Na semana passada, escrevemos sobre alguns detalhes da nossa realidade social, expressa na extrema pobreza que atinge um grupo mais vulnerável da população acreana e com menor capacidade de superar as condições de orientação para a prevenção do coronavírus. Um dos indicadores citados foi a deficiência na oferta de saneamento básico, um serviço vital para uma boa saúde e para a manutenção do meio ambiente, onde temos, conforme o IBGE, mais de 650 mil pessoas com restrições ao acesso aos serviços.
Aproveitando o momento, a proposta de hoje é iniciarmos uma análise de como os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário do município de Rio Branco chegaram ao estágio atual. Como esses serviços tão essenciais à vida, encontram-se num estágio tão atrasado, mesmo tendo estado na agenda dos governos durante as quatro mudanças institucionais a que esses serviços foram submetidos, desde a sua implantação em 1957, a saber:
É importante observar que em nenhuma capital dos estados brasileiros, as instituições prestadoras desses serviços passaram por tantas mudanças. A base para a nossa exposição é um exaustivo estudo que fiz para elaboração da minha tese de doutorado, defendida em 2016 junto à Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, sob a orientação da Professora Doutora Sonaly Rezende, a tese completa pode ser acessada através do seguinte endereço: http://www.smarh.eng.ufmg.br/defesas/1114D.PDF. Com uma sólida base teórica, o estudo baseou-se em entrevistas semiestruturadas com autores-chave, em documentos oficiais e em notícias publicadas na mídia escrita. A proposta é resumir o tema em 5 artigos (não sequenciais), iniciando hoje, com um resumo das circunstâncias da instalação dos serviços na capital, em 1957.
Até 1957, Rio Branco não dispunha de rede pública de abastecimento de água. A ausência de saneamento básico em uma cidade, capital de um Território Federal, entrava na categoria de situação real, expressa por indicadores demográficos, nos anos que antecederam a implantação dos serviços. O panaroma da cidade, com o final da II Guerra Mundial era de deterioração das condições econômicas e sociais, tendo em vista a redução da produção da borracha, retomada depois de um período de abandono e decadência ocasionados pela quase total ausência do Estado, em função da crise global da economia gumífera, no contexto da Pós I Guerra Mundial. Nesse contexto, iniciou-se um forte processo de diversificação da produção rural. Em 1950, já era considerável o peso da população urbana de Rio Branco no cômputo geral do crescimento demográfico urbano do Acre. Esse crescimento mais que dobrou entre os anos 1950 e 1960, sendo que no ano de 1960, já atingia 17.104 habitantes, mais de 54% da população urbana do Acre, evidenciando a necessidade de reestruturação dos serviços urbanos.
Na zona urbana, além de desapropriação de áreas para a expansão da cidade, teve início um amplo programa de obras públicas: aeroporto, unidades hospitalares, colégios, conclusão do Palácio Rio Branco, bem como a reforma do prédio da antiga penitenciária, o qual foi transformado no maior hotel da cidade. Foi também nesta época que se construiu o “Ipase”, o primeiro conjunto residencial da cidade, um modelo de intervenção urbana que posteriormente cresceria em importância para levar saneamento básico à população.
Portanto, apesar de ser a capital de um Território Federal, onde os governadores e prefeitos eram nomeados pela Administração Federal, Rio Branco iniciou os anos de 1950 sem serviços públicos de saneamento. Conforme a pesquisa, relatos de antigos moradores da cidade, o abastecimento de água das famílias era suprido por poços ou nascentes, em sua grande maioria sem canalização interna. Muitos utilizavam também as águas de rios e igarapés, principalmente para a lavagem de roupas. Havia ainda algumas fontes públicas implantadas pelo governo.
