Categories: Acre Notícias Política

Invasão de terra no Irineu Serra pode ter ligação com facções

Published by
Raimari Cardoso

Apesar de vir sendo denunciada há algum tempo e já ter decisão da Justiça pela reintegração de posse, a invasão a uma área de cerca de 30 hectares localizada às margens da estrada Irineu Serra, em Rio Branco, pertencente ao Estado do Acre, prospera a olhos vistos, causando aos moradores regulares da região a sensação de ausência do Poder Público quanto à questão.


Na atual fase da invasão, os barracos construídos em madeira – material de demonstra possuir uma certa padronização – já ultrapassam as duas centenas e aumentam a cada dia num ritmo ameaçador para quem vive na região que é adjacente à Área de Proteção Ambiental (APA) Raimundo Irineu Serra, criada pelo município no ano de 2005.


A região onde está a APA compreende o único trecho de floresta que ainda resta no perímetro urbano da capital acreana, nas margens do igarapé São Francisco, e também é lá que reside o patrimônio histórico e cultural da comunidade Alto Santo, fundada pelo mestre Irineu Serra, que deu origem ao culto do Daime no estado do Acre.


A padronização da madeira usada na confecção dos barracos foi  destacada acima porque sugere uma origem comum e pode estar sendo patrocinada por políticos que disputaram a eleição recente, segundo fontes consultadas pela reportagem, que pedem a preservação de suas identidades por temor a represálias que podem surgir de diferentes direções.


É que a área em processo acelerado de invasão teria ainda como pano de fundo a presença do Comando Vermelho e a possível omissão do atual governo estadual. Ainda por trás da incursão à área pública estaria, como real motivação, uma espécie de esquema baseado no loteamento e venda, obviamente ilegais, dos terrenos ocupados.


Uma das fontes com quem a reportagem conversou diz que mulheres são pagas para permanecerem no local junto com os filhos pequenos, em muitos dos barracos que se amontoam na área, para dar à ocupação ilegal ares de um “legítimo movimento de famílias sem-teto”.


Negociações com o governo


Já existe decisão da Justiça pela desocupação da área, o que até o momento não aconteceu. Em junho passado, um grupo de invasores conseguiu negociar com o governo do estado que casas que haviam sido levantadas no local até aquele momento não fossem derrubadas.


Naquela ocasião, o chefe da Casa Civil, Jonathan Donadoni, e o secretário de Planejamento, coronel Ricardo Brandão, dialogaram com os representantes do movimento. Na conversa, o governo sinalizou em cadastrar os moradores no Aluguel Social, auxílio que atende, em caráter de urgência, famílias que se encontram sem moradia. No entanto, poucas aceitaram a proposta.


“Asseguramos a todos os moradores o direito e a manutenção do aluguel social. Avaliamos esse critério de pagamento do benefício e propusemos também fazer um cadastro e verificar a situação individualizada de cada família, e a partir desse levantamento poderemos trazer as soluções que o Estado tem”, disse Brandão à época.


O que diz o governo hoje


Nesta segunda-feira (17), Ricardo Brandão afirmou ao ac24horas que não existe qualquer omissão do Estado com relação à questão que, segundo ele, deve ser resolvida em um prazo de cerca de 30 dias, com a reintegração de posse da área.


De acordo com o secretário, a partir do resultado positivo para a ação de reintegração feita pela Procuradoria Geral do Estado (PGE), todos os requisitos legais passaram a seguidos para que o mandado de reintegração de posse da área seja efetivamente cumprido.


Inicialmente, foi solicitado pela Seplag à Polícia Militar a produção de um relatório de investigação social com o objetivo de caracterizar a invasão, identificando a possível participação de organização criminosa, a quantidade de crianças e idosos, se todas as pessoas são hipossuficientes, e ainda sobre as possibilidades de reação à ação de desocupação.


“É uma questão muito delicada em que todos os critérios legais precisam ser seguidos com muito cuidado. Tem que haver o cuidado com a questão humana para que o que precisa ser feito ocorra de maneira a não causar impactos desagradáveis para todos como, por exemplo, passar máquinas por cima de barracos”, disse o secretário.



Com o levantamento  social já pronto, Ricardo Brandão informou que uma empresa está sendo contratada emergencialmente para fazer o desmonte dos barracos. Ele justifica a medida pela carência que o Estado possui no momento de servidores operacionais para executar esse tipo de trabalho.


