Há quase um ano o Acre ganhou o primeiro hotel que funciona no sistema Guesthouse, uma casa de família que aluga quartos e espaços externos da residência enquanto os proprietários permanecem no imóvel e podem conviver com os visitantes. No início, seria algo mais intimista, porém, o Jardins Guesthouse, situado na Estrada da Floresta, em Rio Branco, ganhou proporção maior e a procura hoje é tanta que há semanas em que não dá para atender a todos os clientes e forma-se fila de espera.
Esse modelo inovador de hospedagem para o estado ganhou a aceitação de todos os grupos: famílias, amigos, casais, turistas e até as crianças. O sistema que já é bastante conhecido e tradicional na Europa agora também está fazendo sucesso na capital acreana. O ambiente permite que os hóspedes possam compartilhar vivências com atividades como tirolesa, apresentações e eventos culturais e religiosos, artes, exposições de artesanatos, quadros, oficinas, colônia de férias, piscina, tecidos acrobáticos, slackline, lago com caiaque, e etc.
A ideia do empreendimento é do casal de acreanos Victor Pontes e Rosiany Albuquerque, que estão juntos há mais de 12 anos. Victor é turismólogo e Rosiany formada em administração e marketing. Mas era Victor que sempre sonhava em ter uma pousada. Onze anos atrás ele foi para o município de Xapuri, distante cerca de 186 quilômetros de Rio Branco. Lá, abriu a pousada Ayshawa, que também foi pioneira no turismo de vivência, mas nada parecido com a estrutura e grandiosidade do Jardins Guesthouse, onde o proprietário também é responsável técnico.
A pousada de Xapuri foi a primeira a ter parque temático de aventura com arvorismo e tirolesa e serviu como protótipo de algo muito maior, que é o Guesthouse. Este último teve suas atividades iniciadas em outubro de 2020. “Trabalhamos no desenvolvimento turístico. Também temos uma agência que promove expedições em aldeias indígenas e doutrinas do Santo Daime. Vimos necessidade de abrir um modelo de hospedagem como o Guesthouse, onde o turista ou viajante possa ter uma segunda casa”, explica Victor.
O “casarão”, como também é chamado o Guesthouse, tem seus anfitriões e a visita pode usufruir da casa como se fosse dela. “Essa é a característica desse sistema de hospedagem e tem sido bastante aceita nesse momento em que o Acre vem vivendo”, o turismólogo. O casal salienta que ao passar pelo portão, a impressão é de estar entrando noutro universo, como dizem os hóspedes. “O Acre está desenvolvendo uma linha turística e tem muitos visitantes de fora em busca do novo turismo, que é o turismo vivencial”.
O espaço tem 15 mil metros quadrados e o grande desafio é tornar todo o ambiente num lugar turístico. Atualmente, vem sendo destino de curiosos, o que tem surpreendido os proprietários. “Tem pessoas vindo da Bolívia, de Porto Velho, Epitaciolândia, Brasileia, Peru. Já atendemos três grupos de uma mesma família que queriam curtir aqui dentro”.
Além disso, o empreendimento atua com o etnoturismo, que já vinha sendo trabalhado por Victor e Rosiany desde Xapuri. “Vimos essa necessidade de Rio Branco ter um meio de hospedagem desse estilo, que tenha contato com a natureza, que seja bem localizado, na direção do aeroporto, na frente do shopping, essa área oferece tudo isso”.
O Jardins Guesthouse oferece opções ao cliente. Há quartos compartilhados masculino, feminino e misto, e o quarto privativo, que cabe até quatro pessoas. O local também é bastante procurado para realização de eventos como aniversários e comemorações que reúnem menos pessoas. “Nosso diferencial é esse, ser um modelo único em Rio Branco, onde só tinha hotel, horizontal, sem esse contato com a natureza”.
O imóvel em que funciona o Guesthouse tem arquitetura icônica, começou a ser construído em 2001. Entretanto, está completamente repaginado e decorado com temáticas que fazem referência ao que vem sendo desenvolvido ao longo do tempo em torno do turismo, medicinas da floresta, busca espiritual e o misticismo. “Estamos investindo nesse pensamento. Iniciamos a atividade de uma forma mais tímida, por causa da segunda onda da pandemia. Essa é uma modalidade proposta justamente para viajantes de fora do Brasil”.
