A educação se preocupa com duas questões centrais: primeiro, o que deverá ser aprendido; e segundo, como esse aprendizado poderá ser processado. Como consequência, educar é garantir que o aprendizado se efetive através de procedimentos e técnicas que o consolidem. Traduzidas, essas duas questões se transformam em dois aspectos bem específicos: alocar no cérebro conhecimentos e habilidades (aprendizado) através de métodos adequados tanto à fisiologia quanto ao metabolismo cerebral. Isso implica em admitir que o desafio de todos os que desejam tornar a educação como sua profissão precisam aprender sobre conhecimentos e habilidades a serem aprendidas (que alteram o comportamento de quem os aprendeu) através do conhecimento aprofundado do funcionamento do cérebro em suas várias dimensões. Assim, a formação do educador se altera das dimensões exclusivamente humanas para a contemplação de dimensões das ciências médicas e biológicas. Neste sentido, este ensaio tem como objetivo explicar a relação do aprendizado com a aprendizagem na edificação de uma nova educação.
Estamos chamando de aprendizado a todos os conhecimentos e habilidades que um indivíduo detém ou precisa deter. Conhecimentos, por sua vez, são as diversas explicações que alguém consegue fornecer acerca dos fatos e fenômenos do mundo e descrevem, portanto, ou descrições/narrações ou explicações/demonstrações de como eles funcionam; já as habilidades são demonstrações de coisas que os indivíduos são capazes de fazer. Assim, quando alguém descreve uma árvore está comprovando (ou não) que a conhece; se narra determinado acontecimento, está demonstrando ter conhecido do ocorrido; e se me faz compreender porque as coisas caem, se soltas no ar, também está demonstrando conhecimento. Por outro lado, se alguém diz saber nadar e quando cai na água sequer consegue flutuar, demonstra que não tem essa habilidade, diferentemente daquele que monta em uma bicicleta e sai pedalando sem maiores problemas.
Diferentemente do que muitos podem imaginar, a ciência ainda não conseguiu demonstrar que se consegue ensinar aos outros a ter atitudes. Ao contrário do que imaginam os defensores do modelo CHA (acrônimo de Conhecimentos, Habilidades e Atitudes como veio de competências), o comportamento é consequência dos conhecimentos e habilidades dos indivíduos, e não uma terceira dimensão do aprendizado. Por exemplo, se alguém sabe que o fogo queima e tem a habilidade de manter o fogo a distância segura, muito provavelmente não quererá provocar em si queimaduras graves. Assim, as atitudes são decisões pessoais, muitas vezes tomadas com base nos conhecimentos e habilidades (aprendizados). Pode-se até recomendar decisões, mas jamais agir por outrem, fundamentalmente porque estão mescladas de juízos de fato e de valor.
Ao longo do seu desenvolvimento cognitivo e físico, diversos conhecimentos e habilidades podem ser adquiridas. Em termos educacionais, esses conteúdos geralmente são previstos legalmente e, consequentemente, normatizados, pelo menos os seus escopos, de maneira que os profissionais da educação possam manuseá-los da forma mais adequada possível. A adequação significa a forma mais eficiente e eficaz de armazenar no cérebro do indivíduo os conteúdos que quer ou precisa aprender. Isso significa que o profissional da educação precisa dominar tanto os conteúdos quanto os procedimentos que levarão à armazenagem dos conhecimentos e habilidades no cérebro do aprendiz.
Isso significa que aprendizagem é um processo. Enquanto processo, a aprendizagem é feita a partir de um conjunto de etapas, com início, meio e fim. Apesar de ser consequência das ações do profissional da educação e dos esforços do aprendiz, a aprendizagem é realizada pelo cérebro. É preciso, então, que se saiba, para cada conhecimento e habilidade a ser aprendida, qual o caminho, as etapas a serem percorridas, mais eficaz e mais eficiente para o seu armazenamento no cérebro. Mais do que isso, o profissional precisa saber o tempo necessário, por exemplo, para que o domínio da relação causa-efeito possa ser realizado e consolidado no cérebro, inclusive com as devidas demonstrações das diversas modalidades de consolidações, de armazenagem definitiva. Como será mostrado mais adiante, as diferentes formas de aprendizagem utilizam diferentes regiões cerebrais e são feitas com o uso de diversos recursos físico-químicos que, por sua vez, utilizam variados caminhos em redes neurais.
Para que uma nova educação possa ser erigida, é necessário que os profissionais dessa área tenham conhecimentos aprofundados sobre o funcionamento do cérebro e como provocar a aprendizagem para produzir o aprendizado desejado. Simultaneamente, os candidatos a essa profissão precisam conhecer cada um dos aprendizados previstos nas bases curriculares nacionais comuns (cada país tem a sua), obter habilidades para lidar com cada uma delas, não importando a sua quantidade, demonstrando para si mesmos que sabem fazer (alguns países, mais racionais, listam apenas uma quantidade passível de ser trabalhada, enquanto outros menos racionais fazem longa lista) e saber como agir de forma tal que esses aprendizados possam ser alcançados a partir de seus esforços por outras pessoas. Não tem sentido, como consequência, que um professor não tenha domínio pleno sobre todos os conhecimentos e habilidades que deve ensinar.
Não importa qual seja o aprendizado, a aprendizagem parece começar com a vontade ou necessidade, prossegue com o entendimento, avança com a demonstração e se consolida com a repetição. Dependendo de como foi trabalhada, o armazenamento pode ser efêmero, que desaparece quase que imediatamente, de curto ou de longo prazo. Contudo, parece que o cérebro só tem duas formas de provocar a aprendizagem: de modo difuso, que exige novas conexões neuronais, ou focado, que aproveita os caminhos já existentes no cérebro. É isso o que será mostrado nos próximos 10 ensaios.
Daniel Silva, é PhD, professor, pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e escreve todas às sextas-feiras no ac24horas.
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