“Todos os ocupantes estão cientificados de que terão de deixar o local e de que não existe qualquer possibilidade de ali permanecerem. Junto a isso, todo o apoio será disponibilizado para que quem estiver efetivamente morando na área seja levado para o local que indicar, além das medidas de assistência social que se fizerem necessárias às famílias”, acrescentou.


Presença de facção na área


Sobre a possibilidade de haver a participação de membros do crime organizado por trás do movimento de invasão, o secretário de Estado de Segurança Pública do Acre, Paulo César Rocha dos Santos, disse ao ac24horas que a pasta não possui informações concretas de que isso seja fato.


“Nós não temos elementos que apontem para isso, considerando que as tratativas a respeito da reintegração de posse naquela área estão inteiramente a cargo da Seplag. Contudo, a partir da informação que chega agora, iremos indicar ao nosso serviço de inteligência que investigação seja feita nesse sentido”, disse o secretário.


Área relevante para o Estado


As tentativas de invasão à área não são recentes, já tendo ocorrido em governos anteriores, mas nestas ocasiões as medidas para pôr fim aos movimentos ocorriam em poucos dias. Para o jornalista Toinho Alves, que é morador da região, o que ocorre na atualidade possui um novo e mais elevado padrão de organização.


“Este ano, entretanto, está sendo diferente. Apareceu uma invasão com assessoria jurídica, demarcação organizada de lotes, espaços reservados para futuras ruas e carros novos estacionados nas proximidades, nada de fuscas ou pampas. A lona dos barracos já está dando lugar à madeira e aparece, aqui e acolá, algum tijolo”, afirma Alves em um blog que assina.


Outro ponto que merece destaque é o fato de a área onde ocorre a invasão não ser de irrelevância para o governo do estado. É lá onde o governador Gladson Cameli idealizou a construção de um Centro Administrativo, uma obra de 300 milhões, dos quais ele disse que já tinha disponíveis R$ 100 milhões.


Também já foram cogitados como possíveis empreendimentos do governo para a área a construção de 470 casas populares, que seria fruto de uma emenda parlamentar do senador Marcio Bittar, e também as instalações futuras do Batalhão Ambiental da Polícia Militar do Acre.


“Vista grossa” da Energisa


Um fato que chama a atenção na área da invasão é que os barracos levantados no local contam com energia elétrica. De acordo com as informações que a reportagem obteve em caráter sigiloso, a empresa Energisa estaria fazendo “vista grossa” para as ligações clandestinas, uma vez que não estão ocorrendo cortes dos “gatos”.


Procurada, a concessionária afirmou por meio de nota que a rede clandestina de energia existente na invasão foi realizada sem o consentimento da distribuidora. A empresa ainda reforçou que promove ações permanentes de combate ao uso irregular de energia elétrica em toda a área de concessão, inclusive na região mencionada.


“Somente nos primeiros seis meses de 2022, a empresa já inspecionou mais de 23 mil unidades consumidoras, e realizou ações de regularização, blindagens e adequações na rede, sendo identificadas 6,2 mil irregularidades no período”, diz um trecho da nota enviada ao ac24horas.


Share
Published by
Raimari Cardoso

Recent Posts

Vândalos que apedrejaram ônibus são identificados e nenhum é preso

A Polícia Militar identificou os suspeitos de terem apedrejado dois ônibus que faziam o percurso…

14/05/2024

Detentas celebram Dia das Mães com projeto “Costurando Liberdade” no Juruá

Detentas de Cruzeiro do Sul tiveram um café da manhã nesta terça-feira, 14, em homenagem…

14/05/2024

Porto Walter terá campeonato feminino de futebol com premiação de R$ 22 mil

Começaram nesta terça-feira ,14, as inscrições para o 9º Campeonato Feminino de Futebol de Porto…

14/05/2024

Rosana Gomes assina ordem para reforma de escolas em Senador Guiomard

Em celebração ao 48º aniversário de Senador Guiomard, a prefeita Rosana Gomes (PP), juntamente com…

14/05/2024

Atlético-MG cai em armadilha, perde do Peñarol e vê fim de invencibilidade

O Atlético-MG até martelou um fechado Peñarol, mas caiu na armadilha da bola parada no…

14/05/2024

Petecão é eleito vice-presidente do Parlamento do Mercosul

O senador Sérgio Petecão (PSD-AC) foi eleito esta semana vice-presidente da Comissão de Assuntos Econômicos,…

14/05/2024