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Para a temporada de emendas parlamentares

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Valterlucio Bessa Campelo


Este ano, nas duas casas do Congresso Nacional, começaram a surgir iniciativas interessantes relacionadas ao Orçamento Geral da União.  Deputados do Partido NOVO e, no Senado, um representante de Sergipe, Alessandro Vieira, do Cidadania (ex-PPS), anunciaram que suas emendas parlamentares serão apresentadas ao Orçamento a partir de uma espécie de concurso. Trata-se, segundo eles, de selecionar os melhores projetos e obter a máxima eficiência dos recursos a serem aplicados.


Por ser uma experiência nova, não se pode garantir o êxito dessa estratégia, mas é certo que os parlamentares sinalizam com o rompimento da tradicional troca de recursos por apoio político embutida na destinação das emendas.


Cabe aqui, ainda que superficialmente, uma curta história das emendas parlamentares ao orçamento da união. Foi o Texto Constitucional de 1988 que ampliou o poder dos parlamentares na apresentação de emendas, de modo a que pudessem alterar as despesas mediante algumas condições, entre elas a de implicação anulatória, ou seja, a cada despesa criada corresponde uma equivalente e expressa anulação de despesa prevista pelo Executivo na peça original. 


As emendas estavam submetidas à discricionariedade do Governo, que detinha então o poder de executar ou não, sem maiores explicações, as despesas assinaladas nas emendas parlamentares, o que as colocava no jogo político travado no Congresso, já que o orçamento era autorizativo. Sob este aspecto, se pode dizer que os governos (todos) usaram e abusaram das emendas parlamentares como moeda de troca. Muito voto foi docemente ofertado ou conquistado em troca da liberação de emendas, turbinando carreiras políticas e amestrando o parlamento.


Após algumas tentativas, foi através da Emenda Constitucional nº 86/2015 que se promoveu maior democracia partidária, ao determinar que todos os deputados e senadores tivessem o mesmo valor para empenho, considerando-se as emendas aprovadas e não canceladas por impedimentos técnicos. Vale dizer, quando libera, o faz pra todos em iguais condições, além disso, já que é impositiva, a emenda só deixa de ser liberada sob condições de clara indisponibilidade financeira.


Em resumo, as emendas passaram de uma possibilidade dependente do jogo político a uma obrigação de fazer, mantido sob a discricionariedade do Executivo o “quando” fazer. Com isto, os parlamentares obtiveram maior domínio sob as emendas que apresentam ao orçamento. 


Em nível estadual, guardadas as devidas proporções, as Assembleias copiaram o modelo e destinaram parte do orçamento ao alvedrio dos parlamentares, os quais, na maioria, seguem o mesmo diapasão, ou seja, destinam os recursos para as prefeituras aonde se encontram seus eleitores e apoiadores. No Acre, estão previstos R$500.000,00 para cada Deputado no Orçamento de 2020.


Mas, o que são as emendas? Para que servem? De modo restrito, emendas são inclusões/exclusões no orçamento de despesas que os parlamentares julguem de maior interesse das comunidades, grupos, municípios, estados que representam. Servem para impor ao Executivo Federal uma despesa que julga pertinente. Isto para o parlamentar, porque para os beneficiários, normalmente prefeituras, as emendas são, em época de grande escassez de recursos, praticamente a única forma de acesso a investimentos, daí a correria em torno de parlamentares nas semanas que antecedem a apresentação das ditas cujas. 


Então, sucintamente, entendamos assim. Os prefeitos (majoritariamente), que conhecem com mais profundidade as necessidades locais do que os técnicos em orçamento em Brasília, sugerem e os parlamentares apresentam as emendas (realização de despesas) de interesse do município, metade para o Setor Saúde, sendo o Executivo Federal obrigado a liberá-las sem preferência partidária. Parece bom, não? 


Para os Deputados do NOVO e para o Senador Alessandro Vieira, pode ficar melhor. Em primeiro lugar, eles consideram que na forma tradicional nem sempre os melhores projetos são os contemplados com as emendas, mas sim aqueles dos partidos, lideranças e organizações politicamente alinhadas. É como se o antigo poder de barganha do Governo Federal tivesse passado para as mãos dos parlamentares, na base do “só tem emenda quem me presta apoio”, o que não garante projetos melhores, mais eficientes, mais justos etc.


Em segundo, os parlamentares acham que o processo de escolha deveria ser mais democrático, ou seja, alcançar diretamente as pessoas através de suas organizações e alargar o espectro de interlocutores, sendo, portanto, mais efetivo. É como ir direto ao consumidor final eliminando intermediários, o que não dispensa as prefeituras, mas força maior aderência aos verdadeiros problemas da comunidade e frustra expectativas de cunho meramente eleitoral.


Em terceiro, pelo menos em tese, a iniciativa privilegia o mérito, a qualidade dos projetos. A ideia é de que a concorrência pelos recursos fará com que os interessados se esmerem na concepção e elaboração, buscando alternativas mais eficientes.


O Senador Alessandro Vieira recebeu mais de 400 projetos para os 16,2 milhões de reais de que dispõe, e todos eles serão submetidos a um crivo técnico que filtrará aqueles com maior alcance social, maior pertinência com o seu mandato e seu perfil político etc., de acordo com parâmetros previamente estabelecidos. O Deputado Gilson Marques (NOVO/SC), por exemplo, estabeleceu a educação básica, a geração de emprego e renda e estímulo ao empreendedorismo, o saneamento básico, a saúde e a segurança pública como temas que filtrarão os projetos de emendas. Em Edital, o deputado Paulo Ganine (NOVO/RJ) preferiu privilegiar projetos que aumentem a eficiência e que promovam a redução da estrutura administrativa do Estado. 


Um amigo, especialista na área, me ponderou que esse processo de seleção aberta parece mais aplicável a estados ricos, mais populosos e com muitos municípios, onde os Deputados e Senadores são mais distantes da população em geral, e o montante de recursos de emenda individuais relativamente menos importante para as prefeituras. Não me convenceu. Penso que justamente por estar diretamente envolvido com as comunidades e lideranças, com setores organizados e associações de classe etc., o parlamentar identifica, regionaliza e foca sua atuação sem necessariamente passar pelo filtro do cacique local. De todo modo, se não para agora, para a próxima, fica a dica. 




 


Valterlucio Bessa Campelo é Eng.º Agr.º, Mestre em Economia Rural e escreve todas às sextas-feiras no ac24horas.


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