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Estratégias funcionais

Por
Daniel Silva

As estratégias corporativas são as formas através das quais a organização realiza o suprimento das necessidades do ambiente e obtém dele, como contrapartida, os recursos de que precisa para continuar a supri-lo. As estratégias de negócios são as formas através das quais as divisões internas da organização efetivam o suprimento a partir de atividades-fim, como se fossem empreendimentos autônomos dentro da organização. As estratégias funcionais, por fim, são as formas através das quais as equipes de negócios de cada unidade de negócio efetivamente supre as necessidades do ambiente. São como pequenos empreendimentos dentro de empreendimentos. Diferentemente do que a literatura recente mais tradicional apregoa, não é apenas a conjunção de esforços departamentais coordenados pelo setor de produção/operação; são a constituição de verdadeiros empreendimentos, como se fossem células de negócios, onde uma parte dos membros executa a produção e outra lhes dá suporte. Este ensaio tem como objetivo apresentar a ideia de estratégia funcional adaptada para a inovação tecnológica.


Geralmente quando se pensa um negócio, o profissional de gestão já raciocina assim: se for uma indústria, as unidades-chave são compras (de insumos) e produção; se é comércio, compras e vendas; se é serviços, compras e operações; se é governo, compras e entregas; se é organização sem fins lucrativos, compras e suprimento. A lógica é a seguinte: são necessários recursos (sob a responsabilidade de compras/aquisição) para que a atividade principal seja executada. Na prática, o fluxo completo seria compras – produção/operação – vendas/prestação de contas (no caso de governo e organizações não econômicas). Em torno desse fluxo central serviços adicionais são criados para que as equipes das atividades-fim se dediquem apenas ao negócio. São as chamadas atividades-meio.


Assim, um negócio é constituído de atividade-fim e atividades-meio. Em instituições de inovação tecnológica, as equipes podem ser divididas em negócios, entendido negócio como a dedicação para o suprimento de necessidades (e não para vender alguma coisa). Pesquisa aplicada e pesquisa pura poderiam ser duas unidades de negócios de uma instituição, assim como outras poderiam optar por inovação técnica e inovação tecnológica, e outra poderia optar por inovação social, inovação industrial, inovação de serviços e inovação governamental. Essas divisões representam especialização do processo de produção tecnológica institucional, em que pessoas com altas expertises e capacidade de materialização de conhecimentos labutam em torno de objetivos comuns.


Dentro de cada unidade de negócio, para efeitos de operacionalização do sistema de produção, há equipes funcionando em torno de projetos de inovação. Na unidade de inovação governamental uma equipe pode estar voltada para a criação de uma inovação para a transparência dos investimentos de governo, outra para a materialização de um pórtico de localização de pessoas carentes e identificação de suas necessidades e uma terceira equipe para localização georreferenciada em tempo real de novas construções em determinado município. Na academia são chamados projetos. Em termos de estratégia funcional, cada equipe deveria ter as atividades-meio que a tornasse independente da instituição, o que implica em se relacionar diretamente com os clientes para que o produto esperado lhes seja entregue pelo menos no prazo acertado.


Uma equipe de negócio é que executa a estratégia funcional. Isso quer dizer, portanto, que uma estratégia funcional é a forma através da qual uma equipe efetivamente supre a necessidade que a própria equipe de negócios identificou e negociou o suprimento. Perceba que o desafio da equipe de negócio é identificar e suprir necessidades. Não é, como quem desconhece o universo gerencial, imagina, vender, comercializar, fazer dinheiro. Na verdade, a ciência não conseguiu, até hoje, demonstrar como se ganha dinheiro agindo diretamente para ganhar dinheiro. O que se sabe, e a ciência demonstra aos milhares de casos, que o dinheiro e qualquer outra forma de retorno só acontecem se um indivíduo ou organização tem efetivamente reconhecida sua capacidade em solucionar problema, que é outra forma de falar de suprimento.


Uma instituição organizada em termos de unidades e equipes de negócios não é mais funcional, no sentido estrito das teorias de organização. Não há mais departamento jurídico, marketing, finanças, produção etc. Isso quer dizer que não tem mais um diretor de finanças que dita ordens para toda a organização. Há políticas financeiras, naturalmente, coordenadas por alguma unidade estratégica, mas a operacionalização dessas políticas é feitas pelas diversas unidades e equipes de negócios de acordo com o contexto e situações específicas, que se alteram continuamente. Como políticas são grandes orientações (por isso incapazes de serem traduzidos em leis ou normas estritas), cada unidade e equipe de negócios as adaptam para darem conta das circunstâncias em que operam.


As estratégias funcionais apontam o grau de maturidade relacional que uma instituição já conseguiu alcançar no seu relacionamento com o seu ambiente de operação. Não é mais necessária a figura do reitor ou do pró-reitor para que um suprimento se realize. Não haveria figuras em quantidade suficiente para estar presentes em todas as negociações. As rodadas de negociações são variadas e podem durar muito tempo, até anos. A manutenção do relacionamento de suprimento, como consequência, está relacionado com o grau de confiança recíproca entre a equipe e o cliente, não com os representantes estratégicos institucionais.


Enquanto estratégia, como consequência, não são as equipes que trabalham para o nível estratégico. São reitores, pró-reitores e diretores que trabalham para garantir às equipes de  negócio o maior grau de autonomia possível, fundamental para que o suprimento de necessidades possa se efetivar e manter. É desnecessário dizer que o poder se dilui entre as equipes e representantes institucionais, permitindo o equilíbrio de forças que muitos almejam e que chamam democracia. Talvez a democracia só seja possível quando todas as instituições conseguirem funcionar de forma parecida com as equipes de negócios.



Daniel Silva é PhD, professor, pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e escreve todas às sextas-feiras no ac24horas


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