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Apuração oficial confirma vitória avassaladora de Arce na eleição presidencial na Bolívia

Por
Folha de São Paulo

Foto: Reuters


A apuração oficial do resultado das urnas na eleição do fim de semana na Bolívia terminou nesta sexta-feira (23), confirmando a vitória por ampla vantagem de Luis Arce, do MAS (Movimento ao Socialismo). Com 55,1 % dos votos, o aliado de Evo Morales conquistou a Presidência já no primeiro turno, derrotando o ex-presidente Carlos Mesa, de centro-esquerda, que obteve 28,8%.


Na Bolívia, para ser eleito no primeiro turno, é preciso ter 50% mais um voto, ou alcançar 40% dos votos e ter dez pontos percentuais de diferença para o segundo colocado.


O ultradireitista Luis Fernando Camacho, do Creemos, ficou em terceiro lugar, com 14%.


O Tribunal Supremo Eleitoral da Bolívia ainda não chancelou publicamente a vitória de Arce, mas informou que nesta sexta às 18h locais (19h em Brasília) apresentará os resultados oficiais. A apuração avançou lentamente depois que a corte decidiu usar o método de contagem voto a voto.


A data da posse ainda será definida, mas deve ser na primeira ou na segunda semana de novembro.


Adversários políticos de Arce já haviam reconhecido sua vitória após a divulgação da pesquisa de boca de urna na madrugada de segunda-feira (19). O levantamento previa 52,4% dos votos para o candidato do MAS, contra 31,5% do segundo colocado.


“Dissemos que respeitaríamos o resultado da eleição, para a vitória ou para a derrota. Não é possível deixar de reconhecer que houve um claro vencedor nas eleições deste domingo, que foi Luis Arce”, disse Mesa na segunda.


O ex-presidente acrescentou que ele e o partido do qual faz parte, o Comunidade Cidadã, têm a esperança de conquistar bons resultados no pleito ao Parlamento.


Jeanine Añez, presidente interina da Bolívia, também reconheceu a vitória do MAS. “Parabenizo os vencedores e peço que governem pensando na Bolívia e na democracia”, disse


Há pouco mais de um mês, ela desistiu da corrida presidencial para evitar que a sigla do líder indígena acabasse ganhando.


A Organização dos Estados Americanos (OEA), uma das principais vozes responsáveis pela anulação da eleição presidencial de 2019, também reconheceu a vitória de Arce, por meio de seu secretário-geral, Luis Almagro.


O pleito do último domingo foi considerado um teste para a democracia boliviana, quase um ano depois de Evo Morales renunciar, pressionado por protestos e pelas Forças Armadas, após acusações de fraude na eleição de 20 de outubro.


Desta vez, o clima de incerteza se instalou na véspera, quando o presidente do Tribunal Supremo Eleitoral, Salvador Romero, anunciou a mudança de última hora no método de apuração: o sistema de contagem rápida, questionado no ano passado, foi substituído pela contagem voto a voto, segundo ele para aumentar a confiabilidade no resultado. Arce criticou duramente a decisão do tribunal.


A contagem rápida na última eleição presidencial foi o estopim do agravamento da tensão política na Bolívia. Na ocasião, a apuração de quase 80% dos votos indicava que o pleito seguiria para o segundo turno, disputado por Evo e Mesa.


A contagem, entretanto, foi interrompida durante três horas e, ao ser retomada com o método voto a voto, indicava uma vitória do líder indígena ainda no primeiro turno. Opositores e observadores internacionais acusaram Evo de fraude eleitoral e o país tornou-se palco de uma série de protestos violentos.


Neste ano, também gerou críticas o atraso na divulgação das pesquisas de boca de urna, previstas para as 20h do domingo (18), mas que só saiu à 0h da segunda-feira (19).


De acordo com o principal instituto de pesquisa do país, o Ciesmori, o atraso ocorreu porque, no prazo combinado para a divulgação da sondagem, a amostragem obtida não representava 95% dos votos válidos —muitos preferiram não revelar o voto. Com as horas a mais, foi possível concluir o processo.


QUEM É O NOVO PRESIDENTE

Arce, 57, entrou na política em 2006, quando foi nomeado por Evo como ministro da Economia e Finanças. Antes disso, atuou por anos em cargos técnicos no Banco Central boliviano.


Filho de professores, estudou economia na Bolívia e fez um mestrado na Universidade de Warwick, no Reino Unido. Depois, passou a lecionar na Universidade Franz Tamayo, além de ter sido professor convidado na Universidade de Buenos Aires, na Argentina, e em Harvard e Columbia, nos EUA.


Durante a campanha, levantou a bandeira do boom econômico que a Bolívia viveu durante o governo Evo, quando o índice de pobreza caiu de 59,9% para 34,6%, de acordo com dados do Banco Mundial.


Como ministro, ele esteve à frente dos processos de nacionalização da exploração de petróleo e gás natural, os maiores responsáveis pelo crescimento do PIB boliviano —de US$ 11,45 bilhões (R$ 64,22 bi), em 2006, para US$ 40,89 bilhões (R$ 229,17 bi), em 2019.


Em entrevista à Folha na última terça-feira (20), ele disse que pretende renegociar os contratos de gás entre seu país e o Brasil.


A vitória de Arce pode reforçar a imagem de Evo Morales, que está exilado na Argentina desde dezembro sob status de refugiado e deve voltar à Bolívia.


Após a divulgação das pesquisas de boca de urna que indicavam o triunfo do MAS no primeiro turno, o líder indígena disse que “a vontade do povo foi imposta”.


“O grande triunfo do povo é histórico, inédito e único no mundo: um ano após o golpe, reconquistamos democraticamente o poder político com consciência e paciência do povo”, escreveu.


ANULAÇÃO QUESTIONADA

A OEA foi uma das principais vozes pela anulação da eleição passada. Em um relatório divulgado cerca de 45 dias após a votação, a organização concluiu que houve “ações deliberadas para manipular os resultados das eleições”, incluindo alteração e queima de atas de votação e falsificação de assinaturas.


Entretanto, artigo publicado pelo jornal americano The Washington Post, de autoria de dois pesquisadores do MIT (Massachusetts Institute of Technology), questionou a auditoria realizada pelo órgão. John Curiel e Jack R. Williams, membros do MIT Election Data and Science Lab (laboratório de ciência e dados de eleições), afirmaram não haver “evidência estatística de fraude”.


​Eles realizaram cálculos a partir das tendências de voto no momento em que a contagem rápida, o chamado TREP (que contabiliza atas das mesas), foi interrompida —foi retomada apenas dois dias depois.


O documento original da OEA relatou que o tempo para que o TREP fosse retomado foi suficiente para extravio e queima de atas, duplicação de nomes e outras irregularidades.


Os especialistas do MIT afirmaram que, ainda assim, pela quantidade de votos contabilizados (84%, pelo TREP) até o momento em que a contagem parou, já havia “uma diferença significativa do ponto de vista estatístico”, o que impediria que os resultados fossem diferentes dos anunciados pelo governo.


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