Saiu na National Geographic a denúncia de que o agronegócio está passando o arado nos geoglifos do Acre.
Os implementos agrícolas da notícia preparam o terreno para a plantação de milho, destruindo esses remanescentes que contam muito da civilização que ocupou nossa região nos últimos milênios pré colombianos. Tanto faz se fosse a soja, o pasto para criação de gado ou mesmo empreendimentos em agro-floresta.
Essas estruturas milenares merecem um cuidado que não oferece qualquer custo para os proprietários rurais. Até ganham com a imagem positiva de defenderem o patrimônio cultural. E sua preservação guarda memórias que ainda são traduzidas por paleontólogos, arqueólogos, sociólogos, historiadores, geógrafos e botânicos. Sua destruição nos priva o conhecimento do passado, dos erros e acertos de nossos ancestrais, da evolução do clima, de como se deu a transformação da savana árida na floresta densa amazônica.
O agronegócio organizado não é nem de longe o algoz da floresta. E certamente é o grande prejudicado pelos impactos climáticos e as crescentes restrições do mercado aos produtores que não demonstram comprometimento às questões ambientais.
Atualmente, há áreas já desflorestadas suficientes para um aumento significativo da produção pecuária e agrícola pelas próximas décadas, quando associadas à recuperação de pastagens degradadas e o uso de técnicas mais eficientes. Salve a Embrapa!
Se há um vilão nesse negócio é o oportunista, o grileiro, e o especulador que se aproveitam da irregularidade fundiária e da ineficiência dos órgãos de controle e fiscalização para abrirem novas frentes de desmatamento, invadindo terras públicas, reservas indígenas e áreas de proteção, e se financiam com a retirada ilegal da madeira extraída e com a comercialização dos imóveis conquistados.
A falta de gestão eficiente do território, pelos órgãos governamentais, segue na contramão dos recursos tecnológicos de mapeamento, imageamento e detecção de queimadas e derrubadas por satélites, sistemas de GPS e a própria legislação de registro de terras e ambiental.
O desmonte do Ibama, ICMBio, Incra, Iphan e Funai não é de hoje, mas as mensagens que o governo Bolsonaro passa agora reforçam a ideia de que as determinações dessas instituições não precisam ser respeitadas.
Vantagens oportunistas são etéreas. Recentemente os pecuaristas do Acre conquistaram uma reivindicação tributária antiga, reduzindo o imposto de venda do boi para outros Estados. Libertou-os do cartel dos frigoríficos. Esqueceram que grande parte da produção dos bezerros é feita por pequenos extrativistas que transformam a Chico Mendes, Antimary e outras terras protegidas em pastagem irregular. Acontece que o mercado de garrotes para fora do Acre passou a valer a pena e muitos produtores perderam seus fornecedores locais.
Ao flertar com a irregularidade, fomentando o crescimento das pastagens em terras impróprias, toda a pecuária do baixo Acre sofre agora as consequências.
Enquanto o governo federal continuar a emitir sinais contraditórios de suas ações para a proteção do meio ambiente, em especial da Amazônia, com o ministro da pasta desregulamentando o setor e desmontando seus instrumentos de controle e fiscalização, o presidente dando declarações favoráveis a grileiros, garimpeiros e devastadores ao mesmo tempo que o vice presidente faz um mise-en-scène de apoio militar à fiscalização e o ministro da economia discursa para os investidores negando o óbvio, as florestas seguem queimando a taxas recordes, dando argumento e razão aos preservacionistas e farto material à grande imprensa do mundo afora.
Sem controle, sem credibilidade e sem responsabilidade é que nossos Geoglifos, nosso clima, nossa floresta e nossa história vão todos acabar virando xerém.
Roberto Feres escreve às terças-feiras no ac24horas.
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