Victor já trabalhava com expedições indígenas em sua agência de turismo e sentia essa necessidade de ter um lugar para quando os estrangeiros chegassem para acomodá-los da forma mais local possível. “Mas os acreanos também têm gostado muito, pois aqui é escasso com relação a um lugar para ir com a família, de descanso, lazer. E temos trazido muitas novidades, o projeto é muito grande”, destaca.
O conceito do Jardins Guesthouse se assemelha ao hostel por ser mais econômico, porém se diferencia pela casa de grande porte. “Somos os anfitriões e nosso público maior é voltado ao conhecimento, à parte mais cultural, regional, gastronômica. Nosso perfil é do etnoturismo, que está despontando, inclusive no mundo inteiro”. Segundo o turismólogo, as nações estão descobrindo o Acre da forma tradicional, baseados na medicina da floresta, então, o público tem mais esse perfil, de pessoas que procuram o local em busca da doutrina, das religiões, da barquinha, entre outras.
Rosiany destaca que a programação oferecida agrada todos os gostos. “É aí que entra nossa agência, com um turismo mais receptivo. A ideia surgiu dela. Voltamos de Xapuri para Rio Branco devido à pandemia, e tivemos que nos virar nos 30. Foi então que vimos a necessidade do Day Use, pois muita gente queria conhecer a casa, o espaço, e montamos isso para pessoas passarem o dia e não somente para hospedes”.
A modalidade Day Use permite que o cliente pague para usar apenas uma parte do dia. “Vimos que poderia ser uma boa opção, porque todos os dias a gente recebia pessoas querendo conhecer o casarão, saber o que era. Muita gente aparece dizendo que tinha um sonho de conhecer a casa. E vimos esse público-alvo dando muito certo”.
O Guesthouse atende com mais frequência o Day Use durante a semana e aos finais de semana utiliza a capacidade máxima permitida em período de pandemia. “A média de atendimento varia muito. Às vezes tem eventos indígenas no interior e recebemos muita gente. Temos recebido ainda muitas pessoas da Bolívia e Peru, famílias inteiras de bolivianos”. O local tem oito acomodações, partindo desde o econômico, que é o chamado “belichário”, com quarto compartilhado e banheiros externos, até as suítes, com banheiros privativos e a suíte-máster, a maior da casa. “Para o riobranquense, temos a tirolesa, o pesque e solte e ainda terão outras atividades para colocar atividades turísticas dentro dos jardins, que já estamos investindo”, garantem.
O casal retornou de Xapuri ano passado, em plena pandemia, e lá deixaram a pousada base. Toda semana Victor ou Rosiany vão ao município ajudar a gerir o negócio, que tem um perfil de hotel mais econômico.
Hoje Victor e Rosiany moram no Jardins Guesthouse com o filho pequeno. “Chegamos num momento em que num período de 9 meses, atendemos mais movimento cultural aqui dentro do que em qualquer outro lugar até mesmo preparado para esse tipo de evento”. A dona salienta que a proposta não é só focar só na questão dos indígenas, mas transformar o local numa base cultural.
Outras atividades estão previstas para ocorrer no local. “Teremos oficinas de artesanatos, colônia de férias, seria mais uma base cultural onde acontecem várias outras atividades desse tipo. Queremos trazer isso ao acreano”, afirmam. Os jardins já receberam encontro de grafite, presença de quatro etnias, um retiro espiritual com os Yawanawá, retiro cultural com os Shanenawa e encontro de capoeiristas. “As pessoas estão conhecendo essa parte e se interessando, e o melhor é o nosso conceito: fazer a pessoa se sentir em casa”, diz a administradora.
Para o turismólogo, o visitante chega e vê que ali é sua segunda casa. “Tem pessoas que vêm para cá ler um livro, traz a rede, fica nas árvores, faz um trabalho na sacada principal usando uma boa internet e aproveitando a vista até mais tarde”. Devido à agência do casal, eles têm contato com mais de 10 aldeias, que participam dos eventos com visitantes.
