O centro da cidade de Rio Branco é composto por diferentes monumentos históricos. Praças, prédios, espaços culturais e administrativos. Mas há um pequeno e simples lugar que, apesar de ser avistado diariamente pelos transeuntes, pode passar despercebido pela maior parte da população. O pequeno e tímido empreendimento está por lá há exatos 30 anos, sempre no mesmo local. Fez e continua fazendo parte da rotina de muita gente. Trata-se de uma banquinha de bombons situada em frente ao Colégio Barão do Rio Branco, bem ao lado da Biblioteca da Floresta.
Desta vez, a coluna não irá retratar a história de uma empresa famosa, empresários notáveis de sucesso ou algo parecido. Hoje, o espaço é dedicado a Charles de Alcântara Oliveira, de 51 anos, ou simplesmente Charles, que em três décadas vendendo bombons conseguiu construir sua casa, sustentar uma família com sete filhos e alcançar um lugar ao sol para chamar de ‘seu’. Mais do que sucesso, o comerciante nato conquistou sozinho a própria dignidade.
Charles está no mesmo ambiente desde quando tinha 21 anos de idade. Embora seja um ofício não tão valorizado pela sociedade, sua dedicação na venda de bombons lhe rendeu, além de independência financeira, boas histórias e uma centenas de clientes/amigos. “Vi muitas mudanças por aqui desde que cheguei ao centro da cidade. Querendo ou não, tivemos um grau de desenvolvimento. O Centro ficou mais bonito”, comenta.
Se tem alguém que conheça o cotidiano da capital acreana, esse alguém é Charles. Nesse período que trabalha por lá, chegou a uma triste constatação: “falta o povo vir para cá, como vinha antes. As pessoas não vêm mais da mesma forma”, lamenta. O vendedor conta que antigamente o local era um verdadeiro “point”, recebia moradores diariamente e tinha significativa movimentação de pessoas. “O povo vinha para se encontrar, para ter prazer de estar aqui na praça. Hoje, deixaram de fazer isso. Não por falta de opções do que fazer, mas porque aqui também não oferece mais o que tinha antes”.
Ele refere-se às atrações culturais que aconteciam na região. “Antes o povo chegava, fazia seus shows, podia ficar, colocar um palco aqui na praça, chamar o público, realizar atrações, podia divulgar. Hoje, se você fizer alguma coisa aqui na praça, não tem divulgação, ninguém sabe de nada, é tudo mais difícil e complicado”.
Charles montou uma banquinha e tornou-se vendedor de bombons por simples pura necessidade. Antes disso, trabalhava na empresa Coca-Cola em Rio Branco, onde ficou por cerca de um ano. “Só que nessa época a empresa começou a dispensar funcionários, por já estar “mal das pernas”. Eles diziam que tinham impostos muito altos e que iriam fechar”. E assim aconteceu. A empresa fechou de vez, deixando a capital acreana, que ficou sendo abastecida pela filial de Porto Velho (RO).
“Na terceira leva de demissões, eu saí. Foi aí que eu fiquei sem saber o que iria fazer. Estava difícil naquele tempo até para trabalhar em construção ou coisas parecidas. Fiz curso de balconista, tentei trabalhar numa farmácia, mas nada aparecia. Aí eu passei aqui nessa praça [da Revolução], vi uns ambulantes e disse: sabe de uma coisa? Vou fazer isso também”. Até se convencer de que iria comercializar pequenos produtos por ali, ficou um dia inteiro observando o movimento de clientes e vendedores. Analisando de perto o que era vendido.
“Era pouquinho o que eles faturavam, mas ganhavam. Montei minha barraquinha e fui ver no que ia dar. Na verdade, esperei para ver o que o homem lá de cima [Deus] iria fazer comigo. E até hoje estou aqui”.
Durante esses 30 anos com a banquinha, seu carro-chefe sempre foram os bombons, os doces em geral. Nunca saiu desse nicho. Quando chegou ao local, o Cerb já existia, era o nostálgico Ceseme. “Eu estava formando minha família com a primeira esposa ainda quando cheguei aqui. Depois de uns cinco anos trabalhando na praça, tive o primeiro e segundo filho. Hoje tenho sete, com idades que vão de 2 a 27 anos. E sempre sustentei minha família só com a venda dos bombons, e ainda paguei pensão aos mais velhos”.
A rotina do trabalho é árdua como em qualquer outro ofício. Engana-se quem pensa que a vida de Charles é ficar sentado esperando pelos clientes. “Chego cedo e saio muito tarde. Começo o dia aqui entre 7h e 9h, dependendo do dia, e saio entre 21h e 2h da madrugada. Essa rotina já dura 30 anos”. Nascido em Rio Branco, se desloca diariamente de um bairro distante até a região central da cidade.
São três décadas construindo muitas amizades com os clientes. A clientela varia desde turistas a colaboradores de empresas localizadas na região. “As pessoas que trabalham aqui por perto sempre vêm conversar comigo. Elas param aqui e batem papo. Já vieram até atores da Globo aqui comigo, quando eles vêm fazer alguma gravação”. Parar na banquinha do Charles é quase que um ponto de encontro para quem convive na localidade, no cotidiano da cidade.
