João Pedro Feitosa, que teve morte confirmada nesta quarta-feira (21) e participava dos testes da vacina de Oxford no Brasil, tomou o placebo – ou seja, não recebeu uma dose do imunizante em desenvolvimento. As informações foram enviadas por fontes da TV Globo.
– Voluntário tinha 28 anos e era médico recém-formado
– Ele morreu devido a complicações da Covid-19
– Após avaliação de comitê independente, testes não foram suspensos
– AstraZeneca e Oxford alegam cláusulas de sigilo para não divulgar mais detalhes do caso
– Desenvolvedores dizem que comitê não viu preocupações de segurança relacionadas ao caso
– Anvisa disse que processo permanece em avaliação, mas não determinou suspensão do estudo
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou ter sido notificada do óbito em 19 de outubro, e que foi informada que o comitê independente que acompanha o caso sugeriu o prosseguimento do estudo.
“O processo permanece em avaliação”, disse a agência (veja íntegra da nota abaixo).
Tanto os desenvolvedores (AstraZeneca e Universidade de Oxford) quanto os envolvidos na aplicação dos testes (Unifesp e IDOR) ressaltam que estão impedidos de dar mais detalhes por questões éticas, mas ressaltaram que não houve indicação para suspensão do estudo. Além disso, lembraram que a pesquisa é baseada em um “estudo randomizado e cego, no qual 50% dos voluntários recebem o imunizante produzido por Oxford”.
Em nota, a Universidade de Oxford ressaltou que os incidentes com participantes do grupo controle são revisados por um comitê independente e que a “análise cuidadosa” não trouxe preocupações sobre a segurança do ensaio clínico.
A farmacêutica AstraZeneca informou ao G1 que também não pode fornecer detalhes extras por causa das cláusulas de confidencialidade, mas ressaltou que todos os processos de revisão foram seguidos. “Essas avaliações não levaram a quaisquer preocupações sobre a continuidade do estudo em andamento”, informou a empresa em nota.
A microbiologista Natália Pasternak diz que é preciso ter cautela e analisar com tranquilidade o ocorrido. “Pessoas que participam dos testes clínicos são pessoas, elas podem morrer pelas mais diversas causas. Pode não ter absolutamente nada a ver com vacina”, explicou a cientista, que ainda apontou que a investigação do caso pode ser demorada e levar dias.
Segundo Pasternak, a decisão de abrir as informações fica a critério do pesquisador e do patrocinador de cada pesquisa. O comitê independente, que recebe e analisa as informações sobre os testes, pode recomendar se vai abrir ou não dados sobre o caso.
“Por enquanto, é um efeito grave, lógico que morte é um efeito grave, mas isso é normal em testes clínicos e precisa ser avaliado”, completou.
A vacina desenvolvida em parceria entre o laboratório AstraZeneca e a Universidade de Oxford é a principal aposta do governo federal para uma futura campanha de vacinação contra o novo coronavírus.
O estudo está na fase 3 dos testes, e eles começaram no Brasil em junho. Nesta fase, a eficácia da vacina é verificada a partir do monitoramento de milhares de voluntários. No país, 8 mil voluntários já participam do estudo.
Antes da fase 3, sua segurança foi verificada em pesquisas com um número menor de voluntários e nenhuma reação grave foi verificada, somente reações leves (leia mais abaixo).
O Ministério da Saúde prevê o desembolso de R$ 1,9 bilhão para o projeto AstraZeneca/Oxford, e espera oferecer 100 milhões de doses no primeiro semestre da vacina, caso os estudos confirmem sua eficácia e segurança. Além disso, prevê produzir mais 165 milhões de doses no Brasil no segundo semestre.
Um estudo com resultados preliminares da vacina de Oxford (AZD1222) foi publicado em 20 de julho, na revista científica “The Lancet”. A pesquisa cita reações consideradas leves e moderadas e não fala sobre efeitos colaterais graves:
– Dor após a vacinação: 67% sem paracetamol; 50% com paracetamol.
– Fadiga: 70% sem paracetamol; 71% com paracetamol.
– Dor de cabeça: 68% sem paracetamol; 61% com paracetamol.
– Dor muscular: 60% sem paracetamol; 48% com paracetamol.
Os testes iniciais, das fases 1 e 2, foram realizados na Inglaterra, com 1.077 voluntários, divididos em dois grupos: 543 pessoas receberam a vacina experimental, e outras 534 receberam uma vacina de meningite (o grupo controle) – 56 participantes da vacina experimental receberam paracetamol profilático.
Abaixo, veja a íntegra do posicionamento divulgado pela Anvisa:
“Em relação ao falecimento do voluntário dos testes da vacina de Oxford, a Anvisa foi formalmente informada desse fato em 19 de outubro de 2020. Foram compartilhados com a Agência os dados referentes à investigação realizada pelo Comitê Internacional de Avaliação de Segurança. É importante ressaltar que, com base nos compromissos de confidencialidade ética previstos no protocolo, as agências reguladoras envolvidas recebem dados parciais referentes à investigação realizada por esse comitê, que sugeriu pelo prosseguimento do estudo. Assim, o processo permanece em avaliação.
Portanto, a Anvisa reitera que, segundo regulamentos nacionais e internacionais de Boas Práticas Clínicas, os dados sobre voluntários de pesquisas clínicas devem ser mantidos em sigilo, em conformidade com princípios de confidencialidade, dignidade humana e proteção dos participantes.
A Anvisa está comprometida a cumprir esses regulamentos, de forma a assegurar a privacidade dos voluntários e também a confiabilidade do país para a execução de estudos de tamanha relevância.
A Agência cumpriu, cumpre e cumprirá a sua missão institucional de proteger a saúde da população brasileira.”
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