“O Acre está sendo preparado, nossos representantes indígenas já são embaixadores, andam com celebridades, o estado vem avançando. Os trabalhos que mais acontecem aqui é na hora que eles vem fazer uma visita pra nós e já fazem um trabalho espiritual aqui no local e chamam os amigos”.
Apesar dos constantes trabalhos envolvendo grupos indígenas, o Guesthouse é apenas um centro que facilita o acesso do turista ou visitante. “Se coincidir de a pessoa vir aqui e ver um indígena que tiver fazendo um trabalho aqui, pode acontecer de ela experimentar os ritos que eles fazem. Já aconteceu de pessoas que nunca tiveram contato ou participado de atividades indígenas e tiveram aceitação e respeito”.
Para o próximo mês de novembro está prevista a continuação do projeto Aldeia Urbana, uma vez que permanece proibida a entrada de pessoas nas aldeias por conta da pandemia de Covid-19. “Nós não podemos adentrar as aldeias, porém os Txai estão todos vacinados. Para a ciência, estão imunizados e podem sair de suas aldeias”. O projeto consiste em convidar uma aldeia até o Guesthouse.
“Eles vem sempre com 18 pessoas. O próximo seria um sagrado feminino. Hoje a cultura abre para as mulheres ministrarem, fazer trabalho, já tem pajés mulheres reconhecidas por seu povo, a ideia é fazer o fortalecimento dessa cultura, do artesanato, trazer a força das mulheres guerreiras mesmo”.
Assim que liberados pelo governo estadual, lançaram o curso de tecido acrobático, que atraiu bastante público. No entanto, tiveram de parar por conta do avanço do novo coronavírus. “Após todos estarem com a segunda dose da vacina, iremos iniciar novamente o curso. O SPA também tem sido bem aceito, as pessoas vêm para relaxar com tudo que é montado aqui”.
Apesar do sucesso que já vem fazendo, eles destacam que estão caminhando agora, começando devagar. “Vamos lançando as atividades aos poucos. Vem muita gente com família, com a criançada que gosta. O próximo projeto também é fazer o skibunda. Graças a Deus as pessoas têm gostado, são coisas diferentes que você só via fora e tentamos trazer tudo isso e juntar aqui e vem mais novidades”.
Rosiany sempre gostou de trabalhar com famílias e crianças e se vê num local privilegiado por esse motivo no Guesthouse. “Os hóspedes falam que em hotel não podem soltar as crianças e aqui é diferente. Estamos atendendo muito esse público e eles têm voltado”. O local tem um morador especial, o Alvinho, cachorro que já virou mascote do hotel. “É um sucesso com as crianças. Adotamos ele na pandemia quando a gente teve de se trancar em casa depois que nosso cachorro que já tínhamos há muito tempo faleceu. Foi o que salvou nosso filho na pandemia”.
Outra ideia que está para ser colocada em prática é o restaurante. Por conta da burocracia em poder funcionar, o espaço, para não deixar os hospedes sem nada, trabalha com congelados e fast-food, como lasanha e pizza. “Quem está cansado e não quer sair daqui, temos essa alimentação. Mas teremos uma estrutura de cozinha e torná-la um restaurante de fato com comidas tradicionais, como pato no tucupi, galinha picante, culinária indígena, galinha caipira, mandi frito”.
O objetivo é que pelo menos uma vez por mês abram a cozinha para fazer parcerias e que a mesma seja representada por um cozinheiro-chef. “Terá o prato daquela pessoa. Sempre com novidades. Queremos ocupar a cozinha, os quartos, a área de lazer. Brincamos sempre dizendo que não somos os donos disso aqui. O dono é Deus, nós estamos com a chave que deram para abrimos e fechar”.
Por segurança, o local só recebe pessoas com estadia reservada e o imponente portão sempre fechado. “Pela rotatividade de pessoas que passam por aqui, já temos esse cuidado. Temos todo um sistema de segurança que contratamos. Somos monitorados”, finalizam, ressaltando que as acomodações apresentam importantes benefícios, como atenção personalizada, quietude, baixo custo e design diferenciado.
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