Vez por outra, leio ou ouço nos vários meios de comunicação, declarações ou meras afirmações, no sentido de que o Setor Público Agrícola do Acre estaria “devendo” respostas mais evidentes sobre sua atuação em prol do desenvolvimento acreano, principalmente porque grande parte das mudanças prometidas na última campanha estavam centradas no agronegócio.
Fazem bem os diversos meios de comunicação e seus membros em cobrar assertividade e resultados da ação empreendida por um governo que veio para transformar a realidade acreana e alterar significativamente o rumo e o estilo do desenvolvimento, antes aprisionado em um eixo de baixo dinamismo. O questionamento das ações dos governos – de todos eles, é da essência do jornalismo e merece aplauso. Afinal, como dizia o grande Millor Fernandes, “jornalismo é oposição, o resto é secos e molhados”.
Há, contudo, que se conhecer, talvez com maior profundidade, as relações e possibilidades do setor público com a agropecuária, e desta com o mercado para se ter maior clareza sobre o ritmo e a forma das mudanças. No setor primário, especialmente quando submetido a um modelo liberal, de baixa intervenção estatal e respeito à livre iniciativa, as mudanças são lentas e graduais.
Neste sentido, costumo dizer que agricultura não é loja de sapatos que no outro dia amanhece com outra marca e nova direção vendendo perfumes. Como se diz coloquialmente, aqui no mato “o buraco é mais embaixo”, há outras variáveis a considerar.
Por outro lado, a intervenção do governo não é direta e nem deve ser. Não pode haver uma fazenda, um frigorífico ou uma casa de carnes pertencente ao Estado. Os mecanismos de impulso ao setor agropecuário são limitados e indiretos, ligados à infra-estrutura, regulamentação, crédito, assistência técnica, fomento e apoio à comercialização. O Estado entra mais para marcar e desinterditar o caminho do que para fazer a viagem.
Mesmo assim, estão em curso várias ações que podem ser referenciadas no âmbito do setor público, notadamente na Secretaria de Estado de Produção e Agronegócio – SEPA. Tomo como exemplo, entre muitos, o programa de compras institucionais que, abarcando um portfólio de 56 produtos da agricultura familiar, propôs em 2020 contemplar mais de 5.000 pequenos agricultores isolados ou associados, inclusive indígenas e, pelo menos parcialmente, ofertar produtos frescos e saudáveis a cerca de 200 mil pessoas, aí incluídas as famílias beneficiárias de prestação continuada, integrantes de unidades de acolhimento, alunos da rede pública, universidades, militares etc. Não é pouca coisa.
É claro que o exemplo acima, pelas próprias características do programa, não alcança valores estratosféricos nem significa a redenção econômica do Acre. Foi tomado quase ao acaso, pela importância social que possui e pela complexidade, mas eficiência de sua gestão. São milhares de produtores confrontados com dezenas de compradores, mediados por alguns poucos agentes públicos, que atuam na operação de um sistema que impõe uma série de regulamentações em nível federal e estadual, além da garantia de qualidade dos produtos, continuidade da oferta e preços de mercado.
No que tange ao agronegócio propriamente dito, o campo começa a dar sinais inequívocos. A produção de grãos deverá ser recorde este ano, novas tecnologias começam a ser adotadas (na figura acima, o primeiro pivô central instalado no Acre, o técnico responsável, o dono da propriedade, o Secretário da SEPA e o representante do banco), entraves sanitários importantes estão sendo removidos (Acre livre de aftosa SEM vacinação) e novas rotas de comercialização devem ser criadas.
Embora persistam alguns setores e mentes claudicantes e projetos importantes estejam em compasso de espera, pode-se dizer que foi dado o start político e as forças produtivas, cheias de vontade, aptidão e coragem, com uma política de crédito favorável – veja-se o Plano Safra, dispõem-se a ligar o modo turbo da produção. Não esperemos, porém, passe de mágica, não é assim que funciona na agropecuária.
Aliás, nem todos os ventos sopram a favor. Infelizmente, o Brasil está perdendo a disputa de narrativas relacionadas à Amazônia. Por mais que os nossos ministros se esforcem e o governo tenha puxado a questão para o andar de cima, com a ativação do Conselho da Amazônia e o posicionamento do Vice-Presidente da República à frente, o que temos visto, a julgar pela mídia, é uma crescente reação internacional ao modo como lidamos com a região, sua exploração e sua conservação.
Parece que a alegação de que 25 milhões de brasileiros por aqui residem e buscam sobreviver, não sensibiliza ninguém nos fóruns internacionais, o que repercute nas grandes empresas e, conseqüentemente, no mercado. Para azar nosso, as queimadas no Acre em 2020 estão a crescer em número e extensão, reforçando o discurso propenso ao engessamento de nossas potencialidades. É uma luta em seu tempo, precisamos vencer.
Valterlucio Bessa Campelo escreve às sextas-feiras no ac24horas
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