O vendedor que montou uma banquinha de bombons por necessidade, continua atuando no mesmo ramo há 30 anos porque, segundo ele, tomou gosto pelo que faz. “Continuo vendendo aqui porque depois de construir minha família, fazer minha casa, tudo com fruto dessa banquinha, pensei: rapaz, daqui eu não saio mais, só se me expulsarem”. Atualmente, fora a necessidade, trabalha porque gosta e porque as vendas seguem dando retorno.
As vendas não param. A todo instante chega um cliente em busca do bombom, ou de qualquer outra coisa. Charles não consegue mensurar com exatidão quantos clientes atende por dia, mas chega a uma média de 40 a 50 compradores diariamente. “Alguns são clientes repetitivos, aqueles que vêm aqui comigo todos os dias. Às vezes, quando eu não venho trabalhar, eles perguntam por que eu não vim, querem explicação, o motivo para que eu ficasse em casa”, brinca.
Nem tudo são flores no caminho do pequeno comerciante. No momento em que decidiu partir para o ramo do comércio, passou a se deparar com a concorrência. Ele afirma que tem lidado bem com isso, apesar de ser bastante severo. “A concorrência cresceu bastante nos últimos tempos. Mas ainda lembro que antigamente era bem maior, pois em cada ponto dessa praça existia um comércio”. Houve um tempo em que a praça da Revolução tinha um enorme corredor lotado de lanchonetes, tanto de um lado, quanto do outro.
Não foram só os grandes e médios empreendedores que sofreram com a chegada da pandemia de Covid-19 ao Acre. Vendedores como Charles amargaram o pior momento econômico que o estado viveu nos últimos tempos. Segundo ele, o movimento de clientes caiu pelo menos 80% nesse período de quase dois anos. “O número de comerciantes na redondeza diminuiu, mas o movimento de clientes também caiu na mesma medida”.
Sem aulas presenciais, o movimento de alunos também despencou. “Era algo que me ajudava pra caramba. Nunca imaginei que os alunos fossem me fazer tanta falta. Antes da pandemia, quando eles ficavam de férias, dois ou até três meses, eu não sentia tanta diferença no movimento, que pra mim era o mesmo. Mas nesses quase dois anos de pandemia, o “bichinhos” me fizeram muita falta. Eles compram mitos doces e são esses produtos que me dão aquele lucro”.
A crise foi tamanha no pico da contaminação pelo novo coronavírus que ele teve de dar uma pausa no trabalho (pela primeira vez). “Tive que parar por causa da redução do movimento de clientes na pandemia. Reduziu muito as vendas, as pessoas não estavam mais nas ruas. Chegou ao ponto de eu abrir a minha banquinha e a polícia vir mandar eu fechar”. Charles ficou duas semanas com a banca fechada e, enquanto isso, faltava comida em sua casa. “Eu vivia aperreado. Mas decidi: vou brigar com eles [poder público], vim aqui e abri a barraquinha. Não tinha aquele movimento todo, mas conseguia levar alguma coisinha para casa”.
Nesse mesmo período, um de seus filhos também estava passando dificuldades por causa do desemprego. Foi quando seu pai começou a ajudá-lo, e, para isso, doou seu próprio sustento. “Entreguei a barraquinha para ele e fui atrás de um trabalho novo para mim. Consegui um serviço de entregador. Com 50 anos, fui trabalhar de entregador e tinha que correr de igual pra igual com os meninos de 20 anos. Foi como consegui me sustentar nesse tempo lá em casa”.
O que mais intriga o pequeno comerciante é não poder mais realizar atrações no centro da cidade, como existia antigamente “Tudo que se vai fazer tem que ter permissão da secretaria de obras e outros setores. Vejo que o poder público acabou atrapalhando um pouco. O estado deveria ajudar tentando deixar acontecer os eventos que tinham aqui, chamar a população, fazer acontecer, criar eventos em datas comemorativas, apresentação de bandas”, comenta.
Nesse período que atua no centro, criou vínculo de amizade com os funcionários do colégio. “Tento me adequar a todo mundo. Cada um com sua forma de ser, seja brincalhona, seja séria. Os funcionários param aqui, conversam”. Para ele, seria um prazer ajudar a cidade com informações relevantes aos turistas.
“Se aqui tivessem uns folhetos informativos, acho que eu distribuiria muitos e passava muita informação, porque os turistas gostam de perguntar demais as coisas pra mim. Tem coisas que eles perguntam que eu poderia saber, mas ninguém me repassa nada Os pontos turísticos que eu conheço, ou outros que poderia repassar para eles, sempre tento ajudar, dizendo onde estão os lugares”, afirma.
Antes da pandemia, há cerca de cinco anos, ele tinha o objetivo de querer montar um comércio maior, estava indo no caminho certo, estava juntando dinheiro, o propósito estava caminhando, mas a pandemia o derrubou. “Tinha um dinheiro guardado, mas gastei devido a pandemia e ainda fiquei devendo. Agora, estou tentando pagar o que eu devo, vendendo a mercadoria devagarinho. Vou mantendo o sustento da minha família com minha banca, e é dessa forma que eu vivo. Não tem outro lugar para fazer dinheiro, não tenho mais idade para estar correndo atrás, e quando corro é de forma autônoma também, e assim vamos indo. Só esperando coisas boas na vida”, conclui.
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