O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes criticou hoje discursos de ataque à democracia e afirmou que “liberdade de expressão não é liberdade de agressão”.
A declaração foi dada em palestra a alunos da Faap (Fundação Armando Alvares Penteado), na cidade de São Paulo, uma semana após o STF condenar o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) por ameaças a ministros do tribunal, incluindo o próprio Moraes. Silveira não foi citado diretamente por Moraes em sua fala.
“Não é possível defender a volta de um ato institucional número cinco, o AI-5, que garantia tortura de pessoas, morte de pessoas. O fechamento do Congresso, do Poder Judiciário”, afirmou Moraes.
A palestra do ministro foi marcada por críticas à propagação de notícias falsas e o prejuízo desse processo para a democracia dos países. Abordado pelo UOL ao final do evento, o ministro não quis falar com a reportagem. Ele saiu sem falar com a imprensa presente.
Daniel Silveira foi condenado pelo STF a oito anos e nove meses de prisão e punido com a cassação de seu mandato por ameaças a ministros do tribunal.
Silveira virou réu depois de postar um vídeo, em fevereiro de 2021, com ofensas a ministros do STF e apologia ao AI-5, o Ato Institucional Número 5, que viabilizou ainda mais a repressão contra civis durante a ditadura militar (1964-1985).
No dia seguinte à condenação, o deputado recebeu um perdão (chamado de “graça”) do presidente Jair Bolsonaro (PL). A medida funciona como um indulto e é uma prerrogativa do presidente da República para extinguir a condenação de uma pessoa.
A ação de Bolsonaro criou uma tensão com o STF. Como mostrou reportagem do UOL, muitas ameaças e ofensas do presidente aos tribunais ou a seus ministros ocorreram em meio a momentos de fraqueza do governo.
Bolsonaro tem criticado a corte e defende que a condenação de Silveira fere a liberdade de expressão. Hoje, ele voltou a falar em “excesso” por parte do STF e disse que não peitou a corte.
Alexandre de Moraes, que também é vice-presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), defendeu que é “muito fácil” se utilizar do argumento de liberdade de expressão para praticar algum tipo de crime pela fala.
“É um discurso muito fácil para a pessoa que prega racismo, homofobia, machismo, fim das instituições democráticas, falar que está usando sua liberdade de expressão. Essa pessoa não pode xingar individualmente uma pessoa”, disse o ministro.
“Se você tem coragem de exercer sua liberdade e expressão, não como um direito fundamental, mas, sim, como escudo protetivo para prática de atividades ilícitas… Se você tem coragem de fazer isso, você tem que ter coragem também de aceitar a responsabilização penal. Ninguém vai te censurar previamente, mas suporte as consequências”, afirmou durante sua palestra.
Moraes também defendeu durante o discurso o inquérito das fake news que corre no STF e disse que a investigação não será encerrada.
“A desinformação é tanta que até às vezes a imprensa tradicional repete fake news. Hoje saiu uma notícia que o Supremo quer arquivar o inquérito das fake news. Isso é uma fake news. Não vai arquivar inquérito das fake news porque nós estamos chegando nos financiadores. A investigação tem seu momento público e o momento sigiloso, que na maioria das vezes é mais importante”.
Hoje, o jornal O Globo noticiou que a ideia de encerrar o inquérito das fake news está ganhando amparo dentro do STF como forma de apaziguar as relações entre a corte e o Palácio do Planalto.
No Supremo, foi Moraes quem conduziu o processo, que tramita em sigilo e já levou à prisão apoiadores de Bolsonaro que utilizavam as redes sociais para atacar a democracia.
Ainda sobre a divulgação de fake news, o ministro arrancou risadas da plateia quando citou as notícias falsas presentes em grupos de família no WhatsApp.
“O problema não é o grupo de família do WhatsApp. Para chegar até ela, tem toda uma produção, divulgação, financiamento”, disse Moraes.
O ministro narrou um diálogo com sua mãe para exemplificar o cenário: “Quem te mandou? ‘Minha amiga’. Você leu, você ouviu? ‘É muito grande’. Por que você passou? ‘Tava bonitinho no começo’. Você viu que falou mal do seu filho?”.
Na sequência, mais uma fala bem humorada no ministro: “apesar de acharem que sou mal, não vou prender minha mãe por causa disso”. O público presente deu risada.
O discurso de Moraes durou cerca de 50 minutos. Além do ministro, professores e desembargadores, esteve presente o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Luiz Sarubbo.
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