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Um antigo ditado doméstico dizia que é de pequenino que se torce o pepino. E uma sabedoria profunda está por trás disso. Primeiro é a ideia de um futuro, cuja imagem mental é a de um pepino torcido; segundo é a ideia de que, para que o futuro aconteça e o pepino fique torcido, é necessário que se saiba o que fazer agora, no presente; e terceiro, que todo futuro é sempre a consequência do que efetivamente se faz. Resumindo, o futuro é construído, produzido, fabricado, tecido. E tudo começa a ser feito agora. Mas não de qualquer jeito. É preciso que se saiba o que se quer fazer para que seja determinado o que fazer agora. Traduzindo em linguagem gerencial, objetivos de longo prazo são necessários para que as instituições saibam com precisão o que fazer agora. Inversamente, os objetivos de curto prazo, que é o que se faz agora, só têm sentido se estiverem voltados para o alcance de objetivos de longo prazo. Neste sentido, este ensaio tem como objetivo apresentar algumas características essenciais dos objetivos de curto prazo.
Os objetivos de inovação tecnológica quase sempre são de longo prazo. A razão disso é que muitas vezes os conhecimentos (científicos e de outras naturezas) necessários não estão disponíveis. É preciso, portanto, criá-los, antes. Só então é possível manuseá-los e encapsulá-los em algum artefato físico que permitam seu uso para determinado fim. Como são de longo prazo, precisam ser quebrados em partes menores de tempo, para a geração de produtos intermediários ou subprodutos dessas etapas. É justamente a esse esquema lógico que os objetivos de curto prazo se prestam. Por exemplo, uma inovação que levaria três anos para ser materializada pode ser quebrada em partes ou subprodutos anuais ou semestrais. É que quebrando-se em partes o longo prazo é possível aplicar a cada atividade maior racionalidade e precisão àquilo que será produzido nesse menor espaço de tempo, naturalmente que levando-se em consideração o produto final do longo prazo. Os objetivos de curto prazo garantem a precisão na produção dos componentes da inovação global.
Toda grande inovação é resultante de complexos desafios a serem vencidos. Tanto é assim que, se fosse algo simples, provavelmente a inovação já existiria, já teria sido criada por alguma instituição. Uma das regras da racionalização diz que todo invento desafiador precisa ser quebrado em partes. Diversos são os motivos para essa recomendação, mas a principal é que, como toda inovação, não se tem ideia, no início, de como ela será. É impossível apresentar um escopo definido, preciso, da inovação que será feito, principalmente porque não se têm todos os conhecimentos necessários para isso e, como consequência, como cada conhecimento será manuseado. Então os cientista procedem por partes. À medida que vão avançando em cada parte é que vão tecendo a lógica global do grande invento. Para cada parte é que estabelecem objetivos mais ou menos precisos, que serão vencidos em espaços de tempos menores, os chamados objetivos de curto prazo.
Se queremos inventar, digamos, um novo tipo de submarino, quebramos o invento em partes. Haverá a parte da carenagem, a parte dos motores, a parte dos equipamentos, a parte do sistema elétrico e assim por diante. Sobre cada parte haverá nova divisão, nova quebra de partes. Assim, na parte do sistema elétrico haverá a subparte do sistema elétrico da cabine de comando, subparte da cozinha, subparte de comunicação e assim por diante. O invento (o submarino) seria o objetivo global, enquanto as partes seriam os objetivos de médio prazo e as subpartes os objetivos de curto prazo.
Uma consequência disso tudo é que os objetivos de curto prazo são diferentes dentre os vários inventos que se pretende materializar. Um software de monitoramento da qualidade da água potável, por exemplo, pode durar apenas um ano e suas partes de curto prazo podem durar três meses cada uma. Mas um novo tipo de equipamento de retenção de energia solar pode demandar, por exemplo, 5 anos, o que fará com que o tempo do curto prazo seja equivalente a um ou dois anos cada. É que quanto mais tempo um invento demandar para ser inventado, maior tenderá a ser o seu curto prazo; inversamente, quanto menor o tempo de invenção, menor será o seu curto prazo.
Disso tudo se pode deduzir que não há invento que não seja trabalhado com a ideia de curto prazo. Por mais gigantesca que seja a realização, ela só se tornou possível porque foram previstas realizações de curto prazo, em pequenas partes de tempo. Essa técnica mental é tão necessária que os grandes fracassos de invenções e realizações podem ser explicados justamente pelo inadequado planejamento do curto prazo ou sua ausência completa. O grande invento ou realização é chamado de projeto conceitual, que mostra seus escopos globais mais ou menos definidos, enquanto o desenho das partes e como serão realizadas é chamado de projeto executivo. É somente a partir dos projetos executivos, que são de curto prazo, é que se sabe com precisão quanto cada invento ou realização vai custar. Sem objetivos de curto prazo não se sabe o quanto de dinheiro é necessário para a invenção ou realização.
Uma certa cidade do interior da Amazônia recebeu três milhões de reais para seu estádio de futebol. Sem projeto conceitual (objetivos de longo prazo) e sem projetos executivos (objetivos de curto prazo), foram feitos alguns remendos nos muros, plantadas algumas árvores, pintados alguns postes e colocadas algumas lâmpadas. E nada mais. Não foi possível prestar contas porque não havia projetos, nem planilhas de custos, nem orçamentos, nem nada. Órgãos oficiais de controle descobriram que quase tudo naquela cidade era assim, sem projeto, sem controle. A população sabe que chega dinheiro ali, mas ninguém sabe o que é feito dele (apenas desconfia a partir do enriquecimento de seus dirigentes). E a cidade continua a ser uma das mais miseráveis de sua região, logo ela, que já foi uma das mais prósperas do estado, quando pessoas sem estudo colocavam no papel o que queriam alcançar (objetivos de longo prazo), os focos de seus esforços (objetivos de médio prazo) e como fazer cada parte do trabalho (objetivos de curto prazo).
Daniel Silva é PhD, professor, pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e escreve todas às sextas-feiras no ac24horas.
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