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Artigo de Aníbal Diniz – Descanse em paz, dona Marina!

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Aníbal Diniz


Morreu hoje (9), em Rio Branco, a dona Marina. Marina Sousa dos Reis, 87 anos, mãe do professor Luiz Reis, com quem tive os primeiros contatos na década de 1980 ainda nos tempos de seminário, e de outros 14 filhos. Uma mulher sábia, que venceu as dificuldades da vida e conseguiu fazer o milagre de alimentar, bem educar, e de manter sua imensa família em plena harmonia, num ambiente em que sempre estiveram presentes o amor, o companheirismo, a fé e a solidariedade.

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Para falar da minha admiração pela dona Marina, mesmo tendo tido na vida tão poucas oportunidades de estar com ela e beber de sua fonte de sabedoria, retomo aqui fragmentos de meu discurso de despedida do Senado Federal, em dezembro de 2014, quando perguntado pela senadora Ana Rita, do Espírito Santo, de onde eu havia encontrado inspiração para defender com tanta veemência a causa das mulheres e assumido com tamanha determinação o problema da sub-representação feminina no parlamento nacional ao longo do meu mandato.


Naquele momento, a primeira imagem que me veio à mente foi a da minha mãe, dona Lurdes. Uma mulher simples, de família de agricultores do interior do Paraná, que conseguia a proeza de alimentar seus 10 filhos com o tradicional arroz e feijão, farinha de milho e algum legume e verdura, e, como fonte de proteína, nas ocasiões especiais, uma galinha. Uma única galinha para alimentar 10, na verdade 12 pessoas, porque ainda havia ela própria e meu pai que partilhavam a mesma refeição. É claro que eu nunca havia me dado conta da grandiosidade desse feito durante minha infância ou adolescência, o que só aconteceu depois de sua morte, quando às vezes os irmãos se encontravam para compartilhar lembranças de momentos marcantes de nossa história familiar, e galinha suculenta que alimentava todo mundo nos almoços especiais de domingo não podia ficar ausente.


Nesse quadro, entra em cena a dona Marina, que não havia tido 10, mas 15 filhos. Certa feita, em sua casa, vendo aquele quadro na parede com todos os filhos reunidos e ela ao centro, lembrei da proeza da minha mãe e lhe lancei a pergunta: – Dona Marina, minha mãe tinha dez filhos e alimentava todo mundo com uma só galinha. E a senhora, com seus 15 filhos, quantas galinhas tinha que preparar para alimentar todo mundo?  E ela respondeu de pronto. “Uma. Eu cozinhava uma galinha, e todo mundo comia e ficava satisfeito”. Eu repliquei a pergunta: uma galinha para alimentar 15 pessoas? Ela complementou a resposta: Quinze, não. Dezessete, porque eu e o meu marido também tínhamos que comer.


E continuou fazendo o relato. “Para que ninguém ficasse insatisfeito, eu fazia o prato de cada um deles e de cada um deles eu tirava uma colherada para mim. Assim, quando terminava de servir todos eles, eu já tinha almoçado”. Bravíssima, dona Marina!


Levei essas histórias coincidentes de duas mulheres fortes, que o destino quis que vivessem e morressem no Acre, para o plenário do Senado Federal para dizer que a sabedoria das mulheres é muito pouco aproveitada nas funções de comando no nosso país. Sendo as mulheres quase 52% do eleitorado nacional, não há dúvida de que elas estão muito pouco representadas no parlamento e também no Poder Executivo no Brasil. Tenho quase certeza de que, se tivéssemos mais mulheres em posição de comando no Brasil, com a sensibilidade nata que elas têm, os problemas sociais que hoje enfrentamos poderiam ser bem menos graves.


Dona Marina partiu com o espírito exaltado, porque fez o melhor que pode para seus filhos e para todos que viviam à sua volta. Ela, certamente, deu sua parcela de contribuição para um Acre, um Brasil e um mundo melhor, porque a melhor maneira de ajudarmos na construção do mundo dos nossos sonhos é fazermos primeiro o dever de casa, com justiça, amor e solidariedade entre os nossos. Isso dona Marina fez com sabedoria exemplar e feliz daquele que, como eu, teve a oportunidade de conhecê-la e ouvir pelo menos um pouco de sua linda história!


Descanse em paz, dona Marina!




 


Aníbal Diniz, 57, graduado em História pela UFAC, cumpriu mandato de conselheiro da Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel até outubro de 2019. Atuou no jornalismo (1984 e 1992), foi secretário de comunicação da Prefeitura de Rio Branco (1993-1996) e do Governo do Estado do Acre (1999-2010), Senador da República (2011 e 2014).

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