Eu achava que ensinar seria fácil. Aprender até que era no meu tempo de estudante, desde a alfabetização até a universidade. Aos pouco fui descobrindo o quanto meus professores foram importantes para eu chegar até aqui e o quanto a maioria deles foi criativa para usar dos recursos que dispunha para estimular minha vontade de conhecer coisas novas.
Alguns dias atrás participei de uma oficina de metodologias ativas que uma colega da universidade federal do Ceará* utiliza em suas aulas nos cursos de engenharia e ela pediu que lembrássemos de um ‘o professor’ que fosse a referência de cada um. Me vieram ao menos uma dúzia dos que eu gostaria de me espelhar quando entro numa sala de aula.
Eu achava que ensinar seria fácil e meu primeiro golpe foi já na avaliação que a Jorgete Nemetala fez da aula que apresentei no concurso para professor da UFAC há 35 anos. De frente para a lousa, com o recurso de um giz branco e o gogó, discorri, com desenvoltura, sobre o algoritmo para o cálculo da área de polígonos utilizando o método de Gauss, como se estivesse demonstrando aos professores da banca que eu dominava o conhecimento e não que tinha qualquer aptidão para ensinar aquela matéria.
Aos poucos fui pegando o jeito e depois perdendo o jeito. Na repetição, ano após ano, esqueci por um tempo de acompanhar as modas da vez. Envelheci, enquanto a turma continuava com idade média de 20 anos. Daí assumi outro emprego e dei um tempo da docência. Voltei para as salas de aula quase dez anos depois quando facebook, whatsapp, youtube e uma porção de recursos de rede mudaram o jeito das pessoas se relacionarem e buscarem a informação.
Acompanhar e tirar proveito das mudanças impostas pela difusão da tecnologia dos smartphones é um desafio que aparece aos poucos e conflita com o que entendíamos como ensinar e aprender. É também descobrir caminhos novos pelos quais os alunos já transitam com desenvoltura. Confesso que demorei para internalizar o ‘não encontrei essa explicação no YouTube’ que uma aluna repetiu em algumas aulas. Acho que a palavra que resume tudo é ‘desafio’.
Mas, olhando para trás, lembro de tantas experiências onde meus professores foram muito além do quadro negro e das projeções de slides, transparências e PowerPoint. Dona Isabel, lá no meu primeiro ano do atual ‘fundamental’ mesclava as atividades de alfabetização e tabuada com brincadeiras que desenvolviam a percepção a ruídos e texturas. Dois anos adiante, dona Anna Luiza ensinava geografia com a gente fazendo maquetes do relevo com isopor e massa de vidraceiro. Tive um professor de português que nos intervalos de aula discutia conosco a próxima aposta na loteria esportiva e dissipava assim toda a sisudez da matéria. Outra, de história, que usava um tempo de cada aula para discutirmos a edição de domingo do Estadão e da Folha (algumas vezes recheados de receitas de bolo e poesias de Castro Alves). Isso são somente alguns exemplos que guardo há mais de meio século.
Não foi diferente com boa parte dos meus professores na universidade que eram sempre criativos para encontrar recursos diferentes para tornar cada aula um ambiente mais agradável e produtiva. Um laboratório teatral no curso de Avaliação de Projetos Urbanos, que simulava a repercussão de uma obra hipotética na cidade onde eu estudava foi, pouco tempo depois, importantíssimo para minha carreira na prefeitura de Rio Branco.
Com todos esses professores (queria nominar alguns mas a lista ficaria maior que o artigo) descobri que, para me cativarem a atenção, construíam um ambiente de intimidade em sala de aula e abriam mão da distância que costuma separar a autoridade que ensina dos alunos que aprendem. Não me lembro de alguma vez que tenham perdido o respeito da turma por isso.
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Roberto Feres escreve às terças-feiras no ac24horas