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Sindicato de Chico Mendes em Xapuri quer resgatar causa

Por
Raimari Cardoso

Quartel General de Chico Mendes nas lutas contra a devastação da floresta e a expulsão dos seringueiros de suas terras, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri (STTRX) tornou-se um dos maiores símbolos da organização e da resistência dos trabalhadores rurais na Amazônia.


Trinta anos após a morte do líder sindical, a entidade já não esboça mais a força e a energia dos tempos do ativista que revolucionou a maneira de defender a permanência dos seringueiros dentro das colocações, promovendo a própria subsistência por meio de atividades não danosas à floresta.


Disputas políticas internas, inadimplência de associados, empoderamento do latifúndio mediante ações judiciais de reintegração de posse de áreas não contempladas pelas políticas de reforma agrária e medidas governamentais como a MP 871, que tirou a obrigatoriedade da emissão pelos sindicatos da Declaração de Atividade Rural, contribuíram para o enfraquecimento da instituição no curso das últimas décadas.


De acordo com atual diretoria, o sindicato possui mais de 3 mil associados inscritos. Destes, menos de 400 pagam regularmente suas contribuições mensais. Em meio à atual conjuntura, a mais famosa organização de trabalhadores rurais do Brasil busca hoje caminhos novos para resgatar o legado histórico de seu maior nome.


Tido como um dos mais autênticos herdeiros da obra de Chico Mendes, o atual presidente do Sindicato, Francisco de Assis Monteiro de Oliveira, ou simplesmente Assis Monteiro, acredita no fortalecimento do STTRX com base em um “novo empate”: estratégia de conscientização dos trabalhadores rurais voltada para o resgate da força da entidade na representação da causa do trabalhador e da defesa do modo de produção tradicional como maneira de resistir às novas investidas contra à floresta.


Numa breve conversa com a reportagem do ac24horas, Assis Monteiro fala sobre o atual momento do sindicato e sustenta que as práticas de produção sustentável são a única maneira de conciliar a manutenção do seringueiro nas áreas de conservação com a preservação da floresta, que sofre diante do avanço da pecuária e do desinteresse das populações tradicionais pelo extrativismo.


ac24horas – Como está o sindicato após 30 anos da morte de Chico Mendes?


Assis Monteiro – O sindicato continua a sua luta em defesa da posse da terra e de organizar as comunidades, principalmente no que diz respeito à produção sustentável. A grande preocupação é com o equilíbrio que deve haver entre a necessidade de se produzir mais para se ter uma renda melhor, mas não se esquecendo que a natureza, que a floresta tem de ser preservada porque ela é a fonte de tudo. Nós acreditamos que há muitas saídas para se produzir sustentavelmente na Amazônia.


ac24horas – O que mudou no Sindicato nesses últimos 30 anos?


Assis Monteiro – Há 30 anos havia uma grande motivação. O anseio pela garantia da terra. Com as conquistas obtidas pela luta de Chico Mendes e com os 20 anos de governo da Frente Popular do Acre, o sindicato perdeu poder de intermediação. Todo mundo passou a ter acesso direto com o governador, com deputados. Além disso, a criação da Reserva Extrativista Chico Mendes causou uma acomodação pela garantia da terra.


ac24horas – Você considera que a vida do seringueiro mudou para melhor depois dos 20 anos de governo do Partido dos Trabalhadores?


Assis Monteiro – Os avanços que houve são inegáveis. Hoje o extrativista possui um outro patamar de vida. Os ramais chegam até a porta, mesmo não sendo as melhores estradas do mundo, mas há algum tempo uma pessoa que era picado por uma cobra precisava ser transportado por vários dias dentro de uma rede. Hoje ele compra a sua moto e até o seu carro. Com a energia do Luz para Todos ele já tem sua geladeira e a sua televisão, além de outras modernidades. Mas esse incremento no padrão de vida do extrativista, esse aumento do seu consumo, faz com que ele necessite ampliar a sua produção e a sua renda, e aumentar a renda significa interferir mais na natureza. Por isso, precisamos encontrar maneiras de se produzir mais interferindo o menos possível na floresta.



ac24horas – Por que o gado continua penetrando na Reserva Extrativista Chico Mendes, agora por meio do arrendamento de pastagens por pecuaristas dentro das colocações de seringa?


