A disputa nos bastidores da transição entre as ex-ministras do Meio Ambiente Marina Silva (Rede-SP) e Izabella Teixeira criou um dilema para Luiz Inácio Lula da Silva: a depender do modelo escolhido para a Autoridade Climática, que ele prometeu criar na campanha, uma delas pode acabar fora do governo em 2023.
Até o momento, a tendência de Lula é dar o ministério para uma e a autoridade para outra. Mas, segundo fontes dos grupos de meio ambiente na transição, Marina tem insistido para que a autoridade fique vinculada ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), enquanto para Izabella o ideal é que essa estrutura seja diretamente ligada à Presidência da República. E ainda: interlocutores de Izabella dizem que ela aceitaria ser ministra, mas, se a Autoridade Climática ficar sob o controle do MMA, ela não topa comandá-la.
As ex-ministras têm um histórico de atritos na área ambiental, que vem desde o governo de Dilma Rousseff. Já divergiram sobre o Código Florestal aprovado na gestão Dilma e também sobre a construção da usina de Belo Monte, também iniciada com Dilma. No caso atual, a discussão sobre a autoridade climática, estão em jogo a governança e o funcionamento do da política ambiental do futuro governo — além, é claro, da disputa de poder.
As duas propostas foram detalhadas nos relatórios da transição para o meio ambiente e já entregues ao vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) pelo coordenador dos trabalhos , o ex-governador do Acre Jorge Viana (PT). Elas devem ser apresentadas a Lula nos próximos dias.
O grupo de Izabella sugeriu que fosse criada uma secretaria especial na Presidência da República, com poder para comandar e coordenar ações relativas à sustentabilidade e meio ambiente em vários ministérios. A ideia desse grupo é que, sob o comando de Lula, a pauta climática seria “empoderada”, além de evitar problemas como os já ocorridos no passado, quando os interesses de ministérios como Agricultura ou do Desenvolvimento Econômico se chocavam com os do Meio Ambiente.
Já para o grupo de Marina Silva (Rede-SP), eleita deputada federal em outubro passado, a vinculação da Autoridade ao MMA seria necessária porque a agenda climática tem que estar associada aos temas da pasta, a exemplo de iniciativas como o Fundo Amazônia e o Fundo do Clima. A proposta de criar essa autoridade foi uma das que Marina apresentou como condição para aderir à candidatura de Lula, ainda antes do primeiro turno das eleições.
“O argumento em favor do MMA é forte, mas a questão climática envolve de 8 a 10 outros ministérios, como Agricultura, Transportes, Minas e Energia. Se a Autoridade ficar submetida ao Meio Ambiente, o ministério vai acumular brigas sucessivas com os outros. Se ficar na presidência, as decisões já serão pactuadas com mais força e operacionalidade, e menos conflito”, disse o ex-ministro Carlos Minc (PSB), membro da transição.
Defensores da segunda solução citam arranjos institucionais que já funcionam em outros países — como os Estados Unidos, onde não há ministério do Meio Ambiente, e o presidente Joe Biden nomeou o ex-secretário de Estado John Kerry como enviado presidencial especial para o clima. Kerry fica diretamente ligado ao presidente e trabalha em conjunto com outras agências governamentais ligadas ao tema.
A Alemanha, que transformou seu Ministério da Economia em uma pasta para Bem-Estar e Proteção Climática, distribuiu as atribuições ligadas ao meio ambiente em quatro ministérios diferentes.
No Brasil, há ainda um debate sobre com quem ficará a representação do país na discussão climática internacional — em que tanto Marina Silva como Izabella costumam circular bastante.
As duas, porém, acumulam um histórico de diferenças de conceito e de atritos pessoais que se tornaram explícitos durante a campanha eleitoral de 2014.
Depois de criticar o governo de Dilma Rousseff por Belo Monte e o Código Florestal, Marina disse na ocasião que Dilma representava um retrocesso na área do desenvolvimento sustentável, e acusou sua gestão petista de ser “conivente” com o desmatamento na Amazônia – na prática, uma estocada em Izabella, que era a ministra. A presidente então respondeu dizendo ter feito mais pela Amazônia que Marina.
Com esse histórico e visões diferentes do que deve ser a gestão ambiental do novo governo, nenhum dos membros do grupo da transição acredita que as duas poderiam se acomodar no mesmo ministério.
Nesse caso, Lula poderá indicar aliados que correm por fora da disputa pelo MMA, como o do ex-governador do Acre Jorge Viana (PT), coordenador do GT de Meio Ambiente, e o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Lula tem menos de um mês para solucionar o xadrez.7
FONTE: O GLOBO
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