Nota técnica lançada nesta quarta-feira, 22, pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), sob o título de “Amazônia em chamas 3: O fogo e o desmatamento em 2019 e o que vem em 2020”, reúne as principais informações sobre a estação de fogo de 2019, que causou espanto em todo o planeta, sinalizando que o desmatamento de 2020, somado ao que foi derrubado em 2019 e não foi queimado, pode alimentar uma nova estação intensa de fogo na Amazônia, especialmente em terras públicas que estão sob a guarda da União e dos Estados.
Só no primeiro trimestre deste ano, 50% do desmatamento registrado pelo sistema Deter, do INPE, aconteceu nessas áreas. O destaque, segundo o estudo, fica por conta das florestas públicas ainda não destinadas, terras devolutas que são alvo de grilagem e que respondem por 15% da Amazônia. Entre janeiro e março, 33% da derrubada aconteceu nessa categoria fundiária nos três primeiros meses de 2020, mais do que em qualquer outra. No mesmo período de 2019, o índice era de 22%.
No geral, o desmatamento no primeiro trimestre deste ano foi 51% que o mesmo período do ano passado.
“Quando a estação seca chegar à Amazônia, essas árvores derrubadas vão virar combustível para queimadas. Esse foi o ingrediente principal da temporada de fogo de 2019, uma história que pode se repetir em 2020 se nada for feito para impedir”, explica a pesquisadora Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM.
Alencar é a principal autora de uma nota técnica que o instituto lança hoje, a terceira sobre queimadas na Amazônia. Neste documento, os autores reúnem as principais informações sobre a estação de fogo de 2019, que causou espanto em todo o planeta, e sinalizam os perigos à espreita.
O número de focos de calor registrados na região em 2019 foi 81% mais alto do que a média entre 2011 e 2018. A maior variação aconteceu nas florestas públicas não-destinadas: 37% a mais, outro importante indício de grilagem.
“Isso é roubo de patrimônio dos brasileiros, e deve ser resolvido com polícia. Essas áreas devem ser destinadas à conservação. São um importante ativo para a biodiversidade e para populações tradicionais sim, mas também para a economia brasileira, pois geram a chuva que alimenta plantações e hidrelétricas”, diz o pesquisador Paulo Moutinho, do IPAM, um dos autores do estudo.
A nota técnica ainda destaca que, no ano passado, a seca sozinha não explicou a alta das queimadas, a despeito do que sugeriu o governo federal na época, pois o volume médio de chuvas foi normal para o período. O elemento agudo foi o desmatamento crescente: os primeiros oito meses de 2019 apresentaram uma elevação de 92% da taxa em relação ao mesmo período de 2018, segundo dados do Deter.
“A Amazônia é uma floresta úmida e não pega fogo naturalmente. O fogo ali tem dono, e ele se chama homem”, diz Ane Alencar.
Já as ações de comando e controle contra as queimadas adotadas em agosto, especialmente dois decretos federais que proibiram o uso do fogo por dois meses e enviaram as Forças Armadas para a Amazônia, inibiram as queimadas. Tais ações controlaram o fósforo, mas não desligaram as motosserras. O desmatamento continuou crescendo nos quatro meses seguintes (2.758 km², segundo dados do Deter).
“A fiscalização do desmatamento na Amazônia é tão importante hoje quanto foi 20 anos atrás, quando o Brasil derrubava mais de 20 mil quilômetros quadrados por ano de floresta. Não podemos chegar neste nível novamente”, afirma Paulo Moutinho.
Os autores temem que, sem controle, a somatória das árvores no chão, se queimadas, encha novamente o ar de fumaça em 2020 – que, por sua vez, aumenta os casos de problemas respiratórios na população da Amazônia. Em tempos de covid-19, são contornos de um cenário que ninguém deseja.
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