais conhecido no centro de Rio Branco com o apelido de “Louro”. Antes de falar da operação policial, o comerciante afirmou que Cameli é um ótimo gestor, mas aproveitou para reforçar que o Acre precisa se desenvolver. “Eu sou do Goiás, estou aqui no Acre há 26 anos e comparando o Sul com a nossa região, está muito ruim, muito inferior. Precisamos de uma gestão melhor, de um desenvolvimento melhor, de um governo que tenha visão de futuro, com um planejamento mais ousado. Rio Branco precisa crescer. Em Porto Velho, você vê que está muito melhor. A infraestrutura, até mesmo a economia de Rondônia, nem se compara com a do Acre. Aqui é tudo muito carente, sem perspectivas de nada. Se você for na periferia, você vai ver toda a carência que existe lá, o acesso que tem. Os ribeirinhos que tem a maior dificuldade para trazer os seus produtos. Você entra nesses ramais e vê a dificuldade do pessoal. O pouco que produz tem a maior dificuldade para trazer, porque não tem ramais bons, não tem assistências. Então assim, precisa melhorar muito. A minha opinião como comerciante é que ele olhe com atenção para o nosso Estado”.
Sobre a operação, Louro prefere que a Polícia Federal faça o trabalho dela e que se o governador tiver alguma culpa, que venha à tona. “Se for provado ao longo das investigações. É uma coisa que todo gestor pode correr o risco de ser investigado, porque ele está prestando um serviço para a população. Espero que ele não seja culpado, mas é necessário isso, porque o gestor público trabalha para a população, então ele precisa gerir bem o dinheiro e o pouco de recursos que vem”, frisou Cledson reforçando que não põe a mão no fogo por ninguém. “Nem por mim mesmo”, brincou.
O cabeleireiro Márcio de Souza, 46 anos, que trabalha no Mercado Aziz Abucater há pelo menos 12 anos, só foi elogios ao governador. “O Gladson Cameli é uma benção, é gente boa. Deu aumento para todo mundo, mas aqui para a gente nada”, disse. Sobre a operação, o profissional da tesoura acredita que o chefe do executivo não tem culpa. “O nosso Gladson Cameli é inocente, ele não fez isso não. Ele já é rico de nascença, não precisa disso não”, pontuou.
Por outro lado, tem gente que não é tão animada com a gestão de Gladson. É o caso da Maria das Dores, 47 anos, cabeleireira há 25 anos. “Eu vim ver o Gladson trabalhando só agora. Como agora alagou, ele meteu o pé na água e foi ajudar a população. E é isso que estamos precisando agora, que eles ajudem a população nesse momento difícil que estamos passando”, disse. Já sobre a operação policial, ela afirmou que não acredita na inocência do gestor do Estado. “Não acredito que ele seja inocente, porque se há fumaça, há fogo. As acusações são muito graves para ele. Eu quero que ele mostre a verdade para a população que votou nele e se ele não for culpado, que prove o que as pessoas que estão falando”, pontuou.
Geosimar Ferreira, 56 anos, mora no bairro Defesa Civil, trabalha há 4 anos como vendedor no calçadão. Ele afirmou que Gladson prometeu também muita coisa, muitas obras e serviços, trabalhos e até agora ninguém viu nada. De acordo com o vendedor, “nesse tempo todo ele nunca fez algo grandioso e importante para o nosso Estado. Eu quero que alguém veja isso e venha aqui me mostrar o que foi que o Gladson fez, eu quero ver, porque não tem nada. É só promessas e mais promessas”, disse.
Questionado sobre a Operação Ptolomeu, Ferreira foi categorico. “Ele tem culpa sim, porque uma cobra não corre sem cabeça. Ele fez sim, ele deve também. Ele está negando isso, mas eu tenho absoluta certeza que ele deve. Mas eu não espero nada, porque não sou besta. Sei que nunca vai acontecer nada com os grandes, agora se fosse eu que tivesse roubado ou feito alguma coisa, estava preso hoje”, desabafou.
O comerciante Jessé Carneiro, 29 anos, que trabalha no calçadão desde 2018, cita que o grande gargalo da gestão Cameli são as estradas ruins e sobre a ação da polícia federal, afirmou que foi um episódio feio para o governo. “Se a Polícia Federal se posicionar em relação a isso. Se eles estão apontando eu creio que o governador tem envolvimento sim. O que me chamou mais atenção foi o pessoal do governo preso. A operação que teve no Deracre. Ficou feio para o governo”, disse.
O vendedor ambulante Julio Cesar, 39 anos, morador do bairro 6 de Agosto, afirmou que a Gestão Cameli é péssima. “Antigamente os funcionários públicos trabalhavam o dia todo e agora é só meio período. Isso não é certo, porque a população precisa das secretarias e órgãos públicos abertos 24h. Pelo menos 8h ao dia, que é o normal de trabalho de cada um. Mas não está acontecendo isso, quando dá 13h, já está tudo fechado. Quando precisamos resolver alguma coisa na parte da tarde, não conseguimos. Para mim não está resolvendo nada, é só aumento no salário e diminuição do trabalho deles. O que o Gladson fez mesmo foi deixar os funcionários públicos bem à vontade. Eles quase não trabalham e recebem um salário absurdo que sai do bolso do povo”, desabafou.
Perguntado sobre a operação policial, Júlio disse que não põe a mão no fogo por Gladson. “Eu não vou botar minha mão no fogo pelo Gladson não, mas se estão investigando é porque existem motivos. Há alguma coisa que ele deve estar envolvido nessas coisas. Como pode o cara ser governador, está a frente de uma população e está envolvido em algo tão errado. É feio para o nosso Estado”, criticou.
Entre os que defendem e criticam, tem os que também não estão a par do que está acontecendo no Acre. É o caso da vendedora Terezinha Costa, 48 anos,que mora no loteamento Farhat, que cobrou que Gladson esteja mais presente junto a população, mas sobre a operação Ptolomeu afirmou não acompanhar os fatos. “Então, não tenho como acreditar ou desacreditar. Não conheço sobre isso, não tenho como opinar”, disse.
OPERAÇÃO
A 3ª fase da operação Ptolomeu, iniciada em 2021 e que investiga, entre outros, o governador do Acre, Gladson Cameli, foi deflagrada no último dia 9 de março, a partir de investigações da Polícia Federal, da Procuradoria-Geral da República, da Receita Federal e da Controladoria-Geral da União.Foram cumpridos 89 mandados de busca e apreensão nos Estados do Acre, Piauí, Paraná, Amazonas, Goiás e Rondônia, além do Distrito Federal.
Segundo a CGU, os alvos da operação praticavam fraudes em contratações públicas no Acre com recursos da saúde, da educação e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), relacionadas à execução de obras de infraestrutura e serviços de manutenção predial.
De acordo com a PF, R$ 120 milhões em bens foram bloqueados. Aeronaves, casas e apartamentos de luxo foram apreendidos. Cameli teve cerca de R$ 10 milhões em bens bloqueados e também teve o seu passaporte suspenso, ou seja, ele está proibido de fazer viagens internacionais. Toda a operação correu com autorização da Ministra Nancy Andrighi , do Superior Tribunal de Justiça.
Na semana passada, a ministra relatora da operação deu prazo de 90 dias para que a Polícia Federal conclui-se o inquérito.