A dona de casa Maria Geni Alves de Oliveira, de 39 anos, morreu na madrugada de sexta-feira, 23, em sua residência, após pegar alta médica 24 horas depois de dar à luz na unidade mista de saúde de Porto Walter.
Dona Geni teve o filho de parto normal, mas a criança já nasceu morta e ela ficou 24 horas internada. Ela deixou 10 filhos e entre eles, uma que sofre de epilepsia.
Durante a gravidez, Geni teve suspeita de Covid-19, infecção urinária e anemia grave, mas não foi encaminhada via TFD para Cruzeiro do Sul.
A vereadora Cleide Silva (MDB), que esteve com a mulher 2 dias antes dela ter o filho, conta que Geni estava muito fraca e não entende como ela teve alta médica depois do parto. “Dona Geni estava extremamente pálida e fraca. Não podia ter ido pra casa daquele jeito e deveria ter sido mandada para Cruzeiro do Sul, porque outras foram mandadas em estado de saúde bem melhor que o dela. As mulheres grávidas e puérperas não têm tido atendimento adequado na unidade mista do Estado, e a maioria é enviada para Cruzeiro do Sul em avião ou lancha, numa viagem longa e sofrida só pra fazer parto normal”, conta a vereadora, acrescentando que a falta de laboratório na Unidade Mista, também motiva a transferência das grávidas para fora do município.
O diretor da Unidade Mista, Erasmo Oliveira, que trabalha no local há mais de 20 anos cita que houve aumento no número de mulheres grávidas no município, mas reconhece que há problemas no atendimento de grávidas e puérperas. Cita que o médico idoso, de 70 anos, que fica atendendo sozinho por 15 dias, não consegue resolver todas as situações e muitos casos são encaminhados para Cruzeiro do Sul, principalmente quando são mulheres grávidas com algum problema. “Com certeza há deficiência. O médico não tem mais agilidade para o serviço de emergência”, reconhece o diretor.
Com relação ao caso da dona de casa Geni, que morreu depois de ter alta após o parto, ele cita que não havia indicação para TFD nas vezes em que ela esteve na unidade mista antes do parto porque o teste de Covid-19 deu negativo e pela infecção urinária, não há indicação para o Tratamento Fora do Domicílio (TFD).
Ainda segundo o diretor, a família da mulher foi “aconselhada” a levá-la para Cruzeiro do Sul devido à severa anemia e ao quadro geral dela. “Depois do parto ela ficou aqui 24h e saiu daqui andando, mas não sabemos do que ela morreu em casa. Parece que o próprio Dr. Leonardo, que deu a alta dela, assinou o atestado de óbito”, conclui.
Viagens longas e falta de profissionais
Na sexta-feira, 23, mais 2 grávidas de Porto Walter foram encaminhadas para Cruzeiro do Sul. Em uma dessas viagens, no dia 27 de março, uma criança nasceu dentro de uma lancha no Rio Juruá. O procedimento foi feito pelo enfermeiro Ítalo Menezes, que acompanhava a gestante na viagem noturna entre Porto Walter e Cruzeiro do Sul. Apesar da aventura, a mãe, Edmilsa de Souza e o filho Micael, não tiveram problemas.
À época, o enfermeiro contou que a equipe tentou fazer o parto por mais de duas horas, sem sucesso, e o bebê já estava em sofrimento fetal. Como não havia como uma aeronave ir até a cidade à noite, a família e equipe resolveram levar a gestante de lancha pelo Rio Juruá até Cruzeiro do Sul.
Em Porto Walter, município de 12 mil habitantes do Acre, localizado no Alto Rio Juruá, a maior parte dos casos de Tratamento Fora do Domicílio (TFD), é de mulheres grávidas que precisam se deslocar em avião ou barcos, em viagens de cerca de 6 horas até Cruzeiro do Sul, para terem os filhos. Mesmo os casos com indicação de partos normais são encaminhados.
Na unidade mista de Porto Walter, de responsabilidade da Secretaria Estadual de Saúde (Sesacre), apenas dois médicos se revezam em períodos de 15 dias. Um fica sozinho a metade do mês e, em seguida, o outro atua por mais uma quinzena. Um deles, Leonardo Jaime, tem 70 anos de idade.