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Família Cameli terá que pagar R$ 20 milhões por desmatar terra indígena no Acre

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Um acordo inédito, celebrado nesta quarta-feira (1º), na sede da Procuradoria-Geral da República (PGR), em Brasília, põe fim a um longo processo judicial que se estendia desde a década de 1990, e garante ao povo indígena Ashinanka do Rio Amônia, no Acre, reparação por danos causados pelo desmatamento ilegal em suas terras. O pacto foi firmado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, em nome do Ministério Público Federal (MPF), e por representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), Advocacia-Geral da União (AGU), do espólio de Orleir Messias Cameli, Companhia Marmud Cameli e Associação Ashaninka do Rio Amônia (Apiwtxa).


Ao optar pela via negocial, em vez de insistir na judicialização, as partes estabeleceram o valor de R$ 14 milhões em benefício dos indígenas e R$ 6 milhões para a sociedade em geral, que serão destinados a fundo de proteção a direitos sociais. A verba será paga pelo espólio de Orleir Messias e pela empresa Marmud Cameli. Também como consequência do pacto, MPF, Funai e Associação Ashaninka do Rio Amônia concordam com a exclusão do espólio de Orlei Messias Cameli e da empresa Marmud Cameli e respectivos sócios da condição de réus no processo. Mantém-se, entretanto, o curso da demanda contra Abrahão Cândido da Silva, que não aceitou participar do acordo.

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Em uma demonstração simbólica da importância dos povos indígenas para o país, os desmatadores concordaram em ir a público registrar pedido formal de desculpas à comunidade Ashaninka do Rio Amônia “por todos os males causados, reconhecendo respeitosamente a enorme importância do povo Ashaninka como guardiões da floresta, zelosos na preservação do meio ambiente e na conservação e disseminação de seus costumes e cultura”. O termo de conciliação estabelece ainda que os recursos deverão ser destinados à defesa da própria comunidade, da Floresta Amazônica, dos povos indígenas e dos povos da floresta, comprometendo-se a associação a enviar relatório das atividades executadas a partir dos projetos aprovados em assembleia-geral da Comunidade Indígena Ashaninka-Kampa do Rio Amônia, para a Funai e para o MPF.


Direitos sagrados – O procurador-geral da República afirmou que o acordo faz parte de um novo momento de solução extrajudicial de conflitos no Brasil e disse esperar que seja o primeiro de muitos. “O que fizemos aqui foi cumprir a Constituição, compreendendo que o indígena tem direitos sagrados garantidos pela Carta Magna. Tem direito a ter uma vida decente, materialmente falando, de escolher seu próprio destino, de tomar parte das decisões políticas, com respeito às comunidades isoladas”, afirmou Augusto Aras.


“O Ministério Público defende todas as minorias e também as maiorias sub-representadas, como as mulheres e os negros do Brasil. Este registro é um sentimento profundo de que estamos construindo um novo momento de paz, harmonia, e, acima de tudo, de saber que as feridas existem para serem curadas, não eternizadas”, acrescentou o PGR. O advogado representante dos indígenas, no ato de assinatura do acordo, Antonio Rodrigo, também salientou o fato histórico. “Este momento é muito especial para a nossa comunidade. O Ministério Público foi um aliado da comunidade, é um momento histórico para a gente. Isso só chegou até aqui por causa de quadros muito valorosos do Ministério Público Federal”.


“É preciso respeitar os povos indígenas” – A solução negociada que resultou na reparação dos danos causados por madeireiros ilegais ao povo Ashaninka, bem como o pedido formal de desculpas à comunidade, deve passar uma mensagem clara: de respeito a todos os povos indígenas do Brasil. Essa é a avaliação da liderança indígena Francisco Piyãko. “Nós nunca aceitamos fazer acordo de maneira isolada, trabalhamos com transparência por se tratar de pauta que hoje não é só de direito ao nosso povo. Ela passou a ter uma importância para o direito dos povos indígenas como um todo. É preciso respeitar os povos, é preciso compreender que os direitos são protegidos pelas instituições competentes, baseado na Constituição Federal”, enfatizou.



Ele ressalta ainda a importância conferida pelos Ashaninka a seu território, bem como a preocupação com entorno da área, visando a sustentabilidade da floresta. Ao falar da destinação dos recursos provenientes do termo de conciliação, faz questão de lembrar a história de luta de seu povo contra qualquer iniciativa que venha a ameaçar a região. “Esses recursos vêm para potencializar as ações já existentes, para gerar sustentabilidade para nosso povo, nossa terra, para que ajude a nos fortalecer para continuar o projeto mais amplo de proteção ambiental e de manutenção dos nossos modos de vida”, finaliza Piyãko.


Ação civil pública – O MPF entrou, em 1996, com uma ação civil pública contra o empresário Orleir Messias Cameli e outras três pessoas – que acabaram condenados em primeira instância a indenizar a comunidade indígena Ashaninka-Kampa, no Acre, e a sociedade como um todo por desmatamento ilegal em suas terras. O crime ocorreu em 1981, 1983 e 1985, ocasiões da derrubada e retirada ilegal de centenas de árvores de cedro e mogno aguano na terra indígena. Orleir foi governador do Acre entre 1995 e 1998, e faleceu em 2013.


Segundo dados do processo, foi feito o corte irracional de árvores com mais de 50 anos. Estima-se que cada árvore derrubada danifica aproximadamente 1,5 mil metros quadrados de floresta. Além disso, a prática causa assoreamento e fuga de animais. “Além do fato que a derrubada de gigantes da floresta mata, pelo esmagamento, inúmeras árvores menores, expõe o solo aos raios do sol, soterram igarapés e nascentes”, ressalta trecho do documento. Por lei, as terras indígenas são unidades protegidas, e apenas os índios podem caçar, pescar ou retirar madeiras para suas necessidades, já que fazem isso de modo racional, sem destruir centenas de espécies.


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