Assis Monteiro – Eu acredito que isso não aconteceu do dia para a noite. Tudo se iniciou quando os produtos extrativistas não tinham os incentivos que hoje existem. Houve um tempo em que não se conseguia vender a borracha nem a castanha porque não havia valor nenhum. Daí alguns foram se envolvendo com a criação do gado e resolveram apostar nessa alternativa que não é adequada para a área de reserva. Mas o maior problema é que hoje não é apenas o gado do extrativista, mas do fazendeiro que já devastou toda a sua área e agora pressiona a reserva para pôr o seu gado lá dentro em sociedade com o seringueiro. Mas o gado não é o único problema da reserva. Hoje, nós estamos diante de uma outra questão muito séria que é a fragmentação de colocações que também está destruindo a reserva. Esse processo começou aqui em Xapuri pela comunidade Maloca, no seringal Nova Esperança, e vai entrando para outras localidades. Mas, mesmo com esses problemas, a área mais preservada que nós temos ainda é a Resex CM.


ac24horas – Qual a estratégia do Sindicato diante desses problemas?


Assis Monteiro – Eu acho que nós devemos pensar em um novo empate. Não aquele empate que se transformou no símbolo da resistência contra as derrubadas, mas um novo movimento. Um empate de orientação rumo ao desenvolvimento sustentável. Esse novo movimento teria como base novas experiências para se produzir mais em menos espaço físico, intervindo menos na natureza


ac24horas – Há algumas dessas experiências já em prática?


Assis Monteiro – Sim. Como exemplo nós temos os Sistemas Agroflorestais, onde é possível você ter uma produção por hectare muito maior que a do gado. É certo que o homem precisa fazer dinheiro para a melhoria da sua vida, para poder cuidar da sua família. E se houver uma maneira de a gente ganhar dinheiro sem ser criando gado temos que correr atrás, inclusive reflorestando áreas que já estão degradadas. Então nesse sistema você pode ter a castanha e a seringa, você pode plantar o café lá dentro, o cacau e uma diversidade culturas que podem trazer maior retorno financeiro que o gado.


ac24horas – Por que o programa Florestas Plantadas, que teve mais de R$ 5 milhões investidos pelos governos anteriores não deu certo?


Assis Monteiro – O Florestas Plantadas se baseou unicamente no plantio de seringueiras. Do ponto de vista da produtividade, nos Sistemas Agroflorestais você tem a seringueira, mas junto com ela se agregam outras culturas diversas. Banana, mamão, açaí, enfim, a gente tem que acertar e chegar a um ponto de equilíbrio sobre o que se pode consorciar nesse sistema. É uma alternativa na qual temos que acreditar. Há estudos que indicam as espécies podem conviver nesse consórcio.


ac24horas – Voltando para o ponto da fragmentação das colocações, como o Sindicato está acompanhando isso?


Assis Monteiro – O que nós podemos fazer é o trabalho de conscientização dos nossos associados e exigir das autoridades competentes a tomada de providências quanto a isso. Infelizmente, nós vemos hoje o ICMBio enfraquecido e os governos que ascenderam ao poder nas últimas eleições fomentando a agressão ao meio ambiente. Quanto à conscientização, nós temos dito que não é inteligente que o produtor, que tem o privilégio de ter o seu pedaço de terra concedido pelo governo federal para que ele garanta a sua posse desse direito no presente e para o futuro de seus filhos, que ele venda isso para outras pessoas jogando fora uma conquista que foi resultado de muito suor e de muito sangue de tantos companheiros. Eu acho que o governo federal deva começar a repensar as suas atitudes e promover a fiscalização e a punição de situações como essas.


ac24horas – O que fazer para o Sindicato recuperar a sua força, no que diz respeito aos objetivos históricos da entidade que ficou famosa mundialmente pela luta em defesa do trabalhador rural?


Assis Monteiro – A principal coisa a se dizer é que qualquer categoria precisa de seus sindicatos para sobreviver. A nossa não é diferente. Nós continuamos a precisar da luta pela posse da terra porque ainda temos muitos posseiros em áreas não regularizadas que estão sendo ameaçados por ações judiciais de reintegração de posse e sujeitos a perder suas terras. Nós precisamos também avançar no processo de educação desses trabalhadores com os cursos de capacitação sobre os processos de produção. O nosso único caminho é a produção sustentável. Precisamos nos manter na terra e desenvolvermos maneiras de produzirmos mais porque hoje o custo de vida do seringueiro, daquele que está lá dentro da reserva aumentou muito. É isso o que eu acho.


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