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Aprendendo a amar

Por
Daniel Silva

O conhecimento sobre o funcionamento do cérebro e cada uma de suas partes parece mostrar que o amor é o fenômeno que tende a facilitar tanto o processo quanto o produto da aprendizagem. Quando aprendemos com amor, o aprendizado tende em muito ser facilitado e acelerado, em contraste com quando tentamos aprender com desamor, que além de o tempo se prolongar, os resultados não parecem profícuos o suficiente. Em muitos casos, aprender contra a vontade parece mesmo ser impossível, especialmente quando queremos conhecer fatos e fenômenos que exigem autocontrole emocional e psíquico. Mas como utilizar o amor como ferramenta fundamental para a aprendizagem, se não é um sentimento? A resposta é simples: como o amor é atitude, é necessário que se inicie o processo de amar amando a si mesmo. Neste sentido, este ensaio tem como objetivo mostrar que todo processo amoroso se inicia com amor pelo sujeito que conhece.


Amar não é um sentimento, já o dissemos diversas vezes. Isso facilita em muito a nossa vida, uma vez que é praticamente impossível que se ensine a alguém sentir alguma coisa. A aprendizagem de sentimentos é tarefa árdua que só se executa individualmente, solitariamente. Mesmo o indivíduo mais desalmado e sórdido não consegue fazer com que alguém tenha qualquer sentimento de desprezo e sordidez, da mesma forma que não é possível que alguém faça as necessidades fisiológicas de outra pessoa. Não é possível que o pai ou a mãe sintam as dores que o filho adoentado sente.


Felizmente, o amor é atitude. Atitudes podem ser ensinadas. E a primeira atitude que o indivíduo deve aprender é amar a si mesmo. Fazer as higienes pessoais é uma atitude de amor, da mesma forma que se exercitar, para que o corpo alcance vigor físico. Mas o exercício físico é fonte de renovação neuronal, o que facilita e permite o aprendizado intelectual e motor. Aprender a lavar louças e limpar a casa também podem ser consideradas atitudes amorosas para consigo mesmo, uma vez que esses aprendizados são necessários à autosustentação e autonomia do indivíduo. Os aprendizados têm essas características: a aptidão para o presente e para o futuro. Aprende-se agora para que vivamos melhor, agora e para o futuro. Não se aprende a se amar apenas na escola. A vida é a grande universidade do amor.


A grande demonstração amorosa que o indivíduo pode dar é para si mesmo. Dificilmente outros indivíduos perceberão com adequação o quanto alguém pode se amar porque ninguém é capaz de perceber que desafios de melhorias ele se colocou. O amor próprio, portanto, é solitário também aqui: só o próprio indivíduo é capaz de saber se ele se ama ou não. E como o amor é atitude, apenas ele é capaz de avaliar a intensidade e a amplitude desse amor. A busca pelo aprendizado consciente e determinado deve ser incentivado incrementalmente desde a mais tenra idade, incentivando, em forma de desafio pessoal proposto, que seja desvendado o segredo de cada coisa. Essa atitude vai dar abertura para o terceiro tipo de amor, um amor mais amplo e universal.


Apesar de ser fundamental a ajuda dos pais e adultos para com as primeiras etapas dos desafios de aprendizagem, é o indivíduo que deve tomar para si, já desde a primeira infância, a responsabilidade por tudo aquilo que estiver afeto à sua vida e à sua individualidade. Aprender a arrumar a cama é necessário para manter o quarto arrumado, mas é essencial para revestir o espírito e a mente da responsabilidade para consigo mesmo; aprender a lavar as louças é importante, mas é grande etapa na longa caminhada para a conquista da autonomia. Aprender a fazer essas coisas é tão importante quanto aprender a ler, escrever e fazer contas, que o indivíduo aprende na escola por ser lá o local ideal para isso, mas não o único.


A cada novo aprendizado, a cada novo desafio para a aprendizagem, o que deve estar por trás é a crescente consciência de que devemos aprender tudo o que for possível. Desde a suposta insignificante explicação de que os corpos se atraem até a altamente relevante constatação de que todo problema tem solução. É uma atitude amorosa estar preparado para enfrentar a vida, quando os problemas e desafios que ela nos apresentar exigirem a prática dos segredos que, pouco a pouco, temos que lhes desvendar. É aqui que entra a atitude como autoamor: como preparação agora para os problemas e desafios que vão se apresentar no instante seguinte ou no futuro distante. O que importa é estar-se preparado. É essa preparação que é a atitude amorosa. O aprendizado, que a atitude proporciona, é justamente a habilidade para lidar com aquilo que a vida vier a nos desafiar.


Que bela demonstração de amor o indivíduo que se dedica a aprender um novo idioma! Quanta poesia explícita para quem sabe ver é o aluno que, sozinho, procura aprender uma nova forma de calcular ângulos! Toda a plenitude amorosa parece pairar no ambiente em que indivíduos, em grupo, procuram aprender a solução para os problemas da fome e das desigualdades que indivíduos que ainda não aprenderam a amar teimam, inconscientemente, muitas vezes, a perpetuar! Ter consciência desse fato, de que a busca da aprendizagem é uma atitude amorosa que deve fazer parte da agenda de compromisso e responsabilidade de cada um para consigo mesmo, é um dos componentes estratégicos essenciais para a instauração da nova educação de que falamos.


Aprender a amar é o primeiro desafio que precisa ser vencido pelo indivíduo. Esse desafio começa a ser superado desde os primeiros anos de idade, com a ajuda dos pais e adultos, quando se aprende a entender e a fazer as coisas mais singelas da vida, como comer e limpar a casa. É atitude amorosa porque ganha-se em entendimento e em habilidade. Mas, mais do que isso, inscreve no espírito e na mente do indivíduo que aprender deve ser o grande lema de sua vida. Viver em constante estado de aprendizado, e ter consciência disso, levará à percepção de que é o saber (entendimento + habilidade) que proporciona a alegria, o prazer e a felicidade, outros elementos essenciais da nova educação.




 


 


Daniel Silva é PhD, professor,  pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e escreve todas às sextas-feiras no ac24horas


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