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Diário do Acre: Vila Restauração e Marechal Thaumaturgo

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Acordamos com as galinhas e, antes do sol nascer, já estávamos na beira do rio Tejo subindo para a Vila Restauração. Mesmo com a chuva da noite anterior, o rio ainda estava seco. Eu, Aldemir e Bumba tivemos que empurrar a canoa nas cachoeiras para chegar. A chegada na vila é deslumbrante. No meio da floresta, os moradores do maior povoamento rural de Marechal desafiam o isolamento.


Uma escadaria de madeira do porto vai até uma pequena casinha, a qual dá acesso as calçadas de tijolos que se estendem por boa parte da vila. Bumba esperou na canoa, Aldemir voltaria para Marechal, foi apenas me acompanhar até a casa do nosso amigo Carneirinho. O trajeto curto se estendia nas paradas para conversar e saber como estava a família de cada morador que encontramos no caminho.

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Aldemir avistou o Sorriso de longe, chamou, e sem deixar de me alugar dizendo que eu não conseguiria fazer o trajeto, perguntou se ele não tinha coragem de me acompanhar na caminhada até o Jordão. “- Vai ficar por onde?”, perguntou Sorriso. “Mais tarde nós vemos lá no Carneirinho”, afirmei, enquanto seguíamos.



Carneirinho estava no roçado, quis ir lá, mas, o Aldemir me advertiu que eram duas horas a pé pra ir e voltar! Vamos esperar, já basta o desafio de amanhã. Yuan filho mais novo do Carneirinho roteou pra mim a internet 4g da TIM que existe na Vila. Depois de dois dias de barco pra chegar na restauração, tudo já não parecia mais tão distante. Aldemir voltou pra trás antes do Carneirinho chegar! Yuan me fez companhia e respondia pacientemente todas as minhas indagações.


Carneirinho chegou pouco antes do almoço, trouxe mamão e abacaxi do roçado. Foi chamar uma filha na casa ao lado para preparar uma galinha caipira pro almoço. A esposa dele estava em Rio Branco num retorno ao médico. Mal terminei de comer e fomos atrás do Sorriso, após, combinarmos a viagem, me levaram para visitar a vila.


A vila mudou muito desde a última vez que fui por lá. Uma pracinha no centro e as calçadas de tijolos dão um charme à comunidade. Encontrei o barqueiro que iria nos levar de manhã até a barraquinha, ponto de saída para a caminhada até o Jordão! Falei que queria sair às 5h, ele sugeriu sairmos às 3h! O igarapé está seco e a viagem poderia demorar mais do que prevíamos. Olhei para o Sorriso que acenou com a cabeça. Combinado, saímos às 3h.



Dona Carlandia nos chamou pra varanda e nos ofereceu uns Vips, mesmo com o calor, eu preferi um cafezinho. Um vendedor viajante que chupava um vip perguntou de onde eu era e o que fazia pelas bandas da restauração. Contei a todos que queria fazer a travessia de Marechal para Jordão de pés. Entre as risadas, os olhares me julgavam se conseguiria ou não concluir a empreitada.


Fui conhecer a família do Sorriso. Seu Israel e Dona Ana estavam na varandinha de madeira com os filhos mais novos tentando contato por telefone com uma filha que está morando em Cruzeiro do Sul. Enquanto bebia uma água gelada, alguns trabalhadores estavam no terreno fazendo medições. Reconheci o Adão, me contou da instalação de água que estão fazendo na vila. Dona Ana disse que a obra será mais uma benção de Deus.


“Vamos ver o parque solar e depois atrás de merendar”, sugeriu Sorriso. O parque impressiona pela tecnologia. As placas solares produzem energia para todas as famílias da vila. Aline estava deitada na rede se embalando, quando chegamos atrás da merenda, já era tarde, não tinha mais nada pra comer. Enquanto Aline reclamava do preço do gás, assistia da janela os meninos brincando no campo da vila.


Aproveitamos e fomos no comércio da Marta para comprar alguns biscoitos para levar na viagem e refrigerante, para dividir com quem passava o tempo na casinha vendo o sobe e desce no porto. Carne de caça, peixes, farinha, tinha de tudo. Sorriso pediu para um dos que subiam separasse umas curimatãs gordas que ele queria comprar. Na venda do Pedro Camurça, um boteco disfarçado, o som estava animado. Conheci o Segurança que dava conta de tudo na vila. Pedro me chamou pra voltar mais tarde. Agradeci, mas tinha que acordar cedo no outro dia.

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O sol já estava se pondo quando voltei pra casa do Carneirinho. Comemos o que tinha sobrado da galinha, enquanto falávamos da vila. Carneirinho que viu a comunidade crescer, desde o tempo dos patrões, mesmo entusiasmado com a luz, lamentava as dificuldades financeiras dos moradores que continuam escravos da farinha, que pouco rende para quem a faz.


Me preparava para o banho, quando fui chamado por uma moça da comunidade, que me pediu ajuda para comprar material e fazer uns VIPs pra vender no jogo, que aconteceria no dia seguinte. “É pra pagar internet e minha faculdade on-line”, afirmou a moça. Após o banho gelado, estiquei o cortinado e fui dormir, ouvindo ao longe um culto e pensando que ainda se tem muito por fazer por lá.


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