O editorial do Jornal Renovação, intitulado Placa da Semana, do dia 07 de setembro de 1955, traz um pouco do sentimento da população em relação ao problema da falta de saneamento: …Rio Branco é uma cidade azarada, tudo lhe falta, tudo lhe negam, nada fazem para justificar o seu título de capital do Acre, graças à negligência de seus administradores e ao arcaico sistema administrativo do Território. Não tem água encanada e não tem esgotos, mas o Território já foi contemplado com Cr$ 10.560.000,00 destinados a esses serviços e desviados para fins injustificáveis, porque não sabemos como e onde foram aplicados, mesmo porque, nestes últimos cinco anos, a maior obra do governo do Acre foi não fazer nada, absolutamente nada, senão esbulhar o povo nos seus direitos e afrontá-lo com a sua prepotência de ditador mirim […].
A Constituição de 1946 avançou muito no tema do planejamento e da institucionalização de instrumentos efetivos para a elaboração de estratégias de desenvolvimento regional, estabelecendo em seu bojo o ideário da “valorização”, do “desenvolvimento” e do “aproveitamento das possibilidades econômicas” de regiões consideradas deprimidas ou atrasadas economicamente como a Amazônia. Nesse contexto, iniciou-se de modo mais contundente um estímulo à criação de novos órgãos ou instâncias governamentais com o foco de atuação especificamente voltado para o planejamento, o fomento e a elaboração de políticas de desenvolvimento regional. Foi neste contexto que surgiu a Superintendência do Plano de Valorização da Amazônia (SPVEA), em 1953, criada em um momento em que as experiências de planejamento regional se iniciaram no país de forma mais sistemática.
Já no Primeiro Plano Quinquenal da SPVEA, dadas as deficiências das cidades da região amazônica no que se refere aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, antes mesmo da conclusão dos trabalhos preliminares constantes do programa de emergência que foi elaborado em 1954, foi proposto no orçamento do Primeiro Plano Quinquenal (1955- 1959), a inclusão de verbas necessárias para dar início à execução de obras de saneamento definitivas para as capitais, bem como dar continuidade ao auxílio iniciado com a finalidade de melhorar as condições sanitárias das localidades do interior, em cooperação com o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP). A comissão de Planejamento aprovou a inclusão de verba para beneficiar 65 localidades, de 64 municípios, sendo 07 no Acre, incluindo Rio Branco. Para todo o período, foram previstos recursos para os serviços de água das capitais e para o início das obras de sistemas de esgotos. Estava expresso no plano que “Somente após a solução deste problema nas capitais é que se deverá enfrentá-lo nos núcleos de população do interior”.
Foi nesse contexto que, em 1957, após negociações do então governador do Território, finalmente o primeiro sistema de abastecimento de água de Rio Branco foi implantado. Os primeiros 200 metros de rede, instalados na área central da cidade, por meio de acordos entre os Governos do Território e o Federal, através SPVEA. O serviço ficou sob a responsabilidade do Departamento de Obras e Viação (DOV), da estrutura da administração direta do Território do Acre. Conforme o economista Amoísio Freitas, inicialmente a estrutura de captação de água se dava por meio de estação elevatória em balsa flutuante no Rio Acre direto para um reservatório elevado com capacidade de 500 m3 que, por gravidade, distribuía a água bruta para a população. A rede de distribuição, bastante incipiente pela baixa cobertura que apresentava, era em tubulação de cimento amianto e nas ligações domiciliares foram adotados tubos e conexões de aço galvanizado de ½ polegada. Com a elevação do Acre à categoria de Estado em 1962, o sistema passou à responsabilidade do Departamento de Água e Saneamento, na estrutura do Departamento de Obras e Viação do Estado (DOV), que posteriormente se transformaria em Secretaria de Obras.
Portanto, a implantação tardia dos serviços, em 1957, ainda no âmbito do Território Federal do Acre, aconteceu em um momento específico de mudança na gestão pública brasileira, iniciada nos diferentes projetos políticos dos governos do período (1946-1963). Este “humor nacional” favorável ao investimento em saneamento e um olhar diferenciado para as regiões Norte e Nordeste, combinados com uma atuação dos políticos locais, mais próximos do governo central, foram fundamentais para a instalação do serviço de abastecimento de água em Rio Branco.
Orlando Sabino escreve todas às quintas-feiras no ac